Manifesto contra Ministério Público: PGR em silêncio e Sindicato diz que assenta em “preconceitos”
Em causa o manifesto assinado por 50 personalidades que pedem ao Governo, Presidente e Parlamento uma “verdadeira reforma da Justiça” e um escrutínio ao MP que dizem ter um "poder sem controlo".
“O manifesto assenta em preconceitos sobre a atividade do Ministério Público e juízos de valor relativos a dois processos cuja investigação se encontra pendente, um que ainda aguarda a decisão de recurso”. As palavras são de Paulo Lona, o recém-nomeado presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), em declarações ao ECO/Advocatus.
Em causa o manifesto assinado por 50 personalidades que pedem ao Governo, Presidente da República e Parlamento uma “verdadeira reforma da Justiça”, com a recondução do Ministério Público (MP) a uma estrutura hierárquica para evitar o que chamam de atual “poder sem controlo”. Contactada pelo ECO/Advocatus, a Procuradora-Geral da República não reagiu a estas críticas, mantendo-se no habitual silêncio.
“Mais uma vez, confirmando receios manifestados pelo SMMP, procura-se forçar alterações legislativas a reboque de dois processos concretos, atacando o papel legal e constitucional do MP, a sua autonomia e, por essa via, o próprio sistema de justiça, ignorando as recomendações europeias nesta matéria”, disse o magistrado, referindo-se à Operação Influencer e às suspeitas de corrupção no caso da Madeira.
“O que é importante é credibilizar as instituições num estado de direito democrático e não atacar a independência do sistema de justiça, nomeadamente através da autonomia do MP. Não existe sistema de justiça independente sem autonomia do MP. E sem um sistema de justiça independente não temos um verdadeiro estado de direito democrático. A independência da justiça e a autonomia do MP também são conquistas de Abril e da democracia”, concluiu.
Um grupo de 50 personalidades – de diversos quadrantes políticos e da sociedade civil – fez na sexta-feira um apelo para que sejam tomadas iniciativas que, respeitando a independência dos tribunais, a autonomia do Ministério Público e as garantias de defesa judicial, sejam resolvidos os “estrangulamentos e das disfunções que desde há muito minam a sua eficácia e a sua legitimação pública”.
Leonor Beleza, Rui Rio, Augusto Santos Silva, Daniel Proença de Carvalho, Teresa Pizarro Beleza, Maria de Lourdes Rodrigues, Isabel Soares, David Justino, Eduardo Ferro Rodrigues, Fernando Negrão, Vítor Constâncio, António Vitorino, José Pacheco Pereira, Maria Manuel Leitão Marques, Paulo Mota Pinto, Vital Moreira, António Barreto, João Caupers, Correia de Campos, Álvaro Beleza, António Monteiro, Diogo Feio, Mota Amaral, Sobrinho Simões, entre outros, subscreveram um manifesto que insta “o Presidente da República, a Assembleia da República e o Governo, bem como todos os partidos políticos nacionais, a tomarem as iniciativas necessárias para a concretização de uma reforma no setor da Justiça”.
O Ministério da Justiça também reagiu a esta mensagem, dizendo estar “muito preocupado” com a situação em que o Governo do PS deixou a área, destacando as greves no setor, a falta de magistrados e funcionários judiciais e as más condições dos tribunais.
No comentário enviado à Lusa, sobre o manifesto subscrito por 50 personalidades de diversos setores em defesa de um “sobressalto cívico” que acabe com a “preocupante inércia” dos agentes políticos relativamente à reforma da Justiça, o ministério de Rita Júdice aponta o dedo ao anterior executivo e diz que está a “trabalhar arduamente para procurar resolver estes problemas, desde o primeiro minuto”.
O secretário-geral do Partido Socialista (PS), Pedro Nuno Santos disse que o manifesto foi recebido de “bom grado” e defendeu que “não existe nenhuma área que esteja acima do escrutínio”.
“Recebemos de bom grado um manifesto que foi escrito por individualidades de reconhecido mérito nacional, altamente responsáveis, com uma grande experiência de vida, com diferentes quadrantes políticos”, afirmou em declarações aos jornalistas durante uma visita à Ovibeja, em Beja.
“É importante que tenhamos todos consciência que não existe nenhuma área da vida humana, nem da sociedade portuguesa, que esteja acima do escrutínio, acima da crítica”, acrescentou o socialista, lembrando que “qualquer trabalhador é avaliado” e, por isso, a “Justiça é também uma área de avaliação e escrutínio”.
O que diz o manifesto?
A “prolongada passividade” do país político levou ao “penoso limite de ver a ação do Ministério Público produzir a queda de duas maiorias parlamentares resultantes de eleições recentes, apesar de, em ambos os casos, logo na sua primeira intervenção, os tribunais não terem dado provimento e terem mesmo contrariado a narrativa do acusador”.
Os 50 subscritores consideram “inconcebível” que, mesmo tendo decorrido “longos cinco meses” entre o primeiro-ministro se ter demitido na sequência do comunicado da Procuradoria-Geral da República (PGR) e a sua cessação de funções, o Ministério Público nem sequer se tenha dignado a informá-lo sobre o objeto do inquérito, nem o tenha convocado para qualquer diligência processual, referindo-se à Operação Influencer.
“Além de consubstanciarem uma indevida interferência no poder político, estes episódios também não são conformes às exigências do Estado de Direito democrático”, afirmam os subscritores. Apesar da gravidade do sucedido, registam que não houve qualquer consequência interna na condução das investigações e dos atos processuais “por força de um funcionamento e de uma cultura de perfil corporativo que manifestamente predomina no Ministério Público”.
Desta cultura corporativa, bem como “da assumida desresponsabilização da Procuradora-Geral da República pelas investigações”, decorre que a política criminal, em vez de ser definida pelo poder político como está previsto na Constituição, é, na prática, executada por magistrados do Ministério Público “sem qualquer mandato constitucional”, os quais exercem “um poder sem controlo” externo ou interno.
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