O dia em que Sintra atirou as moedas ao ar
Governadores dos principais bancos centrais mundiais estiveram em Sintra e atiraram as moedas ao ar. O que é que disseram Draghi, Kuroda, Carney e Poloz para deixar mercado cambial em euforia?
Um encontro entre pessoas engravatadas e com vestidos solenes num resort de luxo tem tudo para aborrecer o mais comum dos mortais. Mas Sintra, que esta semana recebeu a visita dos líderes dos principais Bancos Centrais do mundo, deixou o valioso mercado cambial em euforia por estes dias. Esta quarta-feira as moedas foram ao ar.
Draghi e a hipersensibilidade dos estímulos
O primeiro protagonista a provocar o caos na pista foi Mario Draghi, o presidente do Banco Central Europeu. Por causa das suas palavras, o euro esqueceu definitivamente a perspetiva de paridade contra o dólar que muitos analistas antecipavam no início do ano. O discurso do italiano não foi claro e houve interpretações para todos os gostos, o que obrigou alguns responsáveis do banco central a explicar o que realmente quis dizer Draghi. Ainda assim, ficou uma certeza: os mercados estão hipersensíveis quanto ao tema do fim dos estímulos como sinal de otimismo do banco central em relação à economia (e à inflação). E o euro disparou para máximos de um ano para perto dos 1,14 dólares.
O que disse Draghi? “O atual contexto onde as incertezas globais continuam elevadas, existem motivos sólidos para prudência no ajustamento dos parâmetros da política monetária, mesmo quando acompanhada de recuperação. Quaisquer ajustamentos à nossa abordagem terão de ser feitos gradualmente e apenas quando a melhoria das dinâmicas que os justificam forem suficientemente seguros”.
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Depois do discurso de Draghi, o Deutsche Bank reviu em alta a sua estimativa para a moeda única, passando dos 1,03 dólares para os 1,16 dólares. Andrew Wilson, do Goldman Sachs, dizia à CNBC que o comportamento do mercado já estava a dar força ao euro mesmo antes de o italiano falar. “Mas as suas declarações certamente mudaram as coisas: o cenário de um anúncio sobre a redução dos estímulos em setembro mudou-se de possível para mais provável e, agora, a grande surpresa para nós será se ele não o fizer”.
Euro avança para máximo de um ano
Bloomberg (Valores em dólares)
Carney aponta para mais subidas das taxas no Reino Unido
Uma taxa de juro mais alta impulsiona a moeda de um país. Por isso, quando Mark Carney, o canadiano que é governador do Bank of England, anunciou também em Sintra que o banco central deverá proceder a uma nova subida da taxa de juro, a reação do mercado não se fez esperar: a libra acelerou cerca de 1% face ao dólar, na valorização mais expressiva dois meses.
O que disse Carney? “É provável que possa ser necessária alguma retirada dos estímulos monetários. (…) Há alguns temas que o Comité de Política Monetária vai discutir nos próximos meses. Alguma retirada dos estímulos monetários deverá ser necessária se o trade-off [entre desemprego e inflação] observado pelo comité diminuir e a decisão de política monetária se tornar mais convencional”.
Para os investidores, a clarificação da posição do governador do Banco de Inglaterra representa uma mudança de discurso, dado que ainda na semana passada o mesmo responsável havia dito que ainda não era o tempo certo para iniciar o processo de aumentar o preço do dinheiro no Reino Unido.
O Financial Times escreveu que as declarações de Mark Carney indicam um voto a favor da retirada de estímulos, o que seria inédito para Carney, uma vez que votou sempre ao lado da maioria dos membros do comité. “Quando o comité se reuniu este mês, a minha opinião foi de que, dados os sinais mistos dos gastos no consumo e do investimento empresarial, era muito cedo para avaliar com confiança quão grande e persistente seria a desaceleração do crescimento”, explicou o governador.
Libra acelera com Carney
Bloomberg (Valores em dólares)
Dólar canadiano dispara
Os efeitos de Sintra também se fizeram sentir do outro lado do Atlântico. Ainda que Janet Yellen, presidente da Reserva Federal dos EUA, não tenha estado presente, o protagonismo foi para o governador do Banco do Canadá, Stephen Poloz, que voltou a deixar a indicação de que o banco central deverá considerar um aperto da política monetária (isto é, uma subida dos juros). Em reação, o dólar canadiano acelerou 1,2% para 0,7668 dólares, o nível mais elevado em quatro meses.
O que disse Poloz? “As taxas estão extraordinariamente baixas. (…) Parece que os cortes [nas taxas] fizeram o seu trabalho. Estamos a aproximar de uma nova decisão e por isso não quer fazer qualquer pre-julgamento. Mas certamente vamos precisar de pelo menos considerar toda essa situação agora que o excesso de capacidade está a ser usado de forma sólida”.
Para Bipan Rai, estratego da Canadian Imperial Bank of Commerce, os comentários de Poloz cimentam a mudança de postura que o banco central canadiano tem vindo a evidenciar no último mês. Benjamin Reitzes, analista no mesmo banco, considera que neste momento a probabilidade de o Banco do Canadá de subir os juros situa-se entre 55% e 60%. A taxa de juro segue inalterada desde 2010.
Banco do Japão continuará expansionista
Dos governadores dos bancos centrais que estiveram em Sintra, o Haruhiko Kuroda, do Banco do Japão, foi o quem revelou uma abordagem mais expansionista. E percebe-se porquê. Mais de quatro anos depois de ter lançado um enorme programa de compra de ativos, a taxa de inflação no Japão continua bastante aquém da meta de 2%.
Kuroda admitiu que a liquidez que o banco central tem fornecido à economia não tem sido, ainda assim, suficiente para incentivar as empresas a investir mais. Neste cenário, o iene perdia terreno contra o dólar, negociando nos 0,00891 dólares.
O que disse Kuroda? “Desde a introdução do ‘qualitative e quantitative easing’, as condições económicas melhoraram e as empresas registaram lucros recorde. Contudo, as empresas continuam cautelosas em relação a um aumento dos gastos“, frisou o governador nipónico.
Iene perde força contra o dólar
Bloomberg (Valores em dólares)
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