Sete alterações no relatório final do Novo Banco com governos na mira
O que mudou da versão preliminar para o relatório final? Os governos de Passos e Costa, afinal, tiveram responsabilidades na resolução do BES e na venda do Novo Banco.
A comissão de inquérito ao Novo Banco acabou com o relatório final aprovado, mas sem unanimidade. O PS votou contra o documento por causa das conclusões especialmente críticas em relação à atuação do governo de António Costa no processo de venda do banco em 2017. Por outro lado, naquilo que os socialistas consideram surpreendente, o PSD aprovou o relatório que diz que houve “fraude política” quando se resolveu o BES em 2014 — com responsabilidades do Governo de Passos Coelho — e se capitalizou o Novo Banco com apenas 4,9 mil milhões. À esquerda, as alterações foram bem recebidas na medida em que tanto um como outro governo foram responsabilizados.
Capitalização de 4,9 mil milhões foi “fraude política” do governo de Passos
Para o PCP, a decisão de resolver o BES em 2014 e dotar o Novo Banco com 4,9 mil milhões foi “uma fraude política” e que também “responsabiliza o Governo” de Passos Coelho (PSD/CDS-PP). E essa proposta acabou por ser acolhida pela comissão depois dos votos favoráveis do PS, Bloco, além dos comunistas, enquanto PSD, CDS, PAN e IL votaram contra.
O que diz a alteração? “Uma decisão que representou uma fraude política, uma vez que foi dito aos portugueses que seria possível resolver o banco com 4,9 mil milhões de euros, sabendo-se que o passivo da holding era superior a 12 mil milhões de euros”, é o que consta na versão final.
“Pelas suas implicações”, a decisão “também responsabiliza o Governo”, que na altura era liderado por Passos Coelho, numa coligação entre PSD e CDS.
Governo e supervisor foram “opacos” sobre impacto da resolução do BES
Foi ainda aprovada a proposta de alteração do Bloco de Esquerda sobre as declarações públicas do governo e do governador do Banco de Portugal no momento da resolução, em que estes “que asseguraram que esta decisão não imporia qualquer ónus aos contribuintes”.
“De acordo com o Tribunal de Contas, estas afirmações aumentaram a opacidade na comunicação do impacto da resolução do BES na sustentabilidade das finanças públicas”, nota a alteração proposta pelos bloquistas e acolhida por unanimidade.
Governo de Costa com “papel determinante” na venda
Sobre o processo de venda do Novo Banco ao fundo Lone Star, em 2017, os deputados apontaram responsabilidades ao primeiro governo de António Costa, sendo que o então ministro das Finanças e atual governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, também é implicado no processo. Apenas o PS votou contra as propostas de alteração.
Por exemplo, foi introduzida uma alteração proposta pela Iniciativa Liberal para acrescentar que “a decisão da venda ao fundo americano “Lone Star” coube ao BdP [Banco de Portugal] no exercício das suas competências” – como dizia a versão preliminar — e também “ao Governo” — acrescentou a versão final.
O PSD também viu aprovada a sua proposta de que a venda contou com “a colaboração do Ministério das Finanças que foi sendo informado sobre todo o processo“.
Outras duas propostas do Bloco também tiveram luz verde: que o governo de António Costa teve “um papel determinante, tanto nas negociações com a Comissão Europeia como na decisão final” e que a “venda do Novo Banco e as suas condições contratuais – definidas pelo Banco de Portugal e pelo XXI Governo Constitucional, em linha com as imposições europeias – não permitiram a melhor a salvaguarda do interesse público”.
Interesse público não foi acautelado
Ainda em relação à venda, PCP, CDS e Iniciativa Liberal apresentaram alterações no sentido de incluir no relatório final que a alienação “não assegurou a melhor utilização do erário público” (PCP) e que “não foi minimizado o seu impacto na sustentabilidade das finanças públicas nem reduzido o risco moral” (CDS). Para a Iniciativa Liberal, o processo de venda não acautelou “da melhor forma a defesa dos contribuintes”.
Todos sabiam que Novo Banco ia gastar toda a garantia
Com a venda ao Lone Star, foi criado um mecanismo de capital contingente no valor de 3,9 mil milhões de euros para compensar o banco relativamente a perdas com um conjunto de ativos.
No relatório final constará a conclusão de que ninguém – Governo, Banco de Portugal e Fundo de Resolução, instituições europeias e banco – assumiu publicamente que o montante ia ser esgotado na quase totalidade, apesar de todos saberem isso.
Foi aprovada a proposta do PSD, em que apenas o PS votou contra: “Todos os intervenientes no processo de venda do Novo Banco, nomeadamente o Governo, o Banco de Portugal, o Fundo de Resolução, as entidades europeias e o Novo Banco, sabiam desde o início que o limite de 3,89 mil milhões de euros do mecanismo de capital contingente (CCA, na sigla em inglês) iria ser quase integralmente utilizado, mas isso nunca foi assumido publicamente”.
Acordo criou incentivos para maximizar pedidos ao FdR
Outra proposta do PSD aprovada: os contratos de venda e o CCA, “não obstante terem introduzido um mecanismo de travão às chamadas de capital, mais não fizeram do que diluir no tempo a utilização a prestações do limite máximo de capital disponível”. E criaram os “incentivos a um modelo de gestão que otimizasse o recurso a essa verba, em prejuízo do Fundo de Resolução e dos seus participantes e, por decorrência, dos contribuintes portugueses“.
Segundo o PSD – proposta aprovada por todos, à exceção do PS –, “houve uma evidente incapacidade do Governo para impor junto da Comissão Europeia a presença do Fundo de Resolução no Conselho de Administração do Novo Banco, algo que já estava negociado com a Lone Star”.
Mais críticas aos prémios no Novo Banco
A gestão do Novo Banco já tinha duras críticas na versão preliminar, que saem agora ainda mais reforçadas, nomeadamente em relação à política de atribuição de prémios aos administradores.
“Os prémios de gestão ocorrem quanto maior for a maximização dos prejuízos ou das chamadas de capital“, sendo que esta situação “não foi devidamente acautelada no contrato” de venda do Novo Banco à Lone Star, dizia a proposta dos social-democratas que foi aprovada, apesar do voto contra do PS e da abstenção da Iniciativa Liberal.
O PS viu aprovada a sua proposta de que “a atribuição de remuneração variável não se afigura compatível com a apresentação de prejuízos”.
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