O que os deputados esperam de 2017, num post-it
Num quadradinho de papel amarelo, 22 deputados da Assembleia da República perspetivaram o ano que aí vem.
“Quanta informação se pode pôr num post-it?” perguntou Joana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda. “Muita”, respondeu a própria bloquista. Com 2017 à porta, o ECO desafiou uma série de deputados da Assembleia da República a partilhar as suas expectativas sobre o ano novo. Pediu-lhes um post mas, desta vez, em papel: manuscrito, à antiga. E descobrimos — todos — que os velhinhos quadradinhos de papel competem bem com as novas tecnologias quando se trata de dar informação.
Houve papéis perdidos, papéis amarrotados, papéis passados a limpo e papéis preenchidos num piscar de olhos. O “jogo” dos post-it, como lhe chamou Pedro Passos Coelho quando confrontado pelo ECO — o ex-primeiro-ministro foi o único deputado que declinou, clara e diretamente, o convite para participar — revelou tanto pelo que foi escrito, como pelo que não foi.
O desafio era simples: perante o mote “Se eu disser 2017, pensa em…?” os deputados podiam escrever o que quisessem no seu post-it. Uma palavra, uma frase, um desenho — o que entendessem. No final, o ECO organizou os papelinhos (recolheu 22) sem olhar à forma como os deputados se sentam no plenário da Assembleia da República. O critério não foi a cor política, mas antes os temas focados e o grau de confiança (ou a falta dela) com que se encara 2017. Apesar disso, os socialistas destacam-se pelo otimismo, a direita pela preocupação — que em alguns casos evoluiu mesmo para o pessimismo — e os partidos mais à esquerda preferem pensar em trabalho.
Os otimistas
Tiago Barbosa Ribeiro e João Galamba, ambos deputados socialistas, estão otimistas. “2017, um ano que se espera melhor do que 2016 e não tão bom como será 2018”, escreveu o porta-voz do PS, depois de pensar sobre o assunto — “não tenho jeito para isto”, tinha deixado escapar, na primeira abordagem do ECO. Mais esquemático, Barbosa Ribeiro focou os quatro motes que têm sido bandeira do Governo em matéria de expectativas: “normalidade, confiança, futuro, esperança”.
Filipe Neto Brandão, outro socialista, escreveu apenas “2017? Esperança”. Parecido com a solução encontrada por Margarida Balseiro Lopes, deputada do PSD, que respondeu, também numa única palavra, “Expectativas”. Já noutro estilo, embora igualmente otimista, Ana Rita Bessa, do CDS, fez quase um poema sobre Educação. Depois de pedir “estabilidade”, justificou: “Para que as escolas possam ensinar, os alunos possam aprender, os pais possam confiar e os bons resultados continuem a florescer!”
Ivan Gonçalves, o novo líder da Juventude Socialista, aproveitou para recuperar o seu próprio slogan para a candidatura à liderança da JS e disse esperar que Portugal continue “do lado certo da história.” De entre os socialistas, Paulo Trigo Pereira, um deputado mais focado nas matérias económicas e orçamentais, foi o que respondeu com mais realismo. Tirou o post-it do bolso do casaco, já meio amarrotado, e escreveu: “Um ano que começa com incerteza, que acabe com paz, solidariedade e confiança no futuro.”
Da preocupação ao pessimismo
A preocupação e as dúvidas em relação ao futuro são a marca comum aos deputados da direita. “O ano de todos os perigos”, diz Cristóvão Crespo, deputado do PSD.
“Incerteza”, escreve Inês Domingos, também social-democrata. Nuno Magalhães, líder da bancada parlamentar do CDS, escreve a marcador azul escuro, mas no mesmo tom: quando pensa em 2017, pensa em “riscos que poderiam ter sido prevenidos ou evitados”.
Mas há quem esteja mesmo pessimista. Luís Montenegro, líder da bancada parlamentar do PSD, pensa numa oportunidade perdida. “Portugal podia ficar melhor e a vida quotidiana das pessoas também? Poder podia mas… Não com este Governo!” Hélder Amaral, deputado do CDS, diz quase o mesmo, mas por outras palavras: “2017, em vez de um ano de viragem, será um ano perdido.”
O que a Europa nos reserva
Há dois deputados que pensam na Europa: Eurico Brilhante Dias, do PS, e Carlos Silva, do PSD. Mas de forma diferente. À primeira tentativa, Eurico Brilhante Dias perdeu o post-it. Mas quatro dias depois ainda se lembrava do que tinha escrito e por isso foi fácil repetir. Desejou “o relançamento do projeto europeu na Cimeira de Roma”. Marcada para 25 de março de 2017, o dia em que se assinalam os 60 anos do Tratado de Roma, a expectativa é que esta cimeira permita concluir o processo de reflexão sobre o futuro da União Europeia, iniciado em Bratislava, no rescaldo da decisão do Reino Unido de abandonar a União.
Já Carlos Silva, do PSD, olha para a Europa como a tábua de salvação. E aproveita para responsabilizar o atual Executivo: “Espero que a Europa e o mundo neste novo ano ajudem Portugal a corrigir os erros cometidos no ano velho”, escreveu, num post-it passado a limpo. É o mesmo tipo de pessimismo presente nas respostas dos outros deputados da direita: ou as condições externas salvam Portugal, ou o ano está perdido.
Com menos estados de alma, a esquerda pensa em combates
Foi quase tão difícil arrancar um post-it de um deputado do Bloco de Esquerda, como de Passos Coelho. Mas embora o BE tenha participado no desafio com um único contributo, a bloquista Joana Mortágua conseguiu colocar nos 76 x 76 mm de papelinho amarelo uma quantidade inigualável de informação. Está lá tudo: passado, presente, futuro, sentido de evolução, e ainda um mote para acompanhar as batalhas escolhidas pelo BE, devidamente identificadas. A saber: “Precariedade, SNS, Dívida Pública, Escola democrática e Investimento Público”.
Já no PCP, destacou-se a organização. Os comunistas foram recetivos ao desafio desde o início, mas foi tudo coordenado pela assessora de imprensa que, diligentemente, foi entregando os post-it um a um. Ao todo, participaram cinco deputados e o foco foi, tal como no caso único do BE, os combates que os comunistas esperam vir a travar.
Paulo Sá pensa “na continuação da luta para melhorar as condições de vida dos trabalhadores e do povo.” Diana Ferreira espera que o novo ano signifique “mais conquistas e melhores condições de vida”, Rita Rato antecipa “Combate à precariedade, mais direitos!”. João Oliveira, líder da bancada parlamentar comunista, perspetiva “menos precariedade e um futuro melhor para os jovens.”
O espírito natalício
E porque o desafio foi lançado em época festiva, alguns deputados responderam imbuídos do espírito natalício e da viragem do ano. Duarte Pacheco, do PSD, pediu a Deus “prosperidade e saúde” para todos. Hugo Soares, também social-democrata, desejou “saúde”, num post-it preenchido num ápice, enquanto era pressionado por um grupo de jornalistas sobre o que iria o PSD fazer perante a oposição do PS e da esquerda a ouvir Mário Centeno e António Domingues na comissão de inquérito à Caixa, sobre a demissão do ainda presidente do banco público. Já João Torres, recém-eleito vice-presidente da bancada parlamentar do PS, escreveu, em maiúsculas, “felicidade”.
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