Venda de barragens da EDP envolve dezenas de advogados

Mais de três dezenas de advogados estiveram envolvidos na operação, que liderou o M&A em Portugal no ano passado. Descubra todos os pormenores do negócio do mês da Advocatus.

A venda de barragens da EDP era um negócio há muito ansiado, que esteve fechado entre as paredes de sociedades de advogados durante mais de seis meses. A elétrica liderada por António Mexia acordou, em dezembro, a alienação das centrais no Douro, num negócio que permitirá à EDP reorganizar ativos da empresa e reduzir dívida. Há, no entanto, ainda desafios relacionados com as autorizações regulatórias.

Após meses de negociações com interessados internacionais, foi um consórcio de investidores franceses formado pela energética Engie (com 40%), a seguradora Crédit Agricole Assurances (com 35%) e Mirova do grupo Natixis (com 25%) a ficar com as seis centrais hídricas, que totalizam 1.689 megawatts (MW) de capacidade instalada e localizam-se na bacia hidrográfica do rio Douro. O valor da transação, de 2.210 milhões de euros, fica cerca de 200 milhões acima do esperado pelo mercado.

Do lado da EDP, foi a Morais Leitão a sociedade responsável pela assessoria jurídica do negócio, através da equipa de M&A e energia liderada pelo sócio Ricardo Andrade Amaro. “Estamos a trabalhar neste negócio desde o início de abril do ano passado, sensivelmente”, explicou Andrade Amaro à Advocatus.

No total, têm estado envolvidos cerca de 15 advogados, de acordo com o sócio da Morais Leitão. Clarificou que, além das equipas de fusões e aquisições e de energia, também houve participações nas vertentes de direito público, bem como de direito europeu e da concorrência.

Toda a operação foi montada para lidar com os desafios da complexidade da operação, especialmente num curto espaço de tempo. “Por um lado, a complexidade inerente aos ativos e à própria estrutura da transação, que implicou uma análise jurídica multidisciplinar e que foi possível contornar graças à coesão e boa organização da equipa e a muito trabalho”, afirmou Ricardo Andrade Amaro sobre as principais dificuldades.

“Por outro lado, os constrangimentos temporais. O nosso cliente pretendia assinar o contrato ainda em 2019 e antes do Natal, e assim foi. Isso significa, tendo em conta a dimensão do negócio em causa, que todo o processo até à assinatura foi implementado em tempo recorde”, sublinhou.

Consórcio liderado pela Engie procurou Cuatrecasas em setembro

Já do lado do consórcio francês, a assessoria foi feita pela Cuatrecasas, tendo sido coordenada por Francisco Santos Costa, sócio da área de Societário e M&A. A equipa contou com a participação de mais de 20 advogados das áreas dessas duas áreas, mas também de Público e Regulatório, Direito Europeu e da Concorrência, Bancário, Financeiro e Mercado de Capitais, Fiscal, Laboral e Contencioso.

Neste caso, a “assessoria a esta transação teve início em setembro de 2019, tendo incluído a participação de mais de 20 advogados pertencentes a diferentes áreas de prática da Cuatrecasas”, explicou Francisco Santos Costa. “Considerando a dimensão do projeto, houve necessidade de constituir uma equipa multidisciplinar para dar resposta a todos os desafios que o mesmo colocou”.

O sócio da Cuatrecasas concordou que a principal dificuldade foi a “elevada complexidade técnica” resultante de circunstâncias diversas.

“Em primeiro lugar, por se tratar de um setor regulado, no qual é necessário acautelar a intervenção e escrutínio prévio de diferentes entidades reguladores setoriais, a que acresce a avaliação dos efeitos jus-concorrenciais da transação. Por outro lado, por se tratar da primeira grande operação de M&A em Portugal que envolveu ativos hídricos de dimensão relevante (grandes barragens)”, clarificou.

