Da TAP ao aeroporto e aos negócios familiares. As polémicas que envolveram Pedro Nuno Santos
Da TAP, ao novo aeroporto, passando pelo "Familygate". Sete anos depois de ter entrado para o Governo, e várias polémicas depois, Pedro Nuno Santos está de saída.
Sete anos depois de ter entrado para o Governo, e várias polémicas depois, Pedro Nuno Santos está de saída, e pelo seu pé. O típico ministro do “povo”, palavra que não se cansa de repetir nas intervenções que faz, apontado como um forte sucessor de António Costa, como o próprio primeiro-ministro já tinha admitido, deixa o Executivo na sequência de mais uma polémica e, mais uma vez, a envolver a TAP.
Entrou para o Parlamento em 2005, com a primeira maioria absoluta do PS, altura em que este partido era liderado por José Sócrates. Em 2014, esteve ao lado de António Costa nas eleições primárias socialistas. A entrada para o Governo aconteceu em novembro de 2015, altura em que assumiu as funções de secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Ficou por lá durante cerca de três meses e, em fevereiro de 2019, foi nomeado ministro das Infraestruturas e da Habitação, substituindo Pedro Marques.
Nestes sete anos, muitas foram as polémicas que envolveram Pedro Nuno Santos, apontado como um forte sucessor de António Costa, como o próprio primeiro-ministro já admitiu. Da TAP ao novo aeroporto de Lisboa, passando pelos comboios vindos de Espanha e pelos negócios do pai com o Estado, Pedro Nuno Santos está de saída do Governo, na sequência de mais um caso. Salvou a TAP, mas não se salvou da TAP.
O polémico discurso dos “bancos alemães”
As polémicas na vida política de Pedro Nuno Santos começaram cedo. Em 2012, demitiu-se da vice-presidência do Grupo Parlamentar do PS, um ano após ser eleito, depois de ter proferido um discurso polémico em Castelo de Paiva, durante uma festa de Natal com militantes socialistas locais, em que contestou de forma considerada radical a forma como Portugal estava a cumprir o programa de assistência financeira da troika.
“Estou-me marimbando para os bancos alemães que nos emprestaram dinheiro nas condições em que nos emprestaram, estou-me marimbando que nos chamem irresponsáveis. Nós temos uma bomba atómica que podemos usar na cara dos alemães e dos franceses. Ou os senhores se põem finos ou nós não pagamos a dívida”, disse Pedro Nuno Santos, nesse discurso.
“Familygate” a envolver o pai e a esposa
Em 2019, foi arrastado para o Familygate, uma investigação sobre relações familiares dentro do Governo ou em organismos de nomeação governamental. De acordo com o Observador, o pai de Pedro Nuno Santos e um sócio terão feito negócios com o Estado num valor de 1,16 milhões de euros, sendo que metade deste montante dizia respeito a contratos públicos assinados já com Pedro Nuno Santos no PS.
E houve ainda a nomeação da mulher, Ana Catarina Gamboa, como chefe de gabinete do secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, seu sucessor. Pedro Nuno Santos sentiu que tinha o “dever” de explicar esta situação e, numa publicação no Facebook, descreveu a esposa como uma “excelente profissional, pessoa de enorme competência e confiança”, dizendo ser “obrigação dos políticos” garantir que “os cargos de poder político não são usados para que alguns se sirvam a si e às suas famílias”.
As carruagens com amianto compradas a Espanha
Em setembro de 2020, a imprensa espanhola noticiou que Portugal comprou à espanhola Renfe 36 carruagens para a linha ferroviária do Minho, entre o Porto e Valença. Mas essas carruagens tinham sido retiradas de circulação no país vizinho por conterem amianto.
Pedro Nuno Santos explicou que o Governo tinha conhecimento que estas carruagens estavam contaminadas, mas que era de fácil remoção, considerando essa compra um “excelente negócio”. “Não é só a CP que sabia, nós [Governo] sabíamos. A Renfe não escondeu nada de ninguém. A remoção do amianto é um procedimento técnico muito fácil”, disse o ministro.
O “ataque” a João Leão devido à dívida da CP
Saltamos para 2021 e, desta vez, a história envolve a CP — mais concretamente a dívida histórica de 2,1 mil milhões de euros — e o ex-ministro das Finanças João Leão (entretanto substituído por Fernando Medina). Depois da demissão antecipada do presidente da CP, Pedro Nuno Santos atirou contra o Ministério de João Leão.
“Se dependesse de mim, o problema [da dívida] estava resolvido. Tínhamos um plano de atividades e orçamento aprovado em tempo, a empresa não esperava meses para conseguir autorização para fazer as compras que são fundamentais (…), não tínhamos uma dívida histórica (…) durante tanto tempo sem a resolver”, disse, referindo-se ao Ministério das Finanças.
