O Web Summit em quatro pontos
A avaliação do Web Summit em Lisboa tem várias dimensões, desde logo a primeira, a vitória de Lisboa e o que permitiu ganhar a corrida a cidades como Madrid, Paris ou Berlim. Mas não só.
Quando, no dia 24 de Setembro, foi anunciada a vitória de Lisboa na corrida internacional pelo Web Summit, ficaram para trás as várias reuniões com Paddy Cosgrave e um processo negocial difícil e concorrencial. O que fez a nossa vitória? O que é o Web Summit? O que o país ganha com esta conferência? E o aproveitamento político? São quatro pontos que justificam uma avaliação na semana do segundo evento em Lisboa.
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A Vitória
Nos idos de Março de 2015, recebi uma carta e uma instrução do então vice-primeiro ministro e Coordenador Económico do Governo, Paulo Portas. Tinha que me encontrar com uns senhores de um tal de Web Summit (WS). Confesso que pouco sabia sobre o WS. O alerta para Lisboa tinha sido dado por Bernardo Futscher Pereira, na altura embaixador de Portugal em Dublin que escrevera um longo memo sobre a relevância do WS e sobre a eventual hipótese do evento se deslocalizar.
Nesse primeiro encontro com a equipa do WS que estava a realizar contactos preliminares com várias cidades europeias, rapidamente me apercebi da importância e alcance que este evento teria para Portugal. Nesse mesmo dia, confirmei a candidatura de Lisboa e passámos a estar oficialmente na “corrida”. E, nesse mesmo dia, formei uma equipa com a AICEP, o Turismo de Portugal e o Turismo de Lisboa. Ficou decidido que eu liderava a equipa em nome do Governo Português, apesar de muitos acharem que era uma perda de tempo, e outros, que era uma missão impossível ganhar a Paris, Madrid, Amsterdão, Berlin, Cannes, Milão e Barcelona e Londres. Felizmente que todos nós no XIX Governo, estávamos habituados a missões difíceis e duras. À luta, disse eu.
Ficam para a história as várias reuniões com o Paddy Cosgrave e o sócio dele, o David, em Lisboa e Dublin. Sem dúvida que contribuíram os nossos “soft powers”, da beleza do nosso património histórico, da simpatia do nosso povo, do buzz de uma cidade em movimento de gentes vindas de toda a parte do mundo a descobrir Lisboa e Portugal. E até a criação de um grupo de Facebook para a vinda do WS para Lisboa por jovens que nunca conheci, teve a sua graça. Mas essa ideia (que se quis criar) que o ecossistema tecnológico de Lisboa era de tal ordem avançado que foi a razão do WS vir para Lisboa, é totalmente infundada e falsa. Aliás, quando comparando Lisboa com Amesterdão com qualquer índice (digitalização, capitais disponíveis, start ups tecnológicas, etc…), estávamos a milhas. Era claramente um dos nossos pontos fracos.
Não nos enganemos. A vitória da candidatura de Lisboa deve-se a uma equipa profissional, focada nos temas essenciais para os organizadores, à criatividade da nossa proposta que contemplou nomeadamente iniciativas de atração da presença de jovens do ensino secundário em condições muito favoráveis, e de promoção da igualdade de género no ecossistema das Tech, do passe de transportes públicos para quem viesse ao evento, entre outras ideias originais.
Mas o aspeto fundamental para os organizadores foram as nossas infraestruturas, a FIL e o Pavilhão Atlântico (na altura, depois Meo e hoje Altice), o aeroporto perto da zona da Expo, a nossa capacidade hoteleira que conseguia absorver os mais de 50 mil visitantes, a segurança da cidade, a eficácia e o alcance dos transportes públicos, e a vontade expressa de investir e garantir a infraestrutura de comunicações para o wifi no local do evento, compromisso inequívoco e fundamental.
Deste esforço de mobilização, e da colaboração eficaz de vários intervenientes de que destaco, Artur Pereira, da AICEP, o atual presidente da AICEP, Luis Castro Henriques, João Cotrim de Figueiredo, na altura Presidente do Turismo de Portugal, Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, e a FIL /Pavilhão Atlântico, saiu uma proposta vencedora. E em 24 de setembro de 2015 foi anunciada a vitória de Lisboa para acolher três edições do Web Summit, com opção de mais duas.
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O Web Summit
Não se iludam. O WS é uma feira internacional de e para profissionais. Assim como são as feiras internacionais de calçado, cerâmica ou metalomecânica. Não é um concerto de musica pop. Também não é o Euromilhões. Também não é um centro de emprego. E não, não vai aparecer a “Sininho” do Peter Pan a largar dinheiro, empregos e clientes, por quem passa na FIL esta semana.
