AEP propõe caminho com cinco reformas para a economia portuguesa

Estudo apresentado na AEP defende aumento da produtividade, aposta no investimento, garantia de sustentabilidade da Segurança Social e novo modelo de captação de investimento estrangeiro.

50 medidas necessárias para a reforma de cinco áreas da economia portuguesa. Os economistas Carlos Tavares e Sara Oliveira Monteiro defendem uma nova agenda para que Portugal volte a convergir com a União Europeia e possa acelerar o seu crescimento. As medidas fazem parte de um estudo apresentado nesta segunda-feira no auditório da Associação Empresarial de Portugal (AEP), em Leça da Palmeira.

“Em 1975, os portugueses tinham um rendimento per capita que era de 70% face à União Europeia. Convergimos até ao final do milénio mas depois voltámos a afastar-nos. Por causa disso, em 2021, estávamos em 75% do rendimento médio da UE”, sinalizou o também ex-ministro da Economia durante a apresentação.

Carlos Tavares também chamou a atenção para a existência de “uma série de incentivos para que as empresas” se mantenham pequenas. Exemplo disso é a taxa de IRC, que é “crescente com os resultados das empresas através da aplicação da derrama estadual”, podendo “atingir os 31% no caso de empresas maiores e/ou mais bem-sucedidas”. Para o economista, isto “constitui um desincentivo efetivo aos ganhos de dimensão”.

O co-autor do estudo também é favorável a uma maior aposta em empresas de produção de bens transacionáveis, pois “representar apenas 25% do valor acrescentado bruto é muito pouco para a economia nacional”. Carlos Tavares sustenta mesmo que “é preferível capitalizar as empresas do que recapitalizar os bancos”

As cinco reformas apontadas são relacionadas com a produtividade das empresas, o fomento do investimento e da poupança a longo prazo, a sustentabilidade da Segurança Social e das finanças públicas e ainda uma política de captação do investimento estrangeiro. A apresentação do estudo marca o início de um ciclo de debates da AEP do Fórum de Produtividade & Inovação.

Aumentar a produtividade, o crescimento económico e a riqueza

Neste domínio, as intervenções devem ser feitas ao nível micro e macro económico e também na área fiscal.

  • reforço da concorrência no mercado doméstico, incluindo o combate à economia informal;
  • eliminação/simplificação de normas regulamentares de mercados e produtos;
  • eficácia e eficiência dos serviços públicos dirigidos às atividades económicas, eliminação de serviços e procedimentos desnecessários e estabelecimento rigoroso de níveis de serviço em processos de autorização/licenciamento, com princípio do deferimento tácito;
  • celeridade da justiça económica e combate eficaz à corrupção;
  • melhoria e incentivo do ensino profissional e reforma da Educação, através da revisão das carreiras docentes, das métricas de avaliação de desempenho e da descentralização das competências;
  • criação de programas de formação avançada para empresários, gestores e quadros ligados a PME;
  • criação de um programa de incentivos à concentração e à associação interempresas, com particular incidência nos objetivos de reforço do poder de mercado no comércio internacional e de criação/promoção de marcas;
  • renovação do modelo de procura e captação de investimento direto estrangeiro através de Agência dedicada em exclusividade, dotada de meios humanos e materiais adequados a uma procura extensiva e seletiva de IDE dirigido especialmente aos sectores transacionáveis;
  • reforço do requisito de capital para novas operações de crédito ao consumo;
  • reforço da penalização prudencial dos financiamentos imobiliários com fins especulativos;
  • reformulação do sistema de ponderação, para fins de requisitos de capital dos bancos, passando a variar em função do nível de alavancagem das empresas em lugar da sua dimensão;
  • consideração como custo fiscal do custo nocional do capital próprio;
  • eliminação da dedução fiscal dos juros da dívida a partir de um nível de alavancagem que não permita uma autonomia financeira mínima;
  • eliminação da dupla tributação económica dos dividendos;
  • eliminação da derrama “estadual” de IRC;
  • simplificação do IRC, fazendo coincidir as realidades tributáveis económica e fiscal e defesa a nível europeu da harmonização da base de tributação em IRC;
  • eliminação de benefícios fiscais, retorno à filosofia original do Estatuto dos Benefícios Fiscais, com um processo de revisão que garanta a sua estabilidade, proibindo a sua alteração através da Lei do Orçamento;
  • redução da taxa de IRC, acompanhada de redução dos benefícios fiscais;
  • revisão dos benefícios fiscais à inovação, nomeadamente algumas transposições europeias que permanecem sem aplicabilidade no território nacional como o “patent box”

