O que implica o novo regime que a TAP ameaça impor se acordo com sindicatos falhar?
Administração da companhia aérea e sindicatos tentam fechar acordo de emergência ainda hoje. Se não conseguirem, o cenário em cima da mesa é o regime sucedâneo.
Os sindicatos da TAP e a administração ultimam negociações para tentar chegar a um acordo de emergência, que defina as relações laborais enquanto são trabalhados novos acordos de empresa. Os encontros irão decorrer ao longo do dia, mas várias estruturas sindicais têm apontado críticas à proposta da companhia. Se as duas partes não conseguirem chegar a um consenso, a TAP ameaça avançar para um regime sucedâneo e os sindicatos a responder judicialmente.
A TAP, tal como a Portugália e a Cateringpor, foi decretada empresa em situação económica difícil, o que permitiu suspender os acordos de empresa, que estavam em vigor, sob compromisso de iniciar a negociação de novos acordos com os sindicatos durante o primeiro trimestre de 2021. Até lá, ficou um vazio no quadro regulamentar que rege a contratação coletiva e os direitos dos trabalhadores. A administração da TAP começou assim a negociar um acordo de emergência provisório, que ainda está em cima da mesa.
No entanto, não é certo que seja assinado pelos representantes dos trabalhadores. Em alternativa, o decreto permite-lhe aplicar de forma unilateral um regime sucedâneo, que implica “a redução de condições de trabalho e a não-aplicação ou a suspensão, total ou parcial, das cláusulas dos acordos de empresa ou dos instrumentos de regulamentação coletiva aplicáveis”, segundo explica Joana de Sá sócia do escritório PRA-Raposo, Sá Miranda & Associados.
“O regime sucedâneo das relações de trabalho substitui integralmente as condições anteriores vigentes, sem prejuízo do direito dos trabalhadores à devida indemnização em caso de despedimento sem justa causa, mas não pode afetar os benefícios sociais e as restantes garantias mínimas fixadas por lei“, sublinha.
O mesmo lembra Pedro da Quitéria Faria, sócio da Antas da Cunha ECIJA, que aponta que passam a estar em vigor apenas as leis gerias do Código do Trabalho, bem como os regimes específicos do setor, nomeadamente no que diz respeito aos tempos de descanso. É o caso da diretiva europeia que define e regula o tempo de trabalho do pessoal móvel da aviação civil, designadamente no que respeita aos limites dos tempos de serviço de voo e de repouso.
Tem de ser o Governo a decretar (e renovar) regime sucedâneo
Esta não é a primeira vez que os trabalhadores da TAP se veem neste cenário. Em 1993, um despacho conjunto dos Ministros das Finanças, dos Transportes e do Emprego definia o regime sucedâneo aplicável às relações laborais dentro da companhia aérea, também nessa altura declarada como empresa em situação económica difícil.
Os dois advogados consultados pelo ECO lembram que essa é uma das características do regime sucedâneo: tem de ser decretado pelo Governo, apesar de ser a administração da TAP a liderar as negociações (mandatada pelo Executivo, que tem estado algumas vezes presente na pessoa do ministro das Infraestruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos e do secretário de Estado Adjunto e das Comunicações, Hugo Santos Mendes).
O objetivo era ter conseguido chegar um acordo de emergência ou decidir pelo regime sucedâneo até ao domingo passado, o que não aconteceu, com as duas partes a marcarem mais reuniões. Os representantes dos trabalhadores têm apresentado contra propostas focadas essencialmente em medidas voluntárias de ajustamento na força de trabalho ou em maiores cortes salariais, sob compromisso de que não haja despedimentos coletivos. No entanto, esta será uma condição em que o Governo não cede, relatam várias fontes sindicais com quem o ECO falou. Aliás, uma das razões para decretar a empresa como em situação económica difícil terá sido exatamente a possibilidade de fazer despedimentos coletivos.
Apesar de ninguém se comprometer se irá ou não assinar o acordo, vários sindicatos têm criticado o documento apresentado pela TAP, que consideram demasiado extensivo nos cortes dos direitos laborais. No entanto, rejeitam também o regime sucedâneo, que Pedro da Quitéria Faria sublinha que “nada tem a ver com os acordos de empresa”. Os dois advogados explicam ainda que, tal como nos anos 1990, os sindicatos poderão recorrer a meios judiciais para tentar travar a aplicação do regime sucedâneo.
Mesmo que não o consigam fazer, este não pode ser permanente. “Este diploma [da situação económica difícil] estabelece que este regime sucedâneo permanece em vigor no prazo de um ano, sendo que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 3/2021, de 14 de janeiro, veio desde já consignar que os efeitos desta declaração se mantêm até 31 de dezembro 2021, podendo ser renovados por períodos iguais”, acrescenta Joana de Sá. A renovação deverá ser feita até 2024, prazo em que já se espera que haja novos acordos.
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