Modelo de financiamento da AICEP é “uma manta de retalhos”, acusa Arroja
"Independentemente da pressão política que possa existir para agilizar apoios, na ausência de instrumentos de trabalho, são inviáveis maiores níveis de serviço", criticou Ricardo Arroja.
O ex-presidente da AICEP critica o facto de o modelo de financiamento da agência ser “uma manta de retalhos”. Ricardo Arroja, nas respostas enviadas à Comissão de Economia, a que o ECO teve acesso, reconhece que o “dossier estratégico que ficou pendente à data” da sua saída “foi a revisão do modelo de financiamento”. Embora tenha apresentado uma proposta conceptual ao então ministro da Economia, Pedro Reis, os trabalhos não avançaram a ponto deste novo modelo poder ser incluído no Orçamento do Estado para 2026.
“Depois de ter sido apresentada ao ministro da Economia, Pedro Reis, uma proposta conceptual de revisão do modelo de financiamento, aprovada pelo conselho de administração em 2024, avançou-se no primeiro semestre de 2025 para um conjunto de reuniões técnicas junto do Ministérios da Economia e das Finanças, com vista à preparação das mudanças desejadas para o Orçamento do Estado de 2026 e a fim da validação final daquelas tutelas – setorial e financeira –, antecipando de forma serena o ciclo orçamental vindouro”, conta Ricardo Arroja na resposta a uma pergunta do grupo parlamentar do PS. “Foram realizadas duas de três reuniões previstas, a terceira das quais acabou prejudicada pelo período eleitoral das legislativas de 2025 – acabando mesmo por se não realizar até ao momento em que saí de funções”, precisou.
Arroja não poupou críticas ao atual modelo de financiamento da agência “que é incompatível com princípios de boa gestão, mormente, numa altura em que se pedia à agência um reforço da sua atividade”. “Nos últimos anos, incluindo em 2024” – ano em que a agência teve um resultado líquido negativo – “o modelo de financiamento da AICEP ficou marcado pelo não recebimento de transferências correntes que lhe estariam destinadas, pela utilização de saldos de gerência para financiamento de iniciativas que deveriam ser financiadas com receitas efetivas consignadas para o efeito (v.g., Expo de Osaka 2025) e, também, pela utilização de fundos europeus (v.g., SIAC’s – Sistemas de Incentivos a Ações Coletivas –, dirigidos por convite à AICEP), em vez de receitas correntes do Orçamento do Estado, para financiamento de atividades de promoção externa que constituem área nuclear – logo, desejavelmente estáveis e previsíveis – da agência”, explica o ex-presidente nas respostas ao grupo parlamentar da Iniciativa Liberal.
Este ano foi “assegurado um reforço de receitas correntes, provenientes do IAPMEI, no valor de 18,25 milhões de euros, mantendo-se inalteradas as restantes fontes de financiamento corrente (v.g., o Turismo de Portugal e o Fundo para as Relações Internacionais)”, explicou o responsável que foi afastado do cargo pelo novo ministro da Economia, por falta de “disponibilidade e presença física”, nas palavras de Manuel Castro Almeida, que esteve esta terça-feira na Comissão de Economia precisamente para esclarecer o afastamento de Ricardo Arroja.
Este reforço foi “essencial”, segundo Ricardo Arroja, “atendendo ao persistente desequilíbrio nas contas da agência, à expansão de atividade que lhe havia sido solicitada pelo Governo (via RCM nº70/2024), e como solução de transição até à implementação do novo modelo de financiamento (que se antecipava para 2026)”. O responsável lamentou o facto de “não ter sido possível alterar o modo de financiamento da Expo Osaka 2025, que se manteve através de saldos de gerência da Aicep”. “Uma infeliz formulação, consagrada na RCM nº149/2022, de 29 de dezembro, que delapida a tesouraria da agência e os seus resultados líquidos“, criticou.
Constrangimentos no PRR e no PT2030
As críticas do economista e ex-gestor público não se cingem ao modelo de financiamento da agência. Ao nível dos fundos europeus, Arroja diz que, “lamentavelmente”, o PRR e o PT2030 “têm padecido de constrangimentos administrativos diversos, designadamente a ausência, em tempo útil, de ferramentas informáticas para análise e tramitação de candidaturas, que as autoridades de gestão são responsáveis por fornecer (atempadamente) aos organismos intermédios de gestão”.
“Na prática, isto traduz-se em avisos concursais que são publicados pelas autoridades de gestão de forma insuficiente, sem a concomitante disponibilização das ferramentas informáticas – indispensáveis numa área em que o rigor máximo tem de ser a máxima de serviço –, prejudicando a tramitação dos processos e a exequibilidade dos prazos de análise (que começam a contar com a publicação dos avisos, haja ou não forma de proceder à análise)”, explica o responsável. Esta mesma crítica foi dirigida por Castro Almeida à bancada socialista, esta terça-feira, para justificar o incumprimento da promessa de analisar as candidaturas aos fundos em 60 dias e os pedidos de pagamento em 30.
“Independentemente da pressão política que possa existir para agilizar apoios, na ausência de instrumentos de trabalho, são inviáveis maiores níveis de serviço”, sublinhou Ricardo Arroja, recordando os deputados que “esta deficiente realidade, que choca com o discurso político vigente e coloca um ónus indevido sobre organismos intermédios de gestão como a AICEP”, foi publicamente sinalizada pelo próprio em entrevista ao ECO, na