Estado aceita pagar swaps com juros acima de 100% no acordo com Santander
No acordo fechado com o Santander para resolver o problema dos swaps tóxicos, o Estado compromete-se a honrar até ao fim contratos com juros que já vão acima de 100%.
Mário Centeno, ministro das Finanças, fechou o acordo com o Santander sobre os swaps tóxicos com um desconto estimado de 36,8%.O acordo que foi fechado entre o Governo e o Santander sobre os swaps tóxicos comprados pelas empresas públicas inclui três operações com juros acima de 100%, apurou o ECO. Mas o Estado português comprometeu-se, mesmo assim, a pagar estes contratos até ao fim. A perda potencial está avaliada em 1,1 mil milhões de euros, mas este valor ainda pode mudar.
O pior swap do pacote de nove operações vendidas pelo Santander à Metro do Porto, Metro de Lisboa, STCP e Carris está a pagar um cupão de 106% por trimestre. Segundo o acordo de confirmação deste derivado, a que o ECO teve acesso, este swap só acaba a 13 de dezembro de 2022 e, às atuais condições de mercado, vê a taxa de juro agravar-se entre 5 e 6% a cada três meses. Contas feitas, no final do ano este swap pode atingir um juro de 130%, se as atuais condições de mercado se mantiverem. No final da maturidade pode estar perto dos 200%.
É certo que a fórmula deste derivado permite, teoricamente, que o juro ainda venha a descer. Caso a Euribor a três meses regresse para um valor entre 2% e 6%, a taxa reduz-se 0,5%, por cada trimestre em que este intervalo seja respeitado. Mas daqui até à maturidade do swap já só restam 23 trimestres — mesmo que a Euribor regressasse de imediato para aquele intervalo, no máximo a taxa poderia descer 11,5 pontos percentuais. Este foi o pior swap que alguma vez uma empresa pública comprou e, como o ECO já contou, até poderia ter sido evitado.
Seja como for, o Governo chegou a um acordo com o Santander e aceitou cumprir esta obrigação — bem como as obrigações que decorrem dos restantes oito derivados financeiros — para com o banco, desistindo do apelo que tinha feito ao Supremo Tribunal inglês. Em troca, o Santander aceitou financiar o Estado em 2,3 mil milhões de euros, a uma taxa de juro mais baixa do que a verificada no mercado.
Foi um bom acordo?
A resposta é complexa. Em abril de 2013, o Santander propôs ao Ministério das Finanças um acordo semelhante: os swaps seriam cumpridos e, em troca, o banco dava ao Estado um empréstimo a uma taxa reduzida. Uma notícia do Público desse ano dava conta de um desconto ligeiramente acima de 50% que, tendo em conta as perdas potenciais avaliadas naquela altura (cerca de 1,2 mil milhões de euros), representava uma poupança de cerca de 600 milhões de euros.
Esta proposta foi considerada insuficiente e, por isso, Maria Luís Albuquerque, a então ministra das Finanças, recusou-a e avançou para tribunal.
Agora o Estado negociou em condições mais frágeis: já tinha perdido duas vezes nos tribunais ingleses e havia uma probabilidade baixa de o Supremo aceitar, sequer, reavaliar o caso. Mas estava livre de outras condicionantes, como por exemplo dos impactos no défice. De 2013 para cá as regras do Eurostat mudaram e os impactos dos derivados financeiros deixaram de ser registados no saldo orçamental.
Segundo as explicações do Ministério das Finanças, e assumindo as atuais condições de mercado, a taxa a que o Santander se comprometeu a financiar 2,3 mil milhões de euros ao Estado, a 15 anos, rondará os 3%, contra os cerca de 4,3% de juros que o Estado consegue no mercado. O desconto de cerca de 1,3 pontos percentuais representa uma poupança em torno de 450 milhões de euros. A este valor soma-se um perdão de juros de mora nos pagamentos que as empresas deixaram em atraso, desde 2013, e uma partilha de custas judiciais. Tudo junto, são quase 500 milhões de euros poupados.
Se as perdas potenciais se concretizarem, isto significa que, em vez de custos de 1,6 mil milhões de euros, o acordo permitiu baixar este custo para 1,1 mil milhões de euros. Mas este valor ainda pode mudar.
Porque é que o custo dos swaps ainda pode mudar?
Porque os derivados continuam vivos, isto é, a cada trimestre o juro do cupão é atualizado, de acordo com os mercados. Ao que o ECO apurou, o risco é de cerca de 150 milhões de euros a mais, ou a menos, nas perdas. Congelar os swaps ao seu atual valor de mercado teria permitido estancar as perdas, mas a contrapartida tinha um custo elevado: as regras do Eurostat ditam que esse montante teria de ser registado, desde já, na dívida pública.
Enquanto as perdas são potenciais, são consideradas uma responsabilidade contingente e, por isso mesmo, não entram na estatística da dívida, na ótica de Maastricht. Mas se o swap ficar cristalizado, a perda passa a ser certa e, por isso, entra nas contas.
Colocar a dívida numa trajetória descendente é um objetivo fundamental para o Executivo, de modo a melhorar a credibilidade de Portugal nos mercados e controlar o risco do acesso a financiamento, por parte da República. Ainda esta quinta-feira o ministro das Finanças sublinhou este objetivo, quando apresentou o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas.
Com este acordo, Mário Centeno tem apenas de se preocupar com a materialização dos custos a cada ano, em vez de ser tudo de uma só vez.
O ECO contactou o Ministério das Finanças, mas até ao momento ainda não foi possível obter resposta. Também ainda não foi possível obter esclarecimentos por parte do Santander.
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