Exclusivo Ministro Siza Vieira abriu empresa imobiliária um dia antes de ir para o Governo
Um dia antes da posse, o ministro abriu uma empresa, onde tem metade do capital. Siza Vieira começou por ser gerente, mas acabou por renunciar ao cargo. Mantém a quota e não vê qualquer impedimento.
O ministro Adjunto abriu uma empresa de compra e venda de bens imobiliários e consultoria empresarial, na qual era gerente e onde detém 50% do capital, um dia antes de entrar para o Governo. A informação sobre o registo desta sociedade consta da declaração de rendimentos que o governante entregou no Tribunal Constitucional (TC) e que o ECO consultou esta terça-feira. Pedro Siza Vieira renunciou entretanto ao cargo de gerente mas mantém a quota. O ministro não vê qualquer condicionamento legal e/ou ético em ter esta empresa estando no Governo.
Siza Vieira tomou posse a 21 de outubro de 2017, quando assumiu a pasta de ministro Adjunto, substituindo Eduardo Cabrita que transitou para o Ministério da Administração Interna, na sequência da saída de Constança Urbano de Sousa, depois dos incêndios de junho e outubro. Recentemente tem estado sob os holofotes mediáticos após notícias que o ligam à OPA à EDP.
Na véspera de iniciar funções foi registada na conservatória do registo comercial de Lisboa a sociedade por quotas com o nome de Prática Magenta, Lda. Com o capital social de 150 mil euros, Siza Vieira detém uma quota que equivale a metade (75 mil euros). A sua mulher, Ana Cristina Siza Vieira, é detentora da outra metade da sociedade.
Esta informação consta da declaração de rendimentos que o ministro Adjunto entregou no Palácio Ratton depois de ter iniciado funções no Executivo liderado por António Costa. O documento permite perceber que a morada da empresa é a mesma da sua casa, situada na zona das Amoreiras, em Lisboa. Mas na declaração é possível ver também que além de sócio, Siza Vieira era naquela data gerente não remunerado na empresa.
Na declaração de rendimentos entregue no TC não diz o que a empresa faz. Mas uma consulta à Racius, uma base de dados que reúne informação empresarial, indica que a Prática Magenta dedica-se à “compra, administração e venda de imóveis próprios e alheios, incluindo o arrendamento, bem como a prestação de serviços conexos ou complementares”. A empresa está registada com a CAE (classificação de atividade económica) de compra e venda de bens imobiliários, mas a Racius adianta outras informações: “A sociedade tem, ainda, por objeto operar no ramo de atividade de consultoria empresarial, bem como na organização e realização de palestras, cursos, seminários, congressos, simpósios e demais eventos sobre assuntos de interesse empresarial.”
O que dizem as várias leis
A lei 64/93, de 26 de agosto, sobre incompatibilidades dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, estabelece no nº. 2 do artigo 4.º que a titularidade de cargos políticos e de altos cargos públicos é “incompatível com quaisquer outras funções profissionais remuneradas ou não, bem como com a integração em corpos sociais de quaisquer pessoas coletivas de fins lucrativos“.
Ao mesmo tempo, o Código das Sociedades Comerciais determina no artigo 252º. dedicado à composição da gerência das sociedades por quotas que “a sociedade é administrada e representada por um ou mais gerentes, que podem ser escolhidos de entre estranhos à sociedade e devem ser pessoas singulares com capacidade jurídica plena“, indicando assim que o gerente tem o peso de um administrador da empresa.
Mas, já depois da posse e de entregar a declaração no TC, o ministro “renunciou à gerência”, disse ao ECO fonte oficial do gabinete de Siza Vieira. “A retificação está no registo de interesses entregue na Assembleia da República” que foi enviado para o Parlamento a 31 de janeiro deste ano, garantiu a mesma fonte. Ou seja, o ministro terá acumulado a gerência da empresa com a função executiva, não se sabendo durante quanto tempo.
O regime de incompatibilidades dos titulares de cargos políticos acrescenta ainda um impedimento para as sociedades detidas por aquele tipo de titulares. “As empresas cujo capital seja detido numa percentagem superior a 10% por um titular de órgão de soberania ou titular de cargo político, ou por alto cargo público, ficam impedidas de participar em concursos de fornecimento de bens ou serviços, no exercício de atividade de comércio ou indústria, em contratos com o Estado e demais pessoas coletivas públicas.” Isto significa que a Prática Magenta não pode concorrer a concursos do Estado.
O que faz Siza Vieira no Governo. O caso das REIT
No Governo, e de acordo com a lei orgânica, Pedro Siza Vieira acompanha matérias do foro empresarial. “Compete à ministra da Presidência e da Modernização Administrativa a promoção de reuniões de coordenação de assuntos económicos e de investimento, visando favorecer a concretização célere de projetos de investimento relevantes, em coordenação com o ministro dos Negócios Estrangeiros, com o ministro Adjunto e com o ministro da Economia.”
Antes de chegar ao Governo, foi membro da unidade de missão do Programa Capitalizar que apresentou ao Executivo um conjunto de medidas para dinamizar a economia e o mercado de capitais. Algumas estão já em vigor como, por exemplo, as Sociedades de Investimento Mobiliário para o Fomento da Economia (SIMFE). Além disso, Pedro Siza Vieira tem sido dentro do Executivo um forte defensor dos REIT – os Real Estate Investment Trusts – um tipo de sociedades de investimento imobiliário cotadas em bolsa e que têm como objetivo dinamizar este mercado imobiliário, sabe o ECO.
Siza Vieira não vê qualquer impedimento entre as tarefas que desempenha no Executivo e o facto de ter uma quota de 50% numa empresa no setor imobiliário ou de ter defendido as SIMFE. Questionado pelo ECO, através do gabinete de imprensa, sobre se vê algum condicionamento legal e/ou ético, o ministro foi categórico: “Não”.
O Código de Conduta, aprovado por este Governo em setembro de 2016, fixa também regras para os membros do Executivo com o objetivo de valorizar o exercício dos cargos públicos, onde são fixadas normas sobre como gerir situações de possíveis conflitos de interesse.
Esta foi aliás a legislação invocada recentemente pelo ministro Siza Vieira para pedir escusa de intervir em matérias relacionadas com o setor elétrico enquanto se encontrar em curso a OPA da China Three Gorges sobre a totalidade do capital da EDP. No despacho onde o primeiro-ministro dispensa Siza Vieira de intervir nestas matérias, António Costa explica que tinha pedido ao ministro Adjunto que acompanhasse diversos assuntos energéticos. Além disso, o chefe do Executivo adianta que a CTG é assessorada pela Linktaters, a sociedade de advogados de onde veio Siza Vieira e onde foi sócio durante 16 anos. Apesar de ter dito que não teve “qualquer contacto” como advogado com a CTG ou com seus representantes, o ministro Pedro Siza Vieira entendeu que “a situação pode suscitar dúvidas sobre a sua imparcialidade na apreciação das matérias relativas ao setor elétrico”.
Na semana passada foi adiantado pelo Público que o Governo alterou uma lei à medida da OPA à EDP e o Expresso avançou que o ministro Siza Vieira reuniu com a empresa CTG quando já estava em funções, uma notícia que levou o ministro a fazer um esclarecimento ao semanário do grupo Impresa.
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