Exercer a cidadania
A Conferência sobre o Futuro da Europa merecia mais atenção e empenho por parte dos cidadãos, para o seu próprio interesse.
Está a decorrer uma iniciativa única que permite aos cidadãos ajudarem a definir o futuro da União Europeia. A Conferência sobre o Futuro da Europa está aberta para que qualquer cidadão participe e se faça ouvir em debates temáticos que ajudam a construir políticas estruturais na UE. O mecanismo não é simples mas está bem explicado aqui, e utiliza ferramentas digitais para ouvir e levar a debate propostas de cidadãos individuais, naquele que é um estímulo único ao exercício de cidadania europeia. Até à primavera de 2022, a Conferência vai chegar a conclusões sobre o futuro da Europa, conclusões essas que se espera que enformem as decisões políticas do futuro.
O povo europeu até pode não existir, mas a cidadania europeia é uma realidade indesmentível – e, algo que, para as últimas duas gerações nacionais a chegar à maioridade, é dado como adquirido de forma quase tão natural como a identidade nacional. Claro que quem participa nisto é uma minoria de cidadãos informados e politicamente ativos. Mas essa é também a premissa da democracia, e embora a abstenção seja uma preocupação constante, não passa pela cabeça de ninguém questionar a legitimidade de um governo se por acaso ele tiver sido eleito por menos pessoas que aquelas que abdicaram de votar. Portanto sim, o exercício de representação é importante – e devia ter o máximo de participantes possível.
A ideia terá certamente defeitos e a forma com que se chegou aqui demonstra bem as limitações da estrutura da União. Mas não é porque cada um dos poderes instituídos dentro da União quer puxar pelos seus interesses que o exercício perde mérito ou relevância. E, se é certo que a representação democrática da união é assegurada pelos representantes dos estados-membros, não há nada a perder em ter os interessados a participar num fórum internacional que ajude a preparar o futuro. A maioria dos cidadãos que participa neste evento não está preocupado em beneficiar o Parlamento, a Comissão ou o Conselho; quem participa está apenas preocupado em fazer-se ouvir num exercício de cidadania, um ato que acrescenta ao voto e à representação política que os órgãos nacionais fazem nas instituições europeias.
Essa cidadania europeia está matizada pelas diferentes circunstâncias históricas em que vive cada cidadão da UE: a história, a geografia e a língua desempenham um papel essencial na sua mundividência e por isso é que o exercício do poder a nível da União Europeia é tão fascinante. O aquecimento global não é percecionado da mesma forma em Belgrado ou em Lisboa, tal como as migrações são vistas de maneira diferente em Atenas e em Copenhaga.
A união tem várias formas para desencadear os mecanismos de consenso possíveis (mesmo que por demasiadas vezes esse consenso seja simplesmente a lei do mais forte). Mas ainda não se encontrou uma forma eficaz de facilitar as linhas de comunicação entre cidadãos que falam outras línguas e têm experiências diferentes. Também nisso esta Conferência pode ser útil, mas para isso precisa da maior participação possível. Coisa que ainda não tem, especialmente ao nível nacional.
Uma consulta à organização de eventos na plataforma oficial demonstra que o país é dos países que menos tem criado ações e em que menos cidadãos participam – e isto apesar do esforço das instituições europeias em Portugal e dos vários eventos que têm sido criados para fomentar também decisões de cidadãos, especialmente dos mais jovens, como é exemplo o SummerCemp que está a decorrer este fim de semana (e do qual faço parte como convidado). Mas é importante reforçar que este é, de longe, o exercício de cidadania mais poderoso que teremos para definir o futuro. Se não participamos, temos menos direito de nos queixarmos das decisões que serão tomadas. E a participação tem um bónus: até podemos aprender alguma coisa, nem que seja o ponto de vista de outros europeus sobre o mesmo tema.
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