E agora, como se resolve? A boa e a má notícia sobre a falha informática
Ironicamente, uma atualização de cibersegurança derrubou sistemas em todo o mundo e lançou a confusão. A solução requer intervenção direta em cada máquina, mas não exige conhecimentos muito avançados.
A falha informática que está a gerar caos a nível mundial esta sexta-feira teve origem numa atualização de um programa informático da CrowdStrike, usado por muitas empresas para protegerem os seus sistemas, incluindo computadores usados pelos trabalhadores, mas também servidores. O erro na atualização provocou um conflito com o sistema operativo Microsoft Windows, o mais usado em todo o mundo, deixando milhares de equipamentos inoperacionais.
Ao início da manhã desta sexta-feira começaram a surgir relatos de constrangimentos num conjunto alargado de serviços nos quatro cantos do planeta, começando pela Austrália e chegando a localizações tão distantes como EUA, Índia e Europa. As companhias aéreas estiveram entre as empresas mais afetadas, mas o problema também derrubou emissões de televisão e caixas de hipermercados. Em Portugal, a ANA, gestora dos aeroportos nacionais, não foi “diretamente” afetada, mas alertou os passageiros para possíveis constrangimentos devido a problemas em algumas das empresas que operam nas suas infraestruturas.
Segundo especialistas ouvidos pelo ECO, a CrowdStrike é uma empresa de cibersegurança norte-americana e um dos maiores fornecedores mundiais deste tipo de softwares, chamados Endpoint Detection and Response Solutions (EDR). A empresa lançou uma atualização durante a madrugada que provocou um erro fatal nos equipamentos Windows com esse programa instalado. Esse erro é vulgarmente conhecido por blue screen of death (BSOD), ou só blue screen, e pode acontecer por inúmeros motivos. Ainda está por explicar porque é que um erro na atualização da CrowdStrike interferiu de uma forma tão fundamental com todo o sistema operativo dos equipamentos afetados.
“Há uma falha num software bastante vulgarizado entre as grandes empresas, que, na interação com o Windows, causa um erro. As pessoas estão a associar o problema à Microsoft, mas só quem tem [o programa da] Crowdstrike é que tem problemas”, explica ao ECO o especialista em cibersegurança Rodrigo Adão da Fonseca. Em causa está “uma ferramenta de cibersegurança colocada nos chamados endpoints — telemóveis, tablets, servidores — e que, se está dispersa e a atualização é feita de forma automática”, gera de imediato um “problema de disponibilidade”, acrescenta.
Nem todas as empresas clientes da CrowdStrike com sistemas Windows tiveram problemas. O ECO ouviu de uma fonte bem posicionada no setor que houve empresas em Portugal que conseguiram escapar ao problema por testarem todas as atualizações fornecidas por terceiros antes de as distribuírem, de forma geral, pelos seus equipamentos.
Há uma falha num software bastante vulgarizado entre as grandes empresas, que, na interação com o Windows, causa um erro.
A boa e a má notícia
Quanto tempo vai demorar a resolver o problema? É impossível prever, pois vai depender de cada empresa, mas há uma boa e uma má notícia. A má é que não será possível reverter automaticamente o problema nas máquinas afetadas, pois os sistemas estão totalmente indisponíveis e sem acesso à internet. Ou seja, vai ser preciso intervir diretamente em cada máquina, com permissões de administração, segundo os especialistas.
A boa é que a CrowdStrike está a propor como solução aos clientes um processo que requer poucos conhecimentos técnicos para implementar, apurou o ECO. É necessário reiniciar o computador, entrar num modo específico do Windows (modo de segurança) e apagar o ficheiro que estará a provocar o conflito. Segundo um especialista, “um técnico de primeira linha consegue resolver”.
Na rede social X, o CEO da CrowdStrike, George Kurtz, confirmou a existência de um problema que afeta só os sistemas Windows — “Mac e Linux não são impactados” — e garantiu que não se trata “de um incidente de segurança ou um ciberataque”. “O problema foi identificado, isolado e foi feita uma correção”, disse, acrescentando: “A nossa equipa está toda mobilizada para garantir a segurança e estabilidade dos clientes da CrowdStrike.”
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Todas as fontes ouvidas e consultadas pelo ECO são unânimes na opinião de que este problema vai deixar a CrowdStrike em maus lençóis. “A CrowdStrike deixou de ser uma empresa confiável”, desabafou com o ECO uma pessoa que está a lidar diretamente com a situação. Já o CEO da empresa de cibersegurança VisionWare, Bruno Castro, comenta que “ninguém esperaria isto vindo de um fabricante destes”, destacando que a CrowdStrike era conhecida por ter “um ADN muito grande de confidencialidade, integridade e disponibilidade”. Antes da abertura das bolsas nos EUA, as ações da CrowdStrike chegaram a cair 21% na manhã desta sexta-feira, um sinal claro do nervosismo dos investidores.
"Temos um mega fabricante que, ao colocar os sistemas indisponíveis, causa um efeito dominó que coloca em causa o ciberespaço todo.”
O que nos diz este problema sobre a forma como o mundo funciona atualmente? “Diz-nos uma coisa muito importante: estamos cada vez mais dependentes do mundo cibernético. Temos um mega fabricante que, ao colocar os sistemas indisponíveis, causa um efeito dominó que coloca em causa o ciberespaço todo”, afirma Bruno Castro, CEO da VisionWare.
Por sua vez, Rodrigo Adão da Fonseca diz que é preciso “olhar com alguma normalidade para estes problemas, a partir do momento em que somos mais digitais”. “Temos as vantagens, mas também temos de perceber que há falhas. É resolver, assumir a chatice. É a parte má de todas as vantagens que o mundo digital nos traz.”
A questão é que quem perdeu negócio por causa deste problema, quem ficou em terra porque o avião não descolou ou quem sofreu danos reputacionais porque o serviço esteve indisponível poderá não querer deixar passar isto em branco. A imprensa internacional reportou problemas nos aeroportos de Mumbai a Madrid e no transporte ferroviário no Reino Unido. A cadeia televisiva Sky News ficou impedida de fazer a emissão em direto. Quando a poeira assentar, muitas destas empresas vão exigir mais explicações… mas também responsabilidades.
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