Como todas as feiras internacionais, et pour cause, o sucesso, está no planear, preparar, estudar o evento. Quem vem, onde está, quando fala. Tentar antecipadamente marcar encontros com potenciais clientes, investidores e líderes da indústria. Marcar presença nas apresentações mais relevantes para o seu negócio. E a vantagem desta Conferência é que toda a informação está disponível, no site, e mais ainda na aplicação onde diretamente se pode programar e gerir a semana. Daí a capacidade de rede de internet ser essencial a todos. Quem ainda não o fez vai passear pela zona da expo, mas não espere atingir qualquer objetivo. Não basta estar presente. Sublinho, há que estar preparado.
Claro que o WS é especial. Há eventos de todo o tipo a toda a hora e o ambiente é informal. O surf, as noites de bar, os jantares e os discursos mais variados de todos os ângulos possíveis. A oportunidade de poder estar ao vivo e a cores com quem está a pensar e criar futuro, é uma oportunidade única para todos e por isso vem gente de toda a parte do mundo. Mas nós estamos a jogar em casa. À luta, portugueses.
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A Economia
As vantagens para a economia portuguesa são diversas e para mim foram automaticamente aparentes desde Março de 2015. Desde logo, as diretas: hotelaria, restauração, indústria da hospitalidade, transportes, serviços e consumo. Na altura a avaliação correspondia a cerca de €175 milhões.
Pessoalmente, e no âmbito da proposta que liderei, foram sempre as vantagens indiretas para Portugal que mais me interessavam. O facto de Portugal estar a ser visitado e comentado por mais de 1.500 jornalistas de todo o mundo, de virem pela primeira vez os administradores e decisores das maiores e mais relevantes empresas de variadíssimas áreas, de investidores de toda a natureza em novas empresas, em pme’s, de grandes grupos mundiais a pensar em processos de deslocalização e em investimento direto em Portugal (como aliás, já aconteceu). Isso sim, para mim é transformacional.
E outro mito: o WS não é o evento das startups ou novas empresas, como que lhe quiserem chamar. É sim um evento de grandes colossos mundiais, onde também existe uma componente de apresentação de novas empresas, novas ideias, novos conceitos. Mas são os grandes que dominam.
Desconheço se as politicas públicas anunciadas por este Governo para acompanhar o WS produziram algum efeito. O Start Up Voucher, o Vale de Incubação, o Programa Momentum, o Programa Semente e o tão badalado fundo de 200 Milhões. Houve ideias e iniciativas. Com certeza de louvar. Mas quais os resultados?
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A Política
Por fim, uma breve nota sobre o aproveitamento político de evento. O que foi dito, o que foi feito e o que está por dizer. Como disse, e bem, John F. Kennedy, “a vitória tem centenas de pais, mas a derrota é órfã”.
Gosto de ver muita gente, agora, associada a esta vitória para Portugal. Na altura, poucos perceberam o que era, e quais as fortes consequências da vinda do WS para Lisboa. Tanto quanto me lembro, pouco ou nada se falou sobre o WS em 2015, apesar de ter sido ano de eleições legislativas.
Com a aproximação do evento, multiplicaram-se as teses sobre a paternidade do sucesso obtido com a vinda do WS para Portugal. No entanto, a menção e agradecimento a quem teve um papel decisivo neste grande êxito de Portugal, parece ter caído no esquecimento dos atuais anfitriões do evento.
Estranho é que não seja o Governo do meu país, mas sim os parceiros irlandeses deste projeto, que me convidam a participar em diversas iniciativas realizadas no âmbito do WS. Congratulo o atual Governo por ter percebido quão marcante e significativo este evento é para Portugal, e para a economia portuguesa. Congratulo o Fernando Medina pela presença e atuação discreta, mas eficaz. O Presidente da República, por percorrer a FIL, por incentivar os jovens, e impor uma dinâmica de mudança. E não nos devemos esquecer quem, na sombra, trabalha incansavelmente para o sucesso do evento: falo do SEF, da Policia de Trânsito e de Segurança Publica (MAI), dos transportes e Infraestruturas (MIP) dos inúmeros trabalhadores do sector público (MNE, ME) e privado que discretamente mostram um Portugal moderno, organizado e cumpridor. Todos eles são também pais desta vitória. Um País sem memória é um País sem alma. Um lugar de passagem.
Para mim, este não é um lugar de passagem, mas de construção de um presente inclusivo e de um amanhã mais próspero e mais justo para as gerações futuras.
Declaração de interesses: Sou Administrador Não Executivo da Swipe News, empresa detentora do titulo ECO, e esta é a primeira vez que escrevo e que me pedem uma opinião da esfera editorial.
Nota: Por opção própria, o autor não escreve segundo o novo acordo ortográfico
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