Atrasos põem em risco quase três milhões em fundos comunitários
Ainda não foram feitos quaisquer pedidos de pagamento à Comissão Europeia no âmbito do programa Interreg Espanha-Portugal. Regra da guilhotina exige que sejam executados 2,94 milhões este ano.
Dificuldades na implementação do programa e uma nova aplicação informática levam a que o programa de cooperação europeia Interreg Espanha-Portugal ainda não tenha submetido um único pedido de pagamentos à Comissão Europeia. De acordo com a regra da guilhotina, que obriga a que o orçamento de cada ano seja gasto nos três anos seguintes, em 2018 é necessário executar 2,94 milhões de euros neste programa. O que não for, tem de ser devolvido a Bruxelas.
De acordo com os dados que a Agência para o Desenvolvimento e Coesão (AD&C) enviou ao ECO, o Programa Operacional Cooperação Transfronteiriça Espanha/Portugal (POCTEP), rebatizado Interreg Espanha-Portugal, tinha programados 35,26 milhões de euros (sem reserva de desempenho) para o ano de 2014/2015, tendo recebido um pré-financiamento de 32,31 milhões de euros. Isto significa que é necessário executar, este ano, 2.944.410 euros. No entanto, a 24 de setembro ainda não tinha sido feito qualquer pedido de pagamento à Comissão Europeia.
Ou seja, ainda não tinha sido apresentado qualquer pedido de reembolso, contra a apresentação de faturas, já certificadas pelos serviços. Uma situação que se manteve, pelo menos até 16 de outubro. Caso os 2,94 milhões de euros não sejam executados é necessário devolvê-los a Bruxelas. Total ou parcialmente.
O ECO questionou a autoridade de gestão deste programa sobre o risco de devolução de verbas, mas a convicção é de que “os objetivos e compromissos financeiros previstos para o programa serão alcançados”. “O conjunto das estruturas de gestão do Programa, assim como os beneficiários dos projetos aprovados têm vindo a desenvolver um grande esforço para alcançar os compromissos financeiros do Programa assim como, a curto prazo, a meta de execução imposta pela regra do N+3 para 31/12/2018”, disse ao ECO fonte oficial da autoridade de gestão, numa resposta enviada a 16 de outubro. Esta regra, também conhecida por guilhotina, determina que os países/programas têm de gastar o correspondente ao orçamento de cada ano nos três anos seguintes. Se não o fizerem, o montante remanescente tem de ser devolvido a Bruxelas.
E o que justificou os atrasos? As “dificuldades no arranque dos projetos deste período de programação 2014-2020 devido à necessidade de se adaptar às exigências dos novos regulamentos e à implementação da uma nova aplicação informática para a gestão global do Programa e dos projetos em todas as suas fases começando pela apresentação da candidatura e acabando no encerramento do projeto”, justificou fonte oficial deste Interreg.
Estas dificuldades têm como consequência o facto de não terem sido feitas transferências para os promotores deste programa, apurou o ECO junto de alguns destes interlocutores. Em causa estão projetos que potenciem a investigação, o desenvolvimento tecnológico e a inovação; melhorar a competitividade das PME; promover a adaptação às alterações climáticas em todos os setores ou ainda melhorar a capacidade institucional e a eficiência da Administração Pública.
Para justificar os atrasos, a autoridade de gestão sublinhou ainda uma “grande novidade neste novo período”: a “utilização da ‘assinatura digital’ através da aplicação informática Coopera 2020, desenvolvida pela Dirección General de Fondos Europeos del Ministerio de Hacienda (Autoridade de Gestão) e que implicou um longo período de adaptação por parte de todos os seus utilizadores”.
Mas o Interreg Espanha-Portugal não é o único programa de cooperação atrasado. O Programa Operacional Espaço Atlântico só tem 31% da meta cumprida. Neste caso o programa tem de executar, este ano, 2,55 milhões de euros. Mas, ao contrário do Interreg, neste caso já houve pedidos de pagamentos formalizados à Comissão Europeia (805,6 mil euros), de acordo com os dados fornecidos ao ECO, referentes a 24 de setembro. Dados que sofrem “variações contínuas”, alerta a AD&C.
Este programa de financiamento europeu apoia projetos de cooperação transnacional que contribuam para a coesão económica, social e territorial de 36 regiões atlânticas. São 185 milhões de euros que podem ser usados apenas por cinco países: Portugal, Espanha, França, Reino Unido e Irlanda.
“Podemos efetivamente indicar que existe, neste momento, um atraso generalizado na execução de todos os Programas de Cooperação Europeia”, sublinhou a autoridade de gestão do Interreg Espanha-Portugal. Um atraso com o qual as autoridades nacionais garantem não ter nada a ver. “Os programas de cooperação territorial não integram o Portugal 2020, e por isso não são da responsabilidade de Portugal“, esclareceu fonte oficial do Ministério do Planeamento.