A defesa da TAP perante os ataques da Ryanair
De fora não podia ficar a TAP, sobretudo quando se começou a falar da ajuda estatal à empresa. A começar pela Ryanair, que sempre se mostrou contra a ajuda estatal à companhia portuguesa. A empresa irlandesa nunca escondeu a sua contestação e Pedro Nuno Santos ainda respondeu algumas vezes — sem falinhas mansas, como de costume –, mas com o tempo acabou por se abster de fazer comentários.
“A Ryanair é uma empresa privada e não tem de interferir nas decisões soberanas tomadas pelo Governo português. O Governo não aceita intromissões nem lições de uma companhia aérea estrangeira que responde apenas perante os seus acionistas”, disse o ministro, em maio de 2021, acusando a Ryanair de se “aproveitar de uma situação difícil”.
O processo contra o acionista privado da Groundforce
No início de 2021, foi tornada pública uma gravação de uma conversa entre Pedro Nuno Santos e Alfredo Casimiro. Na conversa, ouve-se Casimiro questionar o ministro sobre a injeção de dinheiro público na TAP e se Humberto Pedrosa, na altura acionista privado da TAP, estava também a colocar capital na mesma proporção.
Pedro Nuno Santos responde que não e explica que o Governo estava a negociar ainda com Bruxelas, mas que no quadro da reestruturação da TAP deveria ser exigido que parte ou a totalidade do empréstimo de 1,2 mil milhões fosse convertido em capital. O ministro acabou por avançar com uma ação em tribunal contra Alfredo Casimiro.
O convite (retirado) a Miguel Frasquilho
Ainda o assunto TAP, no verão de 2021, mais uma polémica. Pedro Nuno Santos nomeou Miguel Frasquilho para a presidência do Conselho de Administração da companhia aérea, mas acabou por retirar o convite (mesmo depois de Frasquilho o ter aceite). Isto porque, na altura, António Costa decidiu mudar totalmente o Conselho de Administração da TAP, afastando, assim, Miguel Frasquilho.
A decisão para o novo aeroporto… cancelada por Costa
Saltamos para 2022. Em junho deste ano, o Ministério das Infraestruturas anunciou uma nova solução para o reforço da capacidade aeroportuária na região de Lisboa, prevendo a construção de um aeroporto na atual Base Áerea n.º 6 do Montijo até 2026 e outro no Campo de Tiro de Alcochete, para entrar em funcionamento em 2035, que substituiria o Humberto Delgado. Foi mesmo publicado um diploma em Diário da República.
Mas António Costa acabou por revogar esse diploma. “O primeiro-ministro reafirma que a solução tem de ser negociada e consensualizada com a oposição, em particular com o principal partido da oposição e, em circunstância alguma, sem a devida informação prévia ao senhor Presidente da República”, lê-se no comunicado enviado pelo Gabinete de António Costa.
Muitos esperavam que Pedro Nuno Santos se demitisse após ser desautorizado por António Costa, mas isso não aconteceu. O ministro assumiu “a inteira responsabilidade” pelos “erros de articulação e comunicação” no processo com o Governo, pedindo desculpa, mas afirmando que esta “falha” não “manchava” a sua relação com António Costa.
Os negócios da empresa do pai com o Estado
Em outubro deste ano, o Observador noticiou que uma empresa detida por Pedro Nuno Santos e pelo pai tinha feito um contrato público por ajuste direto. O pai de Pedro Nuno, dono de 44% da Tecmacal, assinou um contrato com o Centro de Formação Profissional da Indústria de Calçado no valor de 19.110 euros, num ajuste direto para a compra de equipamentos no setor da marroquinaria.
Na altura, escreveu-se que Pedro Nuno Santos detinha uma participação de 0,5% mas que, em conjunto com o pai, dava mais de 10% da empresa, o que levava a que esta ficasse impedida de fazer contratação pública ao abrigo do novo regime. Mas o ministro, através do seu gabinete, respondeu não haver incompatibilidades devido a um parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR).
A indemnização de 500 mil euros dada a Alexandra Reis
A polémica mais recente a envolver Pedro Nuno Santos, e que acabou por ditar a sua demissão, diz (mais uma vez) respeito à TAP. O ministro apresentou esta madrugada de quinta-feira a sua demissão, “face à perceção pública e ao sentimento coletivo gerados em torno” do caso TAP e da indemnização de 500 mil euros paga a Alexandra Reis.
De acordo com Pedro Nuno Santos, a presidente executiva da TAP pediu autorização ao secretário de Estado das Infraestruturas para substituir Alexandra Reis e obteve o aval para esse decisão e, posteriormente, para os termos do acordo. O secretário de Estado das Infraestruturas pediu demissão e o ministro entendeu que devia fazer o mesmo, mesmo afirmando que “só agora” teve conhecimento dos termos do acordo entre a TAP e então administradora.
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