Inversão dos juros pode abanar banca ainda carregada de malparado, diz o FMI
A onda de alívio das condições financeiras dos últimos anos está perto do fim. Se, por um lado, é positivo para as margens dos bancos, por outro, vai abanar uma estrutura ainda frágil, diz o FMI.
O dinheiro barato está a acabar. Foram anos de juros baixos proporcionados pela política monetária acomodatícia dos bancos centrais mundiais para puxar pela economia. Se, por um lado, a inversão do ciclo de juros vai ser positiva para a margem dos bancos, por outro, poderá abanar uma estrutura que mais parece um baralho de cartas, refere o Fundo Monetário Internacional (FMI) no Global Stability Report divulgado esta quarta-feira. Uma fragilidade que tem origem num problema que ainda pesa no balanço dos bancos: os níveis elevados de crédito malparado.
“Apesar da normalização da política monetária em algumas economias desenvolvidas e de sinais de estabilização da inflação, as condições financeiras globais ainda continuam muito acomodatícias”, nota o FMI no relatório, salientando a importância de pôr fim a esta política implementada nos últimos anos pelos bancos centrais para se arrancar com um período de inversão dos juros.
“Embora a política acomodatícia ajude o crescimento no curto prazo, o alívio das condições financeiras também continua a facilitar o aumento das fragilidades financeiras, agravando os riscos para a estabilidade financeira global e para o crescimento económico no médio prazo”, refere o fundo. Ao arrancar este processo de inversão do ciclo de juros historicamente baixos irá aliviar-se a pressão sobre as margens das instituições financeiras. Mas há riscos.
"Embora a política acomodatícia ajude o crescimento no curto prazo, o alívio das condições financeiras também continua a facilitar o aumento das fragilidades financeiras, agravando os riscos para a estabilidade financeira global e crescimento económico no médio prazo.”
O fim da política monetária, e juros muito baixos, vai abanar uma estrutura ainda frágil. Os bancos, sobretudo na Europa, ainda enfrentam um problema que pesa nos balanços: o nível elevado de créditos em incumprimento. Isto apesar de todos os esforços que o setor tem feito para aliviar este fardo. “O crescimento económico, as medidas adotadas para reduzir os NPL (malparado) e as ações das autoridades europeias contribuíram para uma descida do stock de crédito nos últimos trimestre. Mas os níveis de NPL continuam elevados em alguns bancos”, afirma o FMI, realçando que os esforços têm de continuar.
Malparado ainda pesa na banca nacional
Por isso, “apesar de o crescimento económico ir certamente ajudar a diminuir os NPL, é preciso implementar uma estratégia abrangente — com uma supervisão reforçada, alvos ambiciosos para a redução do malparado, modernização dos processos de insolvência e mais progressos nos mercados de dívida — para ir à raiz do problema dos NPL”, salienta o fundo liderado por Christine Lagarde que apenas se refere a Portugal em conjunto com Grécia e Chipre num gráfico onde “pesa” o fardo do malparado. Está perto dos 200 mil milhões.
"Apesar de o crescimento económico ir certamente ajudar a diminuir os NPL, é preciso implementar uma estratégia abrangente — com uma supervisão reforçada, alvos ambiciosos para a redução do malparado, modernização dos processos de insolvência e mais progressos nos mercados de dívida — para ir à raiz do problema dos NPL.”
Os esforços dos bancos nacionais para reduzir o malparado estão à vista. Mas ainda há muito trabalho pela frente. Segundo dados do Banco de Portugal, a redução no quarto trimestre foi a mais expressiva de sempre, numa base trimestral, sendo que no total do ano passado foram “limpos” 9,3 mil milhões de euros destes créditos tóxicos.
Vício do dinheiro barato
No Global Financial Stability Report, o FMI prossegue com os alertas à banca, como já tinha deixado num dos capítulos analíticos do World Economic Outlook. Enquanto agora foca-se no impacto da inversão do ciclo, no último documento alertava para os vícios que o dinheiro barato pode ter criado no setor, que terão efeitos potencialmente negativos daqui para a frente. Pode avolumar o problema do malparado.
“O longo período de alívio das condições financeiras vivido nos últimos anos criou receios de que os intermediários financeiros e investidores, numa procura por retorno, cederam demasiado crédito a devedores de maior risco, o que pode colocar em causa a estabilidade financeira”, referiu então a entidade.
O Banco de Portugal também está preocupado com a evolução da concessão de crédito fácil, nomeadamente às famílias. Decidiu, por isso, recomendar aos bancos a imposição de limites a alguns dos critérios usados na avaliação de solvabilidade dos clientes. Em causa estão três medidas preventivas da iniciativa do regulador a aplicar nos novos contratos de crédito.
Em concreto, a criação de limites para o rácio entre o montante do financiamento face ao valor do imóvel que serve de garantia (LTV), o estabelecimento de um teto máximo para o rácio entre os encargos com créditos e o rendimento familiar, bem como uma limitação à maturidade dos empréstimos.
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