Podemos efetivamente indicar que existe, neste momento, um atraso generalizado na execução de todos os Programas de Cooperação Europeia.
Entre os programas operacionais que integram Portugal 2020, o que está mais atrasado é o do Mar com apenas 45% da meta cumprida. Um valor que compara, por exemplo com 230% do Programa Operacional Capital Humano (POCH), 271% do Programa Operacional dos Açores ou 231% do da Madeira ou ainda 88% do Programa Operacional do Alentejo.
Cumprimento da regra N+3 em 2018
Na tabela e baixo é possível ver na primeira coluna o valor da dotação de cada programa correspondente ao ano de 2014/2015, ao qual já é retirada a reserva de desempenho (6% do valor de cada programa). Esta reserva destina-se a premiar os promotores que têm melhor desempenho. O dinheiro é retido até ao final deste ano altura em que são feitas as contas e, a partir de 2019, é distribuído por aqueles que têm melhor desempenho em termos de execução do respetivo programa operacional. Este é um ato de gestão interna, que não implica qualquer risco de devolução de dinheiro a Bruxelas.
Na segunda coluna surgem os pré-financiamentos, verbas que a Comissão Europeia adianta a cada Estado-membro para ajudar a executar os fundos comunitários. É por isso que estes montantes são contabilizados no cálculo para aplicar a regra da guilhotina, porque, na lógica de Bruxelas, as verbas são contabilizadas como fundo realizado.
A terceira coluna apresenta a meta a executar este ano e a seguinte os pedidos de pagamento já enviados para Bruxelas. A tabela revela que, na maior parte dos programas operacionais, o grau de cumprimento das metas foi mais do que ultrapassado. A última coluna apresenta os montantes que eventualmente estarão em risco de ser devolvidos a Bruxelas: um total de 58,57 milhões de euros. Ou seja, é necessário apresentar a Bruxelas pedidos de pagamento neste valor. De acordo com os dados fornecidos, até 24 de setembro, já tinham sido apresentados pedidos de reembolso, contra a apresentação de faturas, já certificadas pelos serviços no valor de 5,02 mil milhões de euros.
O POSEUR, onde se inserem os investimentos em eficiência energética, adaptação às alterações climáticas, setor dos resíduos e ciclo urbano da água, é aquele que tem o desafio maior para cumprir as metas, porque estão em causa 28 milhões de euros cujo reembolso é necessário solicitar a Bruxelas.
E como as “metas não começam do zero, as metas N+3 são cumulativas”, para o ano, “Portugal terá de submeter pedidos de pagamento a Bruxelas relativos ao somatório de 2014, 2015 e 2016”. “Desta forma, o montante a mais cumprido num ano conta para o cumprimento da meta do ano seguinte“, explicou ao ECO fonte oficial do Ministério do Planeamento.
“Face ao grau de execução dos programas operacionais do PT 2020, que a esta data considerada ainda não cumprem a meta, consideramos que, atentos os montantes em causa, não haverá qualquer risco de incumprimento”, corroborou ao ECO fonte oficial da AD&C. “De sublinhar que é nossa expectativa que no próximo PPI a submeter à CE, esta meta possa ficar cumprida para todos os PO“, acrescenta a mesma fonte.
Apesar do mau desempenho dos programas de Cooperação, justificado pela “complexidade subjacente à sua execução, já que envolve vários Estados-membro”, a AD&C tem a “expectativa de que a meta seja cumprida até ao final do ano, não havendo assim qualquer risco de Portugal perder fundos“.
Face ao grau de execução dos programas operacionais do PT 2020, que a esta data considerada ainda não cumprem a meta, consideramos que, atentos os montantes em causa, não haverá qualquer risco de incumprimento.
O cumprimento das metas tornou-se mais fácil dada a alteração das regras introduzida em novembro de 2017. Até então a regra da guilhotina não se aplicava apenas do ponto de vista geral. O raciocínio do N+3 tinha de ser aplicado a cada um dos programas operacionais individualmente e dentro destes a cada um dos fundos que os financiam. Por exemplo, o Compete, o programa operacional das empresas, é financiado em grande medida pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (Feder), mas também tem um pouco de Fundo Social Europeu (FSE), para pagar as ações de formação, etc, e o Fundo de Coesão para pagar ferrovias e outros projetos. Em cada uma destas três gavetas era necessário fazer o cálculo da regra e garantir que a execução estava em dia.
Agora, a Comissão Europeia atualizou a metodologia, explicou fonte oficial da AD&C, e o montante da anulação passou a ser calculado ao nível do programa operacional e não por categoria de região ou Fundo.
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