As cinco ideias-chave do think tank de Moreira da Silva para um novo Estado
A Plataforma para o Crescimento Sustentável, um think tank presidido por Jorge Moreira da Silva, lançou este sábado um "grito de alerta" para o consenso político em torno da reforma do Estado.
É “um grito de alerta” em defesa de consensos nacionais, garante a Plataforma para o Crescimento Sustentável (PCS), sobre o manifesto que apresentou este sábado. No documento de 56 páginas, o think tank presidido pelo ex-ministro social-democrata Jorge Moreira da Silva apresenta um diagnóstico dos principais garrotes ao crescimento do país e deixa várias ideias para uma reforma do Estado e do sistema político. O ECO destaca as cinco ideias-chave fundamentais do manifesto, coordenado por Abílio Morgado e com uma participação ativa de Hėlder Rosalino.
O objetivo da PCS, uma associação que se afirma “independente, sem filiação partidária e sem fins lucrativos”, é “a consensualização de uma verdadeira estratégia nacional (que não unanimismo) para a dignificação da política e para a modernização do Estado,” lê-se, no documento. E este é “necessariamente um processo que requer um forte compromisso entre os agentes políticos, sociais e económicos” e uma “tão intensa quanto urgente, ampla e bem sucedida concertação social,” frisa o manifesto.
O apelo surge depois de a campanha interna do PSD ter ficado marcada pelo posicionamento dos dois candidatos a líder — Rui Rio e Santana Lopes — quanto à disponibilidade para um entendimento com um eventual futuro Governo socialista. Foi Rui Rio quem conquistou a liderança do partido e quem disse, durante a campanha, estar disponível para entendimentos.
Aqui ficam as ideias principais do manifesto.
O Estado português deve, por princípio, ser austero.
1 – Um estado mais pequeno e austero
Primeiro, a dimensão: o Estado não deve ser mínimo, mas tem de ser mais pequeno, e austero, defende a Plataforma. “A PCS é muito clara no sublinhar de que não perfilha uma opção por um Estado mínimo. Mas defende uma nova visão do Estado: um Estado mais pequeno, mas muito mais criterioso, transparente e eficaz”, lê-se no manifesto.
“O Estado português deve, por princípio, ser austero”, continua o documento, frisando a importância do “rigor” e da eliminação de desperdícios, ineficiências e “subsídios e protecionismos injustificados”.
2 – Funções de fomento económico, de soberania e sociais
Para a Plataforma, há três funções essenciais que o Estado deve cumprir. Deve fomentar a economia, preservar a soberania e implementar funções sociais.
E é precisamente no âmbito destas funções que “a concertação dos chamados acordos de regime mais adquire pertinência e mais deve congregar as vontades responsáveis e construtivas dos líderes políticos e dos parceiros sociais”, argumenta o documento. Ou seja, é sobre estes pontos basilares do Estado que a Plataforma defende que deve haver consenso.
E o que é que a Plataforma entende por cada uma das três funções sociais identificadas? No que toca ao fomento económico, trata-se de promover o investimento público através do aproveitamento dos fundos europeus para disponibilizar os equipamentos públicos estruturantes.
As funções de soberania, ou nucleares, “têm de ser garantidas e executadas pelo Estado, sem prejuízo das entidades reguladoras independentes” e são elas:
- Função normativa;
- Gestão tributária;
- Justiça;
- Diplomacia;
- Defesa, segurança e proteção e socorro.
Já as funções sociais “têm de ser garantidas pelo Estado”, mas o Estado não tem de o fazer em exclusividade, defende o manifesto. As funções em causa são:
- Saúde;
- Educação;
- Proteção social.
[Deve-se] incentivar fortemente o reinvestimento dos lucros empresariais não distribuídos, (…) caminhando no sentido de uma progressiva redução do IRC.
3 – O que fazer no âmbito da função de soberania?
A Plataforma entende que defender a soberania implica hoje muito mais do que ter apenas preocupações territoriais. Por isso, nesta função aborda as questões jurídicas, regulatórias, fiscais, de justiça e de segurança nacional. Estas são as sugestões deixadas para debate.
Reforçar capacidades jurídicas. A Plataforma defende que o Estado deve “reabilitar urgentemente as suas capacidades jurídicas próprias”, diminuindo a sua dependência de entidades externas. Esta capacidade interfere diretamente com “o âmago da decisão pública”, pelo que deve ser assegurada internamente.
Reforçar a regulação independente. Deve-se promover um “mercado plenamente concorrencial e regulado, independente”, frisa o manifesto. Dessa forma o Estado pode contribuir para uma “economia mais justa, mas também mais dinâmica e inovadora”.
Sistema fiscal orientado para o crescimento sustentável. Como? A Plataforma deixa algumas sugestões:
- “Fiscalidade verde”, em que se valorize a tributação ambiental, aliviando-se a estrutura suportada na tributação do rendimento;
- Evitar que a tributação do património se alargue para além do modelo atual;
- Incentivo forte ao reinvestimento dos lucros empresariais não distribuídos, caminhando-se no sentido de uma redução do IRC. O objetivo final seria que as empresas fossem “apenas tributadas autonomamente por algumas das suas despesas e por lucros acumulados não reinvestidos e em que os lucros seriam tributados, assim que distribuídos, exclusivamente na esfera dos sócios.
Novo órgão colegial para diminuir litigância tributária. A ideia passa por criar, “no seio da Autoridade Tributária, um órgão colegial de consulta, constituído por pessoas de reconhecida competência e gozando do estatuto de independência técnica”. Este novo organismo teria como função pronunciar-se “sem caráter vinculativo” sobre as reclamações ou situações litigiosas. O objetivo seria constituir uma base “sólida” de “fundamentação para o decisor”, dando-lhe “legitimidade acrescida e inquestionável opinião jurídica”.
Reforma do sistema de justiça. A Plataforma defende como princípios básicos para esta reforma a atuação da justiça independente de meios económicos e com qualidade em todo o território. Para isso, argumenta que é necessário o redesenho amplo das competências dos tribunais em termos de território, matéria, valor e hierarquia.
Criar um conceito estratégico de segurança nacional. O objetivo é ir mais longe do que ter apenas um conceito de defesa nacional, na medida em que estariam incluídas questões como o abastecimento alimentar, hídrico, medicamentar, energético e de matérias-primas. Mas não só: também estariam incluídas questões de funcionamento de instalações críticas, de preservação ambiental, disseminação nuclear, liberdade de circulação, o equilíbrio demográfico e migratório, o desempenho económico-financeiro, entre outras.
Formas Armadas com capacidade de intervenção interna. A Plataforma defende que esta é “uma lacuna grave, que requer suprimento imediato”. As Forças Armadas devem ter a possibilidade de intervir militarmente dentro do país, a par das forças e serviços de segurança, face a ameaças como terrorismo, criminalidade organizada, imigração ilegal, entre outras.
[Há que] redesenhar o modelo de financiamento do SNS, de um modelo contabilístico, centrado no pagamento dos atos, para um modelo centrado nos resultados e nos ganhos para a saúde.
4 – O que fazer no âmbito das funções sociais?
No que toca às funções sociais, a Plataforma destaca três: a educação, a saúde e o sistema de pensões. Aqui ficam as ideias deste think tank para estas três áreas.
Liberdade de escolha das escolas. A ideia fundamental que é defendida no manifesto é a da liberdade de escolha da escola por parte dos cidadãos. Esta é considerada uma “poderosa alavanca de melhoria e concorrência dos projetos educativos”.
Liberdade de escolha na saúde. O princípio da liberdade de escolha deve ser repetido na área da saúde, argumenta a plataforma. Esse será o modo de assegurar mais concorrência no sistema, que deve ter uma política de preços que estimule a competitividade.
Redesenhar o modelo de financiamento do SNS. A plataforma defende que o modelo de financiamento do Serviço Nacional de Saúde deve passar de “contabilístico”, centrado no pagamento dos atos, para um “modelo centrado nos resultados e nos ganhos para a saúde.”
Liberdade nas pensões. A Plataforma defende ainda que o problema da falta de justiça intergeracional — na medida em que, argumenta, as gerações trabalhadoras atuais sustentam as pensões dos reformados atuais sem garantia de que venham elas mesmas a beneficiar de direitos equivalentes — deve ser abordado. Estabelece três princípios: deve ser revisto de forma sistémica, sem separar a segurança social da Caixa Geral de Aposentações, estrutural e de forma equilibrada e proporcional. O manifesto defende que as pensões a pagamento não devem ser alteradas, mas argumenta que deve ser aceite a “opção por contas individuais de capitalização”.
Importará considerar a necessidade de outros instrumentos (…) entre os quais rescisões por mútuo acordo, novas formas de gestão da organização do trabalho (como a adaptabilidade e o banco de horas) e mobilidade geográfica.
5 – Como revalorizar a Administração Pública?
O manifesto argumenta a favor de algumas alterações no âmbito da administração pública, que devem ser colocadas na agenda “para além dos ciclos eleitorais”, incluir a aprendizagem com os exemplos de outros países, evitar objetivos contraditórios e identificar de forma clara o público-alvo.
Reduzir o número de funcionários públicos. A Plataforma defende que se deve determinar quantos funcionários devem fazer parte das administrações públicas, aproveitando possibilidades de racionalização. Seja como for, diz que o controlo de admissões deve continuar, nomeadamente através das aposentações, uma vez que só com a redução do número de funcionários será possível “acomodar a redução sustentada dos custos com pessoal” sem ter de optar pelo corte ou contenção de salários. Para prosseguir este objetivo, devem utilizar-se também como ferramentas as rescisões amigáveis, a adaptabilidade, o banco de horas e a mobilidade.
Rever salários. “Deverá ser consensualizada e concretizada uma revisão da política remuneratória da Administração Pública, assente no alinhamento gradual com as práticas remuneratórias do setor privado”, lê-se no manifesto. Por outras palavras, isto quer dizer salários mais baixos para os trabalhadores com funções menos complexas e mais elevados para os níveis de maior responsabilidade. A Plataforma também defende que seja possível atribuir prémios e reconhecer o mérito dos trabalhadores.
Cortar laço entre recrutamento e ciclo eleitoral. O objetivo é consolidar as regras de recrutamento de dirigentes da Administração Pública por forma a garantir a dissociação temporal entre a duração dos seus mandatos e os ciclos políticos.
Aproximar contrato de trabalho público do privado. O manifesto defende que o contrato de trabalho em funções públicas se deve continuar a aproximar do contrato abrangido pelo Código do Trabalho, nomeadamente no que diz respeito à flexibilidade na organização dos tempos de trabalho.
Promover a inovação e digitalização. “Urge concretizar soluções inovadoras na relação entre o Estado e os cidadãos e na utilização eficiente dos recursos”, lê-se no documento, que argumenta a favor da digitalização e desmaterialização dos processos.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
As cinco ideias-chave do think tank de Moreira da Silva para um novo Estado
{{ noCommentsLabel }}