Caso BES: Relação de Lisboa recusa separação do processo a arguidos suíços
O Tribunal da Relação de Lisboa rejeitou o recurso dos arguidos suíços Etienne Cadosh, Michel Creton e Eurofin, para que o procedimento criminal contra si fosse separado e enviado para a Suíça.
O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) rejeitou o recurso dos arguidos suíços do caso BES, Etienne Cadosh, Michel Creton e Eurofin, para que o procedimento criminal contra si fosse separado e enviado para os tribunais helvéticos.
Segundo o acórdão daquele tribunal, a que a Lusa teve acesso, os juízes desembargadores da 9.ª Secção Criminal decidiram rejeitar o recurso, mantendo a anterior decisão do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) de recusar a delegação de competência na Justiça suíça do procedimento criminal contra aqueles dois arguidos singulares e a empresa Eurofin Investiments, que é uma sociedade comercial de direito suíço.
Em causa estava um despacho proferido pelo TCIC, que em 15 de fevereiro de 2022 recusou a pretensão dos arguidos de enviar o processo contra si para a Suíça. Os três arguidos alegavam estarem preenchidos os requisitos para que os autos fossem delegados nas autoridades judiciárias suíças, invocando ainda que o despacho do TCIC violava a lei e a Constituição portuguesas, pelo que decisão do TCIC devia ser revogada.
Segundo os recorrentes, a delegação do processo nas autoridades suíças “mostra-se justificada, tanto pela boa e eficaz administração da justiça, quanto pela circunstância de ser na Suíça que os arguidos poderão vir a cumprir eventuais penas decorrentes destes autos, pelo que só as entidades suíças se mostram posicionadas para avaliar o contexto da ressocialização visado pelas penas”.
O recurso argumentava ainda, entre outros pontos, que os arguidos têm nacionalidade suíça, “residem e sempre residiram na Suíça, são francófonos, não falam, não percebem (o arguido Michel Creton) ou não dominam (o arguido Alexandre Cadosh) a língua portuguesa”, pelo que seriam “prejudicados na sua defesa”, além de que os atos a praticar estariam “sujeitos a sucessivos e inevitáveis atrasos, com prejuízo para os demais arguidos e para a administração da justiça”.
Alegavam ainda os recorrentes que o processo BES já dura há oito anos, tratando-se de “uma investigação longa, que teve por objeto a eventual prática, pelo Grupo Espírito Santo (GES), através de entidades financeiras não sujeitas a supervisão do Banco de Portugal, de infrações económico-financeiras, cometidas de forma organizada e com dimensão internacional ou transnacional.
“O processo conta com 25 arguidos e tem como objeto factos indiciadores da prática, no total, de 346 crimes, pelo que, manifestamente, trata-se de um processo que demorará muitos anos a ser concluído. Aliás, avaliado o percurso que o processo teve até à dedução da acusação, não se prevê que o processo ganhe outra velocidade nas fases de instrução e julgamento”, referia ainda o recurso de Etienne Cadosh, Michel Creton e Eurofin.
Os arguidos sublinhavam que “foram precisos mais de 8 meses” para receberem a notificação da acusação, devidamente traduzida na sua língua materna.
O Ministério Público (MP) opôs-se à pretensão do recurso, contestando os seus fundamentos e sublinhando que aos arguidos suíços, enquanto intervenientes processuais nos autos, “também compete zelar pela celeridade almejada” da justiça portuguesa.
Lembrou ainda que, quanto ao direito a uma decisão num prazo razoável e mediante um processo equitativo, conforme reclamado pelos arguidos suíços, este “assiste em igual modo e proporção aos arguidos residentes em território nacional”.
Também a assistente no processo Banco Espírito Santo SA (em liquidação) opôs-se à pretensão dos arguidos suíços, contraponto, por exemplo, que, embora estes aleguem com a questão da língua, o facto de terem requerido a abertura de instrução “significa não só que compreenderam o que lhes é imputado, tendo exercido a sua defesa”.
Na decisão agora proferida, o TRL realça que o processo está “na fase instrutória (…) com vista à submissão ou não dos arguidos a julgamento”, pelo que a transferência para a Suíça “goraria o sucesso” das diligências e “inviabilizaria a produção de prova em fase de julgamento (…) vislumbrando-se o sério risco de uma duplicação de produção de prova”.
Desta forma, o TRL entendeu, na linha de outras decisões já proferidas, que é manifesto o interesse na apreciação conjunta da responsabilidade dos diferentes suspeitos e arguidos, por forma a apurar o grau de participação de cada um, minimizando “o risco de, pela separação do procedimento penal, cada um daqueles sujeitos ou todos eles aligeirarem ou mesmo escamotearem a sua participação e responsabilidade jurídico-penal no evento em causa, frustrando ou perigando a pretensão punitiva do Estado português”.
Em conclusão, o TRL sufraga na íntegra o despacho do TCIC e mantém a decisão alvo de recurso dos arguidos suíços.
O caso BES/GES, considerado um dos maiores processos da história da justiça portuguesa, agrega no processo principal mais de 240 inquéritos, que foram sendo apensados, e queixas de mais de 300 pessoas, singulares e coletivas, residentes em Portugal e no estrangeiro. Segundo o Ministério Público (MP), cuja acusação contabilizou cerca de quatro mil páginas, a derrocada do Grupo Espírito Santo (GES), em 2014, terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.
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