A maioria negatIVA e a irresponsabilidade orçamental do PSD
Rui Rio disse que não iria fazer nenhuma loucura no IVA da eletricidade. Mas fez. A nova proposta do PSD para baixar o IVA da luz não é tão má como a primeira, é pior.
Rui Rio anunciou desde novembro que o PSD iria apresentar na discussão do Orçamento do Estado para 2020 uma proposta para baixar o IVA na eletricidade. Mas fez uma ressalva importante: “Não vamos cometer loucuras, não vamos apresentar propostas do que não é exequível, isso não faremos.”
Mas fez. Se não é loucura a proposta que apresentou, é pelo menos pouco ajuizada ou muito temerária. A primeira proposta do PSD para baixar o IVA da luz de 23% para 6% era má. Esta segunda é péssima.
A primeira proposta sugeria financiar a baixa do IVA (que custa 800 milhões de euros/ano se aplicada a todos os consumidores) através de um corte de 21,7 milhões nos gastos dos gabinetes ministeriais e de um outro corte de 97,4 milhões nos chamados consumos intermédios.
O Bloco de Esquerda disse, e bem, que não se juntava aos social-democratas nesta maioria negativa porque não estava disposto a fazer “cortes cegos”. Sugerir cortes de 21,7 milhões nos gabinetes ministeriais para financiar a baixa do IVA na luz é simplesmente populista. E dizer que se corta 97,4 milhões nos consumos intermédios, sem especificar onde, é simplesmente irresponsável. O PSD, quer no seu programa de governo, quer nas propostas de alteração do OE, trata os “consumos intermédios” como se fossem uma espécie de martelo para martelar as contas públicas sempre que estas não batem certo.
Perdido o apoio do Bloco, o PSD entrou na lógica do perdido por cem, perdido por mil. Esta quarta-feira, Rui Rio resolveu apresentar uma nova proposta para baixar o IVA da luz, dos 23% para os 6%.
Para financiar a medida, deixou cair os “consumos intermédios” e diz que a baixa no IVA será, afinal, financiada por um corte de 8,5 milhões nos gastos ministeriais. Então ontem era um corte de 21,7 milhões nos nos gastos ministeriais e hoje afinal já é só de 8,5 milhões? Ou a proposta de ontem era ridícula, ou a de hoje é ridícula, ou são ambas igualmente ridículas.
Onde vai buscar o resto do dinheiro? “No ajustamento do saldo orçamental”, afirma Rui Rio. Sugere ao Governo que em vez de um excedente de 0,25%, apresente um superavit de 0,20%”. O líder do PSD foi suficientemente imaginativo para encontrar uns trocos na segunda casa decimal do défice para acomodar a baixa no IVA da luz, mas a verdade é que isto é uma esperteza contabilística e não uma medida estrutural e duradoura para financiar a baixa do IVA.
As contrapartidas são tão ridículas que o PSD, provavelmente envergonhado, resolveu também adiar de 1 de julho para 1 de outubro a entrada em vigor da medida, no sentido de não comprometer tanto as contas públicas. Mas é importante que alguém avise Rui Rio que o mundo não acaba em dezembro de 2020. A baixa do IVA na luz tem de ser paga em 2021 e nos outros anos. E isso não se paga com 8,5 milhões de cortes nos gastos ministeriais nem com artifícios contabilísticos pontuais.
Está à vista uma maioria negativa que pode desequilibrar o Orçamento, não o deste ano, mas o de 2021. É verdade que o Governo pôs-se a jeito quando ontem António Mendonça Mendes veio prometer uma “grande baixa de impostos” para 2021, ano de eleições autárquicas. E o Governo também não esteve bem quando lançou mão a uma chico-espertice orçamental de fazer depender a baixa do IVA de uma autorização de Bruxelas, sem especificar a medida e sem acautelar qualquer impacto orçamental.
Se António Mendonça Mendes acha que para o ano é que é, a irmã Ana Catarina Mendes acha que nem este ano vai ser. A possibilidade de uma coligação negativa deixou o PS em pânico e de cabeça perdida. Ana Catarina Mendes já veio dizer que a baixa do IVA “coloca em causa a aprovação do Orçamento”. Estará o PS a ameaçar votar contra o seu próprio Orçamento?
A votação da proposta do PSD, que aparentemente já tem o apoio do Bloco, far-se-á esta quinta-feira, provavelmente às tantas de madrugada (na terça-feira, a votação terminou às 4h30 da manhã). Quando terminarem a votação, o último que apague a luz.
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