Empresas deslocam produção para Marrocos e continuam a “servir” a Inditex
A Inditex está a encolher as compras a Portugal. Há empresas afetadas, mas há outras que continuam a trabalhar com o gigante espanhol a partir de Marrocos. Na Polopique, encomendas cresceram 25%.
Apesar de se assistir a uma queda das exportações para Espanha no setor têxtil, devido sobretudo à diminuição de encomendas da gigante Inditex, as empresas nacionais não estar a trabalhar menos para a dona da Zara. Há empresas nacionais que estão a deslocar a produção para Marrocos, onde, de resto, já estavam presentes, e continuam assim a trabalhar com a gigante espanhola.
Segundo Paulo Vaz, diretor-geral da ATP, “haverá empresas que poderão estar a ser afetadas com esta situação, mas o que acontece é que existem empresas nacionais que estão presentes em Marrocos e que, a partir desse mercado, continuam a trabalhar para a Inditex”.
Resultado, as empresas não são afetadas, mas as exportações caem. Os dados do Instituto Nacional de Estatística dão conta de que, entre janeiro e novembro, as exportações para Espanha recuaram 4% (menos 67 milhões de euros) em relação a igual período do ano anterior. Uma tendência que já se tinha feito sentir em 2017, ano em que o setor têxtil alcançou o valor recorde de exportações com 5,2 mil milhões de euros, mas em que as exportações para Espanha encolheram 0,6%. A notícia de que a Inditex está a colocar menos encomendas em Portugal foi avançada esta sexta-feira pelo Jornal de Negócios (acesso pago), dando conta de que existem nuvens de incerteza no setor.
Mas o que estará a fazer a Inditex mudar a rota das suas compras? Paulo Vaz não tem dúvidas. “A Inditex está a mudar a política de aprovisionamento, está a lutar pela margem, daí que queira custos mais baixos, além de que as vendas da empresa espanhola estão a crescer ao ritmo mais lento em quatro anos, e está a apostar fortemente no canal de vendas online”, afirma.
A estes fatores há ainda, segundo o diretor-geral da ATP, que juntar o facto de que “a própria conjuntura económica mundial está a abrandar“, e isso “tem reflexos no nosso setor”.
Uma opinião partilhada pelo presidente da Polopique, um dos grandes fornecedores da Inditex. Luís Guimarães considera que há vários aspetos que têm levado à diminuição das encomendas por parte da Inditex. Desde logo, o facto da empresa de Amâncio Ortega também estar a ser atingida, “como todas as outras empresas, em menor dimensão, pelo fenómeno dos millennials, ou seja, a roupa deixou de ser um item prioritário e passou para terceiro lugar. Hoje viaja-se mais, procura-se um bom restaurante e só depois é que vem o apetite de comprar roupa”.
A este facto há a somar o caso da Turquia. Luís Guimarães recorda que o grande concorrente de Portugal “desvalorizou a moeda em 30%, o que se traduziu em menos competitividade para Portugal”.
O presidente da Polopique fala também na questão da mão-de-obra. Para o empresário, “outro fator que começa a ser preocupante é o encerramento de pequenas empresas por falta de mão-de-obra, reduzindo assim a capacidade produtiva em Portugal, obrigando as empresas a recorrerem a este serviço nos países do Magrebe, como Marrocos, Tunísia e Egito”. “Como foi o nosso caso”, admite.
Luís Guimarães diz ainda que “a indústria têxtil em Portugal empregou, e continua a empregar, muitas pessoas, foi uma indústria que passou por várias crises e que se aguentou, sendo um player importante nas exportações deste país e que apesar da diminuição que o setor tem vindo a atravessar pelas razões já referidas continua a crescer nas exportações”.
Até agora ainda nenhuma empresa nos procurou dando conta de dificuldades devido ao abrandamento das encomendas da Inditex, o que não quer dizer que este não seja um fator preocupante para o setor.
Apesar das dificuldades assumidas, Paulo Vaz diz que “até agora ainda nenhuma empresa” os procurou “dando conta de dificuldades devido ao abrandamento das encomendas da Inditex, o que não quer dizer que este não seja um fator preocupante para o setor”. Paulo Vaz recorda, no entanto, que “este setor já viveu tempos difíceis e soube superá-los pelo que, de certeza, vai conseguir superar mais este revés”.
“Não se pode, como aliás, foi bem evidente no passado, estar dependente de um só mercado e de um só cliente. Quando assim é há problemas”, remata. Mas, acrescenta, “é uma lição que penso que os empresários e as nossas empresas aprenderam, na medida, em que, segundo os dados do INE, as exportações para Itália estão a crescer (mais 78 milhões de euros) e isso demonstra que há aqui uma resposta à queda do mercado espanhol e inglês.
Encomendas da Inditex à Polopique aumentaram em 20 milhões de euros
A Polopique é uma das principais fornecedoras nacionais da Inditex e, para já, não parece afetada pelo recuo de encomendas da gigante espanhola a Portugal. Prova disso são os números da empresa. Luís Guimarães diz que, “como fornecedor”, a empresa teve “um aumento de mais de 25% em relação a 2017, cerca de 20 milhões de euros”. Já para o primeiro trimestre de este ano, a Polopique prevê um “aumento de mais de 10% em relação ao período homólogo de 2018”.
Como fornecedor, na nossa empresa tivemos um aumento de mais de 25% em relação a 2017, cerca de 20 milhões de euros.
Ainda assim, Luís Guimarães reconhece que, infelizmente, a queda de encomendas por parte da dona da Zara é real, “só que não de forma alarmante”. De resto, o empresário considera que “Portugal continua a ser um país bastante apetecível, não só para o grupo Inditex, que tem interesse não só em recuperar, como também em crescer, assim como para outras marcas do setor”.
Luís Guimarães admite, no entanto, que “é necessário o país ter uma indústria de vestuário mais forte e mais unida para poder continuar a fazer crescer esse apetite”.
Nesse sentido, prossegue o presidente da Polopique, “é necessário que as pequenas empresas criem parcerias fortes, de forma à quase verticalização da produção, de forma a podermos responder com mais eficiência e rapidez já que a qualidade existe. Daí o apetite pelo Made in Portugal”.
Luís Guimarães recorda que Portugal “é um país que está a três horas de carro de três das marcas do grupo Inditex e a duas horas das outras marcas deste grupo. Assim como a 2/3 horas de avião de outras grandes marcas que necessitam de comprar com menos tempo para conseguirem ser mais assertivoas nas compras e evitar os stocks que lhes trazem as compras feitas na Ásia”. “Insisto que a boa qualidade do produto e a facilidade que temos no diálogo com os intervenientes, são aspetos relevantes para procurarem o Made in Portugal”, acrescenta.
Nesse sentido, o empresário faz um apelo aos governantes para que “se interessem mais por este setor”, em vez de “se preocuparem em criar mil e tal postos de trabalho para a Função Pública”.
Para Luís Guimarães, notícias que dão conta da redução do nível de compras da Inditex às empresas têxteis nacionais “não ajudam em nada a relação com o grupo” espanhol, de que Portugal “tanto precisa”, avisa. O empresário frisa ainda que “é preciso levar em linha de conta a quantidade e a responsabilidade direta e indireta que este grupo tem no mercado de trabalho em Portugal”.
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