Margarida Olazabal: Prémios? Significam “muito pouco”

É sócia da MLGTS e recebeu o prémio Iberian Lawyer, que a coloca entre as 50 melhores advogadas da Península Ibérica. Para Margarida, os prémios servem sobretudo para elevar o nome da sociedade.

Para Margarida Olazabal Cabral o trabalho é um gosto, o reconhecimento vem por acréscimo. “É bom saber que somos reconhecidos pelos clientes, pares e pela qualidade do nosso trabalho”, assume, embora o significado que atribui às distinções que foi obtendo seja “muito pouco”. O mais importante é contribuir para o bom nome da sociedade. “Isso é que me dá alegria”, diz. É mais uma mulher que se destaca no mundo da Justiça. “Temos uma ministra da Justiça, uma Procuradora-geral da República, uma Provedora de Justiça… São bons sinais”, reconhece, embora defenda que “o facto de ser mulher ainda influencia mais negativamente do que positivamente”. Do seu ponto de vista, “o que é importante é que se deem às mulheres as oportunidades que querem ter” – quer isso signifique um equilíbrio entre a vida pessoal e profissional ou fazer carreira até ao topo. No dia-a-dia dedica-se à pasta que a conquistou desde que saiu da faculdade: o direito administrativo. “Especializei-me muito na área da contratação pública e contratos de concessão”, conta.

Os setores da energia, água, transportes e comunicações são as áreas de trabalho mais comuns da sócia da Morais Leitão, mas gosta de variar: “estamos sempre a aprender coisas novas que vamos podendo utilizar e nos permitem ser criativos.” Queria ser jornalista, mas rapidamente se deixou convencer pelo direito. O primeiro desafio profissional chegou durante o mestrado, um estágio de consultoria com Robin de Andrade. Durante o mesmo ciclo de estudos, passou pela Procuradoria-Geral da República. “Estava a ver para onde queria ir. Tenho ainda muito aquela coisa do serviço público e de prestar um serviço à comunidade”, explica a advogada. Mas rapidamente percebeu que prefere “fazer coisas mais concretas” – mais do que as recomendações a cargo da Procuradoria. Porém, a consultoria também não foi fonte de satisfação suficiente. “Para crescer como advogada precisava de dar um passo diferente”, apercebeu-se Margarida ao discutir o assunto com Ana Robin de Andrade. Por este motivo, abandonou o estágio e decidiu aceitar a proposta da Morais Leitão, apesar das muitas hesitações.

UMA ÉTICA DE TRABALHO

“Tinha ideia que trabalhar numa sociedade de advogados era trabalhar das 9 as 9 da noite e isso eu não queria”, recorda Margarida. Chegou mesmo a recusar a primeira oferta, mas acedeu à proposta de part-time… que “foi quase um horário completo na função pública”, esclarece entre risos. Ficou, até hoje. Durante muito tempo conseguiu sair às cinco da tarde para se dedicar aos filhos. “Era muito importante para mim. Agora já estão mais crescidos, já não é bem assim”, confessa, mas as convicções mantêm-se e defende que “todos nós trabalhamos demais. Temos de caminhar para uma vida mais equilibrada”. Aliás, o que a sócia da MGLTS menos gosta na profissão é, precisamente, a pressão da resposta imediata. “O ritmo de vida é aceleradíssimo”, diz, sobretudo desde que é guiado pelo som das notificações que vão dando sinal através do telemóvel e do e-mail. Aprendeu alguns truques para atingir objetivos sem descurar as restantes partes da sua vida: “é uma questão de organização. Chegar cedo, cortar nas horas do almoço”.

