Audição de Salgado durou dez minutos. Alzheimer não permitiu que arguido se explicasse
"Trouxemo-lo, mas a verdade é esta: ele nem sabia bem ao que vinha", disse o advogado Francisco Proença de Carvalho. Audição foi curta porque ex-banqueiro sofre de Alzheimer.
“Trouxemo-lo, mas a verdade é esta: ele nem sabia bem ao que vinha.” As palavras são de Francisco Proença de Carvalho, advogado de defesa do ex-homem forte do BES. Nos escassos dez minutos em que esteve perante a juíza Ana Paula Rosa, Ricardo Salgado apenas fez a respetiva identificação. Respondeu às perguntas sobre o seu nome, nome dos pais, idade, profissão, mas não conseguiu lembrar-se da morada.
“O meu cliente, como sabe, está diagnosticado com a doença de Alzheimer. Em defesa da dignidade humana de Ricardo Salgado, esta defesa não vai aceitar que ele preste mais declarações. Temos de defender a dignidade dele”, disse Francisco Proença de Carvalho na sala de audiência.
Ricardo Salgado foi a tribunal para prestar declarações no âmbito do julgamento do Caso EDP, depois de mais uma perícia independente ter confirmado que o ex-líder do BES sofre mesmo de Alzheimer.
“O meu cliente não conseguiu explicar-se porque está impedido por uma doença grave. A defesa defende o óbvio”, disse Proença de Carvalho, à saída da audição que durou cerca de dez minutos. “A doença de Alzheimer, no estado em que está — segundo mais grave –, demonstra isso mesmo. O meu cliente veio cá porque foi chamado para tal. Sempre dissemos que quando a Justiça o chamasse, ele estaria. E foi isso que ele fez. Ao fim desta luta difícil de dez anos, ele foi sempre o primeiro a ir a todo o lado, quando era a pessoa que infelizmente já não é. Veio porque o trouxemos. A verdade é essa, ele nem sabia bem ao que vinha.”
E deixou um recado à Justiça: “A Justiça tem mesmo de tomar uma decisão não só em nome da defesa do Dr. Ricardo Salgado mas também em nome dos cidadãos e em nome da dignidade humana”, disse o advogado, rematando que “uma imagem vale mais que mil palavras.”
“Se os tribunais continuarem a ser indiferentes perante esta situação, o Estado português será de certeza condenado no Tribunal dos Direitos Humanos, como foram Estados como a Rússia”, explicou. “Não tenho dúvidas que mais tarde ou mais cedo, a Justiça portuguesa será digna da sua história democrática.”
Em janeiro, mais uma perícia independente confirmou que Ricardo Salgado sofre da doença. O relatório foi assinado por uma neurologista, um psiquiatra e uma consultora de psicologia do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF). “A doença de Alzheimer é causa mais provável do quadro clínico do arguido”, dizia a perícia médica de quase 50 páginas.
O regresso ocorreu dois anos e um dia depois de Ricardo Salgado ter estado presente num tribunal pela última vez, então no julgamento do processo separado da Operação Marquês, em fevereiro de 2022, quando disse não estar em condições de prestar declarações por lhe ter sido diagnosticada doença de Alzheimer. “Meritíssimo, não estou em condições de prestar declarações. Foi-me atribuída uma doença de Alzheimer”, afirmou na altura o ex-banqueiro perante o coletivo de juízes. No mês seguinte, esse mesmo coletivo acabou por condenar Salgado a seis anos de prisão por três crimes de abuso de confiança. Pena essa que seria agravada pelo Tribunal da Relação de Lisboa para oito anos de prisão.
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Audição de Salgado durou dez minutos. Alzheimer não permitiu que arguido se explicasse
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