Fomentar o investimento e a poupança de longo prazo

A revisão dos escalões do IRS e a simplificação dos mecanismos de incentivo ao investimento são as principais medidas propostas nesta área.

  • redução, simplificação/concentração dos sistemas e mecanismos de incentivo ao investimento;
  • recriação da Reserva Fiscal para Investimento ou de mecanismo similar;
  • possibilidade de dedução ao rendimento coletável em IRS das
  • contribuições facultativas para fundos de pensões até 50% do rendimento;
  • alargamento da disponibilidade de produtos de poupança do Tesouro que permitam a defesa contra a inflação;
  • revisão dos escalões do IRS de modo a garantir a redução da carga fiscal sobre a classe média, aproximando os escalões em causa dos padrões europeus com correção pela
    Paridade dos Poderes de Compra; tributação de todas as pessoas que aufiram rendimento, assegurando-se a neutralidade fiscal, em termos líquidos, dos
    rendimentos que atualmente não são tributados; discriminação positiva da taxa de IRS para pessoas residentes em zonas bem definidas do interior;
  • comparticipação do Banco de Fomento em instrumentos de capital e quase capital resultantes de planos de recapitalização/reestruturação de PME apresentados por instituição financeira regulada;
  • reintrodução de mecanismo de efetividade do artº 35º do Código das Sociedades Comerciais, com a criação de um sistema de recuperação de créditos do Estado, da Segurança Social e de entidades públicas sobre as empresas, com filosofia empresarial, de forma a, também por esta via, contribuir para o saneamento do tecido empresarial e para a eliminação de situações de distorção de concorrência
  • programa de garantias parciais aos títulos de sociedades de investimento mobiliário para fomento do mercado (SIMFE) que invistam em produtos de capitais permanentes de PME;
  • comparticipação nas despesas suportadas por PME no acesso (direto ou indireto) ao mercado de capitais

Garantir a sustentabilidade da Segurança Social

Em complemento com o sistema de capitalização atual da Segurança Social, os dois economistas defendem a aposta em fundos de pensões por empresas ou mesmo a título individual.

  • fomento da constituição de fundos de pensões complementares por empresas e/ou pelas pessoas individuais;
  • introdução gradual de uma componente de capitalização, garantindo um valor mínimo para as pensões através da componente distributiva;
  • inclusão em programa(s) comunitário(s) do mecanismo de transição referido no ponto anterior, permitindo o financiamento dos encargos temporários resultantes dessa transição.

Assegurar a saúde e a sustentabilidade das finanças públicas

A reforma da Administração Pública e o princípio de não resgate das empresas públicas são as principais medidas defendidas nesta área.

  • reforma da Administração Pública, eliminando serviços e procedimentos desnecessários;
  • redefinição e digitalização dos processos da Administração Pública;
  • estabelecer objetivos plurianuais para o défice e a dívida compatíveis com taxas de juro “normais”;
  • garantir a consistência entre os valores do défice e da dívida pública e produzir a conta patrimonial do Estado;
  • estabelecer o princípio de não resgate das empresas públicas
  • garantir a avaliação ex-ante da economicidade da despesa pública através de entidade independente

Reforma do sistema nacional de inovação e novo modelo de captação de investimento estrangeiro

As propostas mais densas para a economia estão concentradas na área de captação de investimento. Pretende-se promover uma maior ligação entre empresas e universidades, além de eliminar barreiras à entrada de empresas estrangeiras que queiram produzir bens transacionáveis.

