Combustíveis vão subir ainda mais com fim do desconto no ISP este mês
Os combustíveis já subiram 4,5 cêntimos em janeiro e vão ficar ainda mais caros. No final deste mês termina a baixa temporária do imposto sobre os combustíveis (ISP), até dois cêntimos por litro.
Mais uma segunda-feira, mais um aumento dos preços dos combustíveis nas bombas de gasolina: a partir de hoje, 17 de janeiro, a gasolina deverá ficar um cêntimo mais cara por cada litro abastecido, e o gasóleo dois cêntimos mais caro. Há três semanas seguidas que é assim, desde o início de 2022. Há mesmo quem reporte subidas nos preços combustíveis na ordem dos seis e sete cêntimos por litro desde o início de janeiro, o que já levou a protestos e buzinões na Ponte 25 de Abril.
De acordo com os números oficiais da Entidade Nacional para o Setor Energético (ENSE), a verdade é que só na primeira metade deste mês a gasolina está já 4,3 cêntimos por litro mais cara e o gasóleo 4,5 cêntimos.
Uma subida que se vai agravar já no final do mês, quando terminar a baixa temporária do imposto sobre os combustíveis (ISP) até dois cêntimos por litro, que o Governo decretou até 31 de janeiro. Uma medida que os fiscalistas ouvidos pelo ECO consideram que deveria ser prolongada para ajudar os consumidores e a economia.
Os dados da ENSE mostram que a 31 de dezembro a gasolina custava 1,718 euros por litro e o gasóleo 1,575 euros por litro. A meio do mês de janeiro, a ENSE já mostrava preços de venda ao público de 1,761 euros por litro na gasolina e 1,62 euros por litro no gasóleo (dados de 14/01). Tendo em conta que a capacidade do depósito de combustível de um carro médio por norma não excede os 50 litros, são 88,05 euros para atestar o carro com gasolina e 81 euros no caso do gasóleo.
Ao ECO/Capital Verde, António Comprido, secretário-geral da Associação Portuguesa De Empresas Petrolíferas (APETRO), lembra que apesar da redução de até dois cêntimos por litro no ISP terminar no fim do mês, existem ainda outras “medidas paliativas, sem as quais os combustíveis estariam hoje não 4,5 mais caros mas dez cêntimos, ou mais, ainda mais caros”, frisou.
Em outubro o Governo decidiu reinstituir um modelo de devolução de receita de imposto que obtém por via do preço dos combustíveis. Assim, os 63 milhões de euros adicionais em IVA que o Estado arrecada tendo em conta os valores atuais da gasolina e do gasóleo, foram sendo devolvidos através de uma redução de dois cêntimos no ISP da gasolina e de um cêntimo no gasóleo.
O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, precisou que na realidade, nem eram 63 milhões, mas sim 90. “Estes 63 milhões de euros são, na realidade, 90 milhões de euros anuais, na medida em que a repercussão da receita adicional que nos faríamos com os combustíveis, faria com que a taxa unitária do ISP [Imposto sobre Produtos Petrolíferos] do gasóleo apenas fosse aliviada em menos de um cêntimo, e nós arredondámos para o cêntimo”, explicou aos jornalistas António Mendonça Mendes, numa conferência de imprensa a 15 de outubro, um dia antes de a medida entrar em vigor. Mas a sua vigência termina a 31 de janeiro de 2022.
O objetivo do Executivo era, quando acabasse esta medida transitória, entraria em vigor o novo ISP, atualizado em 1%, como constava da proposta de Orçamento do Estado para 2022. O próprio ministro do Ambiente e da Ação Climática, Matos Fernandes, já tinha admitido em entrevista ao ECO que após 31 de janeiro “o mais normal é que o valor do ISP venha a ser aquele que era antes dessa decisão”, ou seja: 52,6 cêntimos por litro na gasolina e 51,3 cêntimos no diesel, valores estes atualizados em 1%.
Mas o Parlamento chumbou o OE2022 e Marcelo Rebelo de Sousa dissolveu a Assembleia da República. Agora está nas mãos do Governo prolongar ou não a portaria. O ECO questionou o Executivo sobre a opção a tomar, mas até à publicação deste artigo não obteve resposta.
Já os fiscalistas ouvidos pelo ECO entendem que esse seria um passo positivo.
