Morreu Otelo Saraiva de Carvalho
O coronel responsável pela elaboração do plano de operações militares do 25 de Abril de 1974 morreu.
Morreu o capitão de Abril Otelo Saraiva de Carvalho este domingo aos 84 anos, no Hospital Militar, onde estava internado, avançou a TSF em primeira mão e depois e confirmada à Lusa por Vasco Lourenço, presidente da Associação 25 de Abril.
Otelo foi o responsável pelo setor operacional da Comissão Coordenadora e Executiva do Movimento dos Capitães, elaborou o plano de operações militares do 25 de Abril de 1974 e dirigiu, com outros militares, as operações a partir do posto da Pontinha, no Regimento de Engenharia n.º 1.
Considerado um dos elementos mais carismáticos do MFA, Otelo foi nomeado comandante da Região Militar de Lisboa, e Comandante do COPCON, após a revolução. Além disso, pertenceu ao Conselho dos 20 e ao Conselho da Revolução.
Quem com ele privou destaca-lhe as características de liderança, mas também o otimismo. “Um homem de coração enorme”, disse Vasco Lourenço, em declarações à RTP1, sublinhando que Portugal tem de lhe “estar grato”. “Um homem cheio de espírito de intervenção que ia atrás das suas ideias repentinas”, recordou, por seu turno, o capitão de Abril, Garcia dos Santos. “Nunca teve inimigos”, garante Paulo Moura autor da biografia de Otelo, ouvido pela SIC Notícias, dando como exemplo o general Ramalho Eanes que o mandou deter, na sequência dos acontecimentos do 25 de Novembro. Foi libertado três meses mais tarde. Otelo voltou a ser detido em 1985 pela liderança das FP-25 de Abril, uma organização terrorista de extrema-esquerda, que operou em Portugal entre 1980 e 1987, e à qual foi imputada a autoria de 13 mortes e de dezenas de atentados. Por isso, para muitos, “Otelo é considerado uma figura controversa”, tal como sublinhou Nuno Gonçalo Poças, que escreveu um livro sobre a amnistia do Processo FP-25 de Abril, na SIC Notícias.
“É ainda cedo para a História o apreciar com a devida distância”, diz Marcelo Rebelo de Sousa, numa nota na página oficial da presidência da República. “No entanto, parece inquestionável a importância capital que teve no 25 de abril, o símbolo que constituiu de uma linha político-militar durante a revolução, que fica na memória de muitos portugueses associado a lances controversos no início da nossa Democracia, e que suscitou paixões, tal como rejeições”, acrescenta o Chefe de Estado, sublinhando que está “consciente das profundas clivagens que a sua personalidade suscitou e suscita na sociedade portuguesa”.
"O Presidente da República, consciente das profundas clivagens que a sua personalidade suscitou e suscita na sociedade portuguesa, evoca-o, neste momento como o Capitão que foi protagonista cimeiro num momento decisivo da História contemporânea portuguesa. ”
“A capacidade estratégica e operacional de Otelo Saraiva de Carvalho e a sua dedicação e generosidade foram decisivas para o sucesso, sem derramamento de sangue, da Revolução dos Cravos”, sublinha o Executivo num comunicado enviado às redações. “Tornou-se, por isso, e a justo título, um dos seus símbolos. Neste dia de tristeza honramos a memória de Otelo, como um daqueles a que todos devemos a libertação consumada no 25 de Abril e, portanto, o que hoje somos”, acrescenta a mesma nota.
O presidente da Assembleia da República homenageou “o maior símbolo individual do Movimento das Forças Armadas”, que concretizou o sonho de todos os que “ansiavam por viver em liberdade”. “Apesar dos excessos que se possam apontar, nomeadamente no período pós 25 de Abril, Otelo Saraiva de Carvalho foi, e será sempre considerado, o maior símbolo individual do Movimento das Forças Armadas”, pode ler-se numa mensagem de pesar de Eduardo Ferro Rodrigues, a que a Lusa teve acesso. “No momento do seu desaparecimento, e pelo seu decisivo contributo, é justo render-lhe a mais sentida homenagem”, enalteceu.
“Sobre o falecimento de Otelo Saraiva de Carvalho deve registar-se, no essencial, o seu papel no levantamento militar do 25 de Abril. O momento do seu falecimento não é a ocasião para registar atitudes e posicionamentos que marcam o seu percurso político”, refere uma nota do gabinete de imprensa do PCP.
A capacidade estratégica e operacional de Otelo Saraiva de Carvalho e a sua dedicação e generosidade foram decisivas para o sucesso, sem derramamento de sangue, da Revolução dos Cravos.
Rui Rio reconheceu “o papel corajoso e decisivo” de Otelo no 25 de Abril, considerando que será a história, com isenção, que avaliará o que “fez de bom e de mau”. “O dia da morte de Otelo Saraiva de Carvalho é momento para reconhecer o seu papel corajoso e decisivo no 25 de Abril e na conquista da liberdade”, disse Rui Rio, no Twitter.
“Uma dívida de gratidão” porque é a ele que Portugal “deve a democracia e a liberdade”, sublinha a líder do Bloco de Esquerda, Catarina Martins em declarações à Sic Notícias. “Uma figura maior do que a história”, disse ainda nas redes sociais.
“O CDS regista com tristeza” a morte de Otelo Saraiva de Carvalho, disse o vice-presidente do partido Miguel Barbosa assegurando à Lusa que o partido “não se deixa embriagar pela história”, naquele que considera ser “um dia agridoce para os portugueses”.
“Era um prático sem formação ideológica”, salientou Ana Gomes, explicando assim o seu papel nas FP-25 de Abril. “Inebriado pela dinâmica revolucionária, deixou-se instrumentalizar por outras pessoas com ideologia totalitária e anti-democrática“, disse em declarações na SIC Notícias. sublinhando que, “em política, a ideologia conta”, “as referências de ideias e objetivos, valores e princípios que orientam a ação prática”, porque “quem é um tático tanto pode trabalhar para um lado como para o outro” e “terá sido isso que explica a história de Otelo Saraiva de Carvalho”.
Para a antiga dirigente do extinto do Partido Revolucionário do Proletariado (PRP), movimento que exerceu atividade clandestina através das suas Brigadas Revolucionárias (no PRP-BR), Isabel do Carmo, com o desaparecimento do militar e estratego do 25 de Abril de 1974, “acaba também uma época e uma utopia”.
O desaparecimento de Otelo ganha um certo simbolismo dada a proximidade dos 50 anos do 24 de Abril, defendeu a historiadora Irene Flunser Pimentel, ouvida pela RTP3.
(Notícia atualizada pela última vez às 15h43 com a reação do CDS)
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