  • criação de Programa Estratégico Nacional de apoio à cooperação, à aceleração (internacionalização) e à difusão de inovação interempresas e sectoriais, dinamizado por associações empresariais e centros de interface (aqui incluídas as incubadoras, os centros tecnológicos, as aceleradoras, parques tecnológicos) nas áreas de aposta estratégica do país, com projetos orientados para missões e objetivos concretos, com métricas e KPI claros de impacto a médio/longo prazo na economia portuguesas e com definição de metodologia generalizável de avaliação e comunicação desse impacto;
  • programa de apoio à cocriação entre empresas, universidades, serviços da administração pública e organismos da sociedade civil, através de iniciativas diversas, visando a antecipação do futuro, maior literacia tecnológica permitindo o codesenvolvimento, a difusão e a absorção de novos processos de inovação empresarial, social e ambiental e sobretudo conferindo maiores capacidades dinâmicas aos diversos actores de inovação para os ajustamentos rápidos que possam ser necessários;
  • programa de apoio à aquisição e licenciamento de patentes no âmbito da nova legislação europeia da patente única; formação de EPO e apoio à criação de uma rede nacional público-privada de apoio aos investigadores, às empresas e indústria neste domínio com especialistas em tech scouting e que produzam radares tecnológicos e montras de comercialização de tecnologias;
  • Apoio ao estabelecimento de corredores de parcerias comerciais e científicas e de “joint-ventures” ou outros empreendimentos comuns entre centros de investigação, empresas nacionais (startups e PME) e a indústria nacional e centros de investigação, empresas e indústrias internacionais inovadoras (seja no domínio da valorização do conhecimento, do scaling up industrial, ou na produção, no “design” e produção de novo conhecimento aumentando o TRL (technology readiness level) e reduzindo o TTM (time to market) do conhecimento existente ou na distribuição/comercialização;
  • programa específico de captação de IDE de empresas com capacidade de inovação reconhecida em setores de bens e serviços transacionáveis, eliminando barreiras à entrada;
  • programa Capital Humano que inclua a capacitação e formação em temas de inovação tecnológica dirigidos à quarta hélice de inovação, com programas específicos de desenvolvimento de competências digitais prototipagem e em domínios emergentes como a Bioeconomia Circular, a nanotecnologia, a biotecnologia e as tecnologias de informação e comunicação, em escolas públicas, universidades e politécnicos para o desenvolvimento de competências para o empreendedorismo, a participação cívica e a criação de valor/ impacto em Portugal;
  • programa de retenção e captação de talentos nacionais e internacionais, acessível a todas as faixas etárias, nos sectores (incluindo os emergentes) com maior contributo potencial para o desenvolvimento da economia portuguesa;
  • concentração numa entidade das competências de gestão dos programas públicos de fomento da inovação, actualmente dispersas por vários organismos (IAPMEI, ANI, AICEP), com reflexos nos tempos e consistência das decisões;
  • programa de capital de risco dirigido a PME existentes ou em formação, com projectos de inovação reconhecidos, em associação com capitais de risco de relevo internacional que possam promover interações com outras empresas participadas com âmbitos complementares;
  • concentração dos sistemas de incentivos existentes num conjunto reduzido de programas ou no programa supre mencionado, com lógica coerente e clareza de aplicação evitando a dispersão e concentrando-os em projetos orientados para missões assegurando o cumprimento das prioridades estratégicas para Portugal;
  • consolidação, sempre que possível, das entidades de associação/cooperação/transferência de conhecimento num conjunto limitado de entidades de dimensão adequada e lógica e objectivos bem definidos.

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