Navigator admite cortar investimento em Portugal por causa dos preços da energia
A subida dos preços da eletricidade já está a fazer a produtora de papel perder terreno para as concorrentes europeias, retirando também “espaço para investir e crescer” em Portugal.
É com “enorme apreensão e preocupação” que a The Navigator Company olha para a escalada de preços no mercado grossista ibérico (Mibel), com a empresa liderada por António Redondo a admitir ao ECO que esta subida dos custos da energia vai afetar o crescimento do negócio e também reduzir o volume de investimento em Portugal.
“Sentimos desde já um aumento de custos que naturalmente se traduzirá em menor competitividade da nossa proposta de valor no mercado internacional. Temos menos espaço para investir e crescer, não só porque estamos a aplicar os nossos fundos nestes sobrecustos, como os eventuais investimentos em Portugal ficam menos atrativos”, reconhece fonte oficial da Navigator.
Mais: lembra o grupo sediado em Setúbal que a subida dos preços de energia elétrica no Mibel tem na sua origem uma escalada muito expressiva dos preços de gás natural, que, enquanto combustível necessário à atividade industrial, “tem também um impacto fortíssimo na estrutura de custos” da papeleira.
E além de já estar a “perder competitividade de forma muito relevante” face à concorrência global — foi a terceira maior exportadora portuguesa em 2020, com vendas para mais de 130 países –, a mesma fonte avisa que “inevitavelmente terá também um impacto significativo na inflação ao consumidor, que perderá poder de compra e reduzirá o consumo”. Este mês, a antigo Portucel aumentou os preços do papel na Europa em até 6%.
"Temos menos espaço para investir e crescer, não só porque estamos a aplicar os nossos fundos nestes sobrecustos, como os eventuais investimentos em Portugal ficam menos atrativos.”
Face aos recordes registados em agosto e em setembro, o governo português tem vindo a anunciar que vai implementar algumas medidas para mitigar parcialmente este problema junto das grandes empresas industriais, como a criação de um estatuto de consumidor eletrointensivo, a promoção do autoconsumo renovável à distância ou a compensação via Fundo Ambiental pelo aumento dos custos do CO2.
No entanto, as empresas continuam sem conhecer os detalhes e os prazos de implementação destas propostas, embora a Navigator considere que “o mais provável é que as medidas do governo mitiguem apenas uma parte pequena do elevado impacto negativo já ocorrido”. Enquanto isso, contrapõe, “a subida de preços da eletricidade e do gás é certa e segura, e já tem vindo a acontecer desde há algum tempo, sendo que as perspetivas de curto prazo não apontam para a resolução desta situação em mercado”.
Compensação tardia e interruptibilidade precoce
Esta quarta-feira, o Executivo socialista anunciou o mecanismo de compensação dos custos indiretos de CELE (Comércio Europeu de Licenças de Emissão), que prevê um total de 25 milhões de euros em apoios à indústria eletrointensiva, que vão beneficiar um universo estimado de 28 instalações. Ora, uma das empresas englobadas é precisamente a Navigator, que diz ser “uma medida na direção certa, ainda que peque por tardia”.
“Na verdade, não sabemos ainda como será aplicada, nem os montantes líquidos a alocar por empresa, aspeto que só será conhecido com a portaria. Além do mais, o montante referido representa uma parte muito pequena daquilo que o Estado/Fundo Ambiental arrecada, especialmente num contexto de elevados preços do CO2. Outros países europeus, por exemplo, Espanha, França e Reino Unido, têm sido mais generosos na proteção das grandes indústrias nacionais e, portanto, da competitividade e do emprego desses países”, resume a Navigator.
Estes países “não só já operacionalizaram este mecanismo há mais tempo, como têm devolvido às empresas uma parte maior daquilo que coletam através da venda de licenças de CO2 de forma a minimizar o impacto do CO2 no preço da energia elétrica”, detalha a papeleira, dando o exemplo de Espanha que alocou a este mecanismo mais de 170 milhões de euros em 2019. “É claramente uma medida que já deveria ter sido implementada para assegurar igualdade de condições com os nossos concorrentes europeus”, acrescenta.
Entre as “almofadas” que o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, elencou recentemente para inibir uma subida dos preços da luz, está o fim do serviço de interruptibilidade, a 31 de outubro, que irá fazer aumentar de forma expressiva os custos das grandes empresas industriais, que prestam atualmente este serviço ao sistema elétrico nacional.
Mesmo sendo contra a eliminação deste serviço, a Navigator sustenta que, mesmo sendo feito por imposição da Comissão Europeia, deveria sê-lo “apenas e quando todas as medidas compensatórias e mitigadoras estivessem implementadas, o que não aparenta ser o caso”. Retirar competitividade às grandes empresas nacionais neste momento em que iniciam a recuperação, após um período “fortemente recessivo” como foi o ano anterior, é “colocar em risco a recuperação económica, a industrialização do país e o emprego”.
Esta manhã, o secretário de Estado João Galamba reforçou perante os deputados o compromisso, já assumido pelo ministro Matos Fernandes, de “conter os preços da eletricidade no próximo ano”. Para tal, prometeu que o Governo vai apresentar até 15 de outubro – ou mesmo antes da data em que a ERSE apresenta a sua proposta tarifária para 2022 – propostas para impedir uma subida significativa das faturas da luz dos portugueses.
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