O Governo vai cumprir as metas de Bruxelas? Quase

  • Margarida Peixoto
  • 14 Outubro 2017

O ministro das Finanças já está a contar com a margem de benevolência da Comissão, tendo em conta o ciclo económico que Portugal atravessa. Centeno promete uma décima a menos do exigido.

Mário Centeno, ministro das Finanças, apresentou um Orçamento que está quase conforme ditam as regras da Comissão Europeia.Paula Nunes 14 Outubro, 2017

O Orçamento do Estado para 2018 diz aos portugueses que o IRS vai cair e que as pensões vão crescer. Mas o que diz a Bruxelas? Mário Centeno compromete-se com uma meta orçamental que fica uma décima aquém do rigor exigido pelas regras comunitárias.

Com a saída do Procedimento por Défice Excessivoporque Portugal colocou o défice abaixo do limiar de 3% do PIB em 2016 — as regras orçamentais de Bruxelas deixaram de se referir apenas ao saldo global. O que está agora em causa é melhorar o saldo orçamental em termos estruturais, ou seja, excluindo o impacto tanto de medidas extraordinárias, como do próprio ciclo económico.

É na página 31 do relatório do OE2018 que Centeno começa a responder à primeira questão: Vai cumprir as regras de Bruxelas? Quase.

Correção estrutural de 0,5% do PIB potencial

Fonte: OE2018

De acordo com as recomendações da Comissão para Portugal no âmbito do Semestre Europeu, a correção estrutural do défice deveria ser de 0,6 pontos percentuais — uma décima acima do compromisso assumido por Centeno.

Mas foi a própria Comissão que disse de antemão, logo em maio, que tem a intenção de “fazer uso da margem de apreciação aplicável à luz da atual situação cíclica portuguesa”. Traduzindo, quer dizer que Bruxelas vai ter benevolência na apreciação do esforço português, para garantir que o ajustamento orçamental não compromete a recuperação económica.

Centeno não deixou passar a deixa. Referindo-se à avaliação do exercício orçamental de 2016, o documento frisa que “o erro nas previsões orçamentais é um fator que deve ser tido em conta na margem discricionária que a Comissão utiliza quando avalia os projetos orçamentais dos Estados-membros”.

Para 2017, o ajustamento estrutural previsto é de 0,2 pontos percentuais — são 0,4 pontos a menos do exigido pela regra, mas uma diferença que fica aquém do que é considerado um desvio significativo aos olhos de Bruxelas. Para 2018 essa diferença é ainda mais curta face à meta (0,1 pontos). O Governo parece estar já a contar com a “margem discricionária.”

Além disso, faltará confirmar se a metodologia utilizada pelo Executivo para os cálculos é idêntica à da Comissão. No passado, Centeno já optou por seguir outro método e juntou-se a outros Estados-membros para colocar em causa a regra vigente. Essa discussão pode ser recordada aqui.

Há ainda outra regra que diz respeito ao ritmo de crescimento da despesa líquida primária. A Comissão recomendou a Portugal que esta despesa — que corresponde à despesa pública excluindo juros, despesa com programas totalmente cobertos por fundos europeus e alterações nos gastos com subsídios de desemprego que não decorram de mudanças nos critérios — não suba mais de 0,1% do PIB. O relatório não diz se esta regra será cumprida.

O documento deixa apenas projeções sobre a evolução das despesas e das receitas estruturais, e da despesa primária estrutural.

Como evoluem receitas e despesas?

Fonte: OE2018

Com esta evolução dos indicadores de despesas e receitas, Centeno projeta um saldo primário estrutural cada vez mais positivo. “Em 2016 o saldo primário de 2,2% do PIB colocou Portugal entre os países que registaram melhor resultado neste indicador, e prevê-se que assim continue em 2017 e 2018,” lê-se no documento. O gráfico em baixo mostra a evolução para este indicador.

Como evolui o saldo primário estrutural?

Fonte: OE2018

Por fim, a melhoria dos indicadores orçamentais permitirá, promete o Governo, reduzir a dívida pública para valores mais próximos dos 120% do PIB, que é considerado um patamar de referência a partir do qual os riscos de insustentabilidade são significativos.

"Estamos melhor, não estamos a salvo de tudo e portanto temos de continuar porque obviamente antecipamos que o ciclo de taxas de juro baixas possa vir a inverter-se um destes dias.”

Mário Centeno

Ministro das Finanças

Como evolui a dívida pública?

Fonte: OE2018

Contudo, este sábado, em entrevista à Antena 1, o ministro das Finanças reconheceu que a necessidade continuar a baixar o défice ainda se mantém. “Estamos melhor, não estamos a salvo de tudo e, portanto, temos de continuar porque obviamente antecipamos que o ciclo de taxas de juro baixas possa vir a inverter-se um destes dias,” admitiu Mário Centeno.

É por isso que é preciso “garantir que os indicadores financeiros do Estado, que é o agente mais relevante para estas matérias, estejam sintonizados com estas exigências,” argumentou o ministro. “E portanto quando projetamos um défice orçamental de 1%, e de 0,5% para o final da legislatura é evidente que o país hoje está muito melhor preparado para flutuações cíclicas normais,” rematou.

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