Covid-19 já tirou mil milhões aos donos das grandes empresas portuguesas

Já são sete as grandes empresas em Portugal a anunciar que afinal não vão pagar dividendos referentes aos lucros de 2019. A pressão de reguladores e políticos poderá levar outras a seguir o exemplo.

Os acionistas vão receber menos dividendos este ano. Com a pandemia de Covid-19 a penalizar a atividade de parte dos negócios, há pelo menos sete grandes empresas que já anunciaram a suspensão da remuneração acionista. E com políticos e reguladores a pressionarem, o número pode ainda aumentar.

Caixa Geral de Depósitos (CGD), BCP e Santander Totta estão entre os que já decidiram guardar os lucros do exercício de 2019. Mas a tendência não é só dos bancos: o mesmo foi decidido pelos CTT, Novabase, Sonae Capital e Merlin Properties. No total, os acionistas destas sete empresas já perderam quase mil milhões de euros.

Os bancos estão na linha da frente, com vários políticos e o próprio Presidente da República a chamarem a atenção que esta é a altura de ajudar a economia e retribuir aos portugueses o que receberam durante a crise. Por isso, não deve haver nem lucros nem dividendos. E os reguladores concordavam com o Banco Central Europeu (BCE) a aconselhar prudência na remuneração dos acionistas.

Ainda antes destas recomendações, já o BCP o tinha anunciado. Após ter pago dividendos pela primeira vez depois da crise, voltou a suspendê-los. Os acionistas do banco liderado por Miguel Maya — sendo os principais os grupos Fosun (com 27%) e Sonangol (com 19,5%) — receberam 30,1 milhões no ano passado e o aumento dos lucros fazia prever um reforço na remuneração acionista.

No entanto, os “potenciais impactos e a incerteza associada à situação de pandemia” levaram o conselho de administração do BCP a propor a retenção dos resultados. Em alternativa, preferia dar 5,3 milhões aos trabalhadores para compensar pelos cortes salariais entre 2014 e 2017.

Dias depois era a vez da Caixa. Apontava para “a orientação do BCE”, dizia ter “auscultado o acionista”, ou seja o Estado, e decidido recomendar a integração em reservas livres da totalidade do resultado líquido de 2019. Em vez de entregar 300 milhões ao acionista Estado (era este o montante que o Governo tinha inscrito no Orçamento do Estado), este valor será incorporado nos rácios de capital do banco púbico.

Ainda na banca, o Santander Totta (totalmente detido pelo espanhol Santander) decidiu também não remunerar o acionista. O banco liderado por Pedro Castro Almeida seguia as pisadas da casa-mãe e mantinha os resultados no balanço para combater o impacto do vírus. No ano passado, os dividendos tinham atingido os 495 milhões e este ano poderia subir à boleia dos lucros.

Estes três bancos estão entre os que se reuniram (numa conferência virtual) com o Presidência da República na semana passada. Além destes, estiveram também presentes o Novo Banco (que tem prejuízos e não distribui dividendos) e o BPI, o único que ainda não se pronunciou sobre o assunto. Contacto pelo ECO, o banco liderado por Fernando Ulrich recusou fazer comentários.

Bancos tinham remunerações mais atrativas

Por todos os setores impera a prevenção

Mas o tema dos dividendos não é limitado à banca. Empresas de todos os setores (uns mais e outros menos) estão a sofrer com a pandemia e outras cotadas da bolsa de Lisboa já decidiram reter os lucros.

A primeira foi a tecnológica Novabase, que tinha proposto pagar 26,7 milhões de euros aos acionistas sob a forma de dividendos e recuou. A empresa é detida em mais de 40% pelos fundadores e pelos gestores da empresa José Oom Ferreira de Sousa, Luís Paulo Salvado, Álvaro Ferreira e João Silva Bento.

Os CTT — cujo maior acionista é o grupo Manuel Champalimaud — iam distribuir 16,5 milhões que ficam por pagar, tal como todos os prémios aos gestores ou trabalhadores, enquanto a assembleia geral de acionistas fica adiada. A Sonae Capital cancelou a distribuição de 15 milhões em dividendos (principalmente à casa-mãe) para “assegurar uma acrescida estabilidade financeira” da empresa.

A Merlin Proporties, uma recém-chegada cotada à bolsa de Lisboa, não cancelou, mas decidiu reduzir a remuneração acionista. A empresa espanhola do setor imobiliário (que está cotada em Portugal e Espanha e que tem como principal acionista o banco Santander) manteve a distribuição de lucros, mas cortou a parcela que era referente à distribuição de reservas. Com esta quebra, são 80,93 milhões de euros que os investidores não vão receber.

Entre as restantes cotadas da bolsa de Lisboa, a Ibersol não fez qualquer anúncio, mas como colocou parte dos trabalhadores em lay-off deverá ser obrigada a tomar a mesma decisão. Já a Navigator e a Semapa cortaram os dividendos face ao ano passado, mas não associaram a decisão à Covid-19. A Pharol — que passou de prejuízos a lucros no ano passado — também já decidido anteriormente guardar esse montante.

Poucas são as cotadas que já confirmaram que vão manter a remuneração: a EDP Renováveis, a Sonae, a Galp Energia e a REN deram garantias de que vão distribuir dividendos como planeado. E o grupo de empresas que suspende a remuneração acionista poderá ainda crescer.

Devido ao período de exceção, as cotadas podem voltar atrás nas propostas feitas. E até têm maior margem para o fazer já que o prazo para a realização das assembleias gerais anuais foi prolongado até 30 de junho. Tal como a operadora postal, a Jerónimo Martins foi uma das empresas que já anunciou o adiamento da AG, sem fazer referência a potenciais alterações à remuneração acionista. Questionada pelo ECO, a dona do Pingo Doce explicou que, para já, não houve alterações às propostas apresentadas, mas poderá ainda fazê-lo.

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