Apesar de já terem ocorrido vendas de centrais mini-hídricas noutras ocasiões, nunca tinha havido um projeto semelhante desta dimensão. Para acontecer, tiveram de se destacar os ativos afetos à unidade de negócio a transmitir do universo de sociedades do grupo EDP previamente à alienação.

Por último, tendo o comprador sido selecionado no âmbito de um processo competitivo internacional, “foi necessário garantir uma total articulação entre as várias equipas de assessoria e de due diligence, do lado do comprador, e estabelecer critérios rigorosos de análise e avaliação dos ativos que permitissem a identificação de riscos que, pela sua materialidade, pudessem pôr em causa o negócio”, apontou.

“Só um trabalho de equipa conjunto e de interligação permanente entre todos os assessores do consórcio comprador, incluindo diferentes assessores jurídicos, financeiros, fiscais e técnicos, permitiu fechar uma transação desta dimensão num prazo tão curto de tempo”, acrescentou Francisco Santos Costa.

Só um trabalho de equipa conjunto e de interligação permanente entre todos os assessores do consórcio comprador, incluindo diferentes assessores jurídicos, financeiros, fiscais e técnicos, permitiu fechar uma transação desta dimensão num prazo tão curto de tempo.

Francisco Santos Costa

Cuatrecasas

Além das portuguesas Cuatrecasas e Morais Leitão, o consórcio francês foi ainda assessorado por três outros escritórios de advogados franceses: o BredinPrat, o BDGS e o CLP-Cliperton. Já no caso da assessoria financeira, o J.P. Morgan prestou consultoria à Engie, enquanto o banco francês BNP Paribas atuou em exclusivo como financial advisor do Crédit Agricole.

Autorizações regulatórias são o próximo desafio das sociedades

Mas os desafios ainda não acabaram. É que, “após a assinatura do contrato que titula a compra dos ativos no final de 2019, teve início uma nova fase da transação que culminará com a transferência dos ativos adquiridos para o consórcio comprador após o cumprimento de todas as condições a que o negócio foi sujeito”, lembrou Santos Costa.

Para o negócio ficar fechado, ainda tem de ser recebida autorização do Governo, através da Agência Portuguesa do Ambiente e da DGEG – Direção Geral de Energia e Geologia, bem como da Comissão Europeia através da Autoridade da Concorrência. A estimativa da empresa liderada por António Mexia é que o negócio fique fechado em junho. Até lá, tanto Cuatrecasas como Morais Leitão continuarão a trabalhar com as duas partes.

“As autorizações regulatórias são em primeira linha, da responsabilidade da vendedora, pelo que é a Morais Leitão quem está, nesse aspeto, a liderar o processo”, afirmou Ricardo Andrade Amaro, da Morais Leitão. “Além da obtenção das autorizações regulatórias, parece-nos que o principal desafio que se segue será a implementação da operação de destaque e transmissão dos ativos para a nova sociedade constituída pelo consórcio, a qual implicará a preparação de muita documentação e um esforço adicional de coordenação entre todas as equipas envolvidas”, acrescentou.

Além da obtenção das autorizações regulatórias, parece-nos que o principal desafio que se segue será a implementação da operação de destaque e transmissão dos ativos para a nova sociedade constituída pelo consórcio, a qual implicará a preparação de muita documentação e um esforço adicional de coordenação entre todas as equipas envolvidas.

Ricardo Andrade Amaro

Morais Leitão

Do lado de quem compra, a perspetiva para o desenvolvimento destes passos é positiva. “Tendo em conta a experiência da Engie como player global no setor elétrico, a dimensão do seu portefólio de ativos hídricos em operação e o aumento da concorrência no setor no mercado ibérico, estamos confiantes num desfecho positivo para esta operação”, referiu ainda Francisco Santos Costa, da Cuatrecasas

Acrescentou que a sociedade continuará a prestar assessoria jurídica ao consórcio, “em estreita colaboração com o vendedor e os seus assessores jurídicos, durante a fase que decorrerá entre a assinatura do contrato de compra e venda dos ativos e a conclusão da operação”.

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