Para o fiscalista João Espanha faria todo o sentido que o fizesse porque tendo em conta a realização de eleições a 30 de janeiro ainda vai levar alguns meses até que entre em vigor um novo Orçamento do Estado. “Tendo em conta que o volume de impostos que incide sobre os combustíveis é claramente excessivo, todas as medidas que possam ajudar a baixar a carga fiscal são positivas”, sublinha ao ECO. “É também uma forma de baixar a inflação diretamente através de uma redução dos preços dos combustíveis e indiretamente ao atrasar a chegada da inflação às prateleiras do supermercado, porque o preço dos combustível é incorporado no preço de todos os produtos”, acrescenta o fiscalista. No entanto, João Espanha questiona que se possa “consignar receita de um imposto através de uma portaria”.
O antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sérgio Vasques, recorda que para alterar a fiscalidade sobre os combustíveis não é preciso estar dependente do Parlamento, porque “basta manipular as taxas do ISP”, algo que é “perfeitamente possível de fazer através de portaria”, tal como está previsto no n.º 1 do artigo 92.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo.
“Nenhum consumidor vai dizer que não a uma descida dos impostos, tendo em conta que sobre os combustíveis pesa uma carga fiscal em torno de 60%“, sublinha Amílcar Nunes. O fiscalista recorda o mecanismo que vigorou até 2016 que permitia ajustar o valor do ISP em função da evolução dos preços do brent, um ajustamento que estava dependente de revisões trimestrais. Mas a medida acabou por ser tacitamente revogada com a introdução do gasóleo profissional. Para Amílcar Nunes este era uma medida que poderia ser ressuscitada.
Ana Sofia Patrícia também considera que faz sentido prolongar a vigência da portaria que “usa a folga da receita do IVA para reduzir o ISP” porque “os atuais valores de referência dos combustíveis e de venda ao público estão muito próximos dos que motivaram a decisão a 15 de outubro”. A fiscalista admite que “muitas vezes a baixa do ISP foi impercetível aos consumidores”, porque a subida dos preços acabou por anular o efeito da medida, mas com “os dados atuais faz sentido prorrogar a medida”.
Mas o Governo aprovou outras medidas para ajudar a travar a escalada dos preços dos combustíveis como o congelamento do aumento da taxa de carbono até 31 de março (travando assim um aumento estimado de cinco cêntimos nos preços). Mantém-se assim em vigor, por mais três meses, a taxa aplicada ao longo de todo o ano de 2021, de 23,921 euros por tonelada de carbono.
Por outro lado existe ainda o AutoVoucher, um “subsídio dado a todos os portugueses que, entre os meses de novembro de 2021 e março de 2022, façam compras num dos 3.800 postos de gasolina do território continental”, explicou o Governo. O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, explicou na altura que este subsídio consiste no valor equivalente a 10 cêntimos por litro até aos 50 litros de combustível por mês.
O Governo tomou esta decisão depois de muita pressão das empresas de transportes de mercadorias, e outros setores económicos. Entre janeiro e outubro de 2021 a gasolina subiu cerca de 30 cêntimos e o gasóleo aumentou 25 cêntimos por litro, muito por conta dos preços do petróleo que voltaram a subir para a marca dos 85 dólares por barril, o valor mais alto desde 2018.
Agora, o cenário repete-se. De acordo com a Reuters, o preço do barril de Brent tem vindo a subir paulatinamente desde 31 de janeiro de 2021, desde os 77,78 dólares até aos 86,06 dólares esta passada sexta-feira, 14 de janeiro de 2022. O aumento é de quase 10 euros em duas semanas.
Esta é a explicação que António Comprido apresenta também para a subida dos combustíveis em Portugal neste início de 2022, rejeitando qualquer aumento por via das margens brutas das petrolíferas, como aconteceu no ano passado.
“Nos boletins da ERSE não diz em lado nenhum que as margens aumentaram. A lei-travão que o Governo criou já foi publicada e está em vigor, mas para ser acionada tem de partir de uma proposta da ERSE, e o regulador ainda não propôs nada”, rematou o secretário-geral da Apetro.
A legislação aprovada no Parlamento, a 8 de outubro, alterou “o regime jurídico vigente no sentido de habilitar o Governo a intervir com a fixação de margens máximas em todas as componentes das cadeias de valor de gasolina e gasóleo simples e de GPL engarrafado”. Como explicou o ministro do Ambiente em julho, após a aprovação da proposta de lei do Governo em Conselho de Ministros, o objetivo era permitir ao Executivo limitar as margens na comercialização de combustíveis por portaria, caso considerasse que estão demasiado altas “sem justificação”. Mas este é um instrumento a que o Governo ainda não recorreu.
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