ARBITRAGEM ADMINISTRATIVA: O DESAFIO DO MOMENTO

Cada caso é um caso, mas há um problema comum. “Não prevejo grandes soluções para os tribunais administrativos”, admite Margarida, explicando que “é muito difícil dizer a um cliente que vai resolver um problema num destes tribunais. Estamos a dizer-lhe que vai passar lá vários anos”. Margarida prefere por isso olhar para fora dos tribunais. “É muito importante credibilizar a arbitragem administrativa para que seja uma verdadeira alternativa à resolução de litígios”, defende. Realça a maior especialização dos árbitros e a celeridade. Portanto, é nesta área que quer apostar: “Tem de se fazer crescer aqui dentro. Já tem histórico mas pode crescer mais.” Este não é um desafio fácil. “Corre-se o risco de estar a matar a arbitragem administrativa. Houve uma espécie de esquizofrenia “, aponta a advogada. Num dos pratos da balança, “a ideia generalizada de que a arbitragem é para favorecer os privados”, com a qual Margarida está totalmente em desacordo. Do outro lado, pesa o recente alargamento do âmbito da arbitragem, que assegura a possibilidade de recurso para os tribunais em vários casos. “Ou seja, quem perder vai para o tribunal administrativo. Perde-se a celeridade que se tinha ganho”, prevê. A vantagem da capacidade técnica pode também sair afetada, pois “os árbitros de maior prestigio não estão dispostos, por regra, a ser revistos e portanto podem haver recusas”. A nova lei “foi feita descuidadamente. Não se pensou nas coisas”, acusa. O plano? Contribuir para o debate destas questões. Mas a missão como advogada não se cinge às grandes questões da sua área. É, também, criar uma equipa a quem possa deixar a pasta. Dentro dela, quer que caiba não só o conhecimento como também uma forma de estar na profissão. “Há valores deontológicos e éticos que estão acima de tudo. E que têm de passar em tudo o que fazemos”, diz.

A secretária sobre a qual se debruça na Morais Leitão é muitas vezes substituída pelas que a aguardam nos auditórios das faculdades. Mudam as paredes – da Universidade Nova à Católica, onde dá aulas de direito administrativo – mas mantém-se o propósito. “A nossa experiência vai-nos fazendo muito melhores professores”, acredita. Quer dar a conhecer o direito na sua aplicação prática. “Gosto muito de ensinar porque o ensino é muito diferente da advocacia”diz Margarida, e explica: “Uma aula tem um princípio e um fim: nós saímos no final com o dever cumprido, enquanto a advocacia ‘nunca acaba’“. Das salas, leva também a relação com os alunos, uma das “matérias” que mais gosto tem em desenvolver. Entra nos campus universitários, não só pelo prazer do ensino, mas também pelo interesse no trabalho de investigação, que já lhe valeu vinte publicações até à data. “Na minha área não se pode ser advogado sem escrever”, defende. Entre o escritório e a academia, existem outras paragens que vão marcando a carreira da sócia da Morais Leitão. “Hoje estou na plataforma de apoio aos refugiados” conta Margarida, que dá o apoio jurídico necessário em regime de voluntariado.

“CONSIDEREI A VIDA POLÍTICA”

“Deixei algumas coisas para trás? Sim claro. Tenho quatro filhos gostava de ter tido cinco”, humoriza Margarida, para concluir, sem grandes lamentações: “Todos nós deixamos coisas por fazer”. Os vários anos de profissão trouxeram reconhecimento mas, mais do que isso, a vontade de fazer mais. “Preciso de novos desafios”, avança Margarida. “Acho que ainda vou fazer qualquer coisa diferente um dia, sem ser a advocacia”, vaticina. O serviço público já quase tomou outra forma, e a advogada chegou a fazer parte da lista do Movimento Esperança Portugal, uma força partidária que entretanto se extinguiu. “Considerei a vida política, mas nunca tive muita vontade”, confessa. A disponibilidade completa que é exigida deteve-a. Mas não deixa esta opção totalmente de parte: “Pode ser que um dia apareça qualquer coisa que me faça acreditar que ‘é aqui que eu posso dar o meu contributo”. Para já, demonstra-se satisfeita com o que conseguiu e fala de um enorme privilégio. “Sinto que consegui ter uma vida equilibrada entre a parte pessoal e profissional. Posso ter algum mérito nisso, mas acho que também tenho muita sorte”, garante, com o mesmo misto de vivacidade e tranquilidade que a acompanham durante todo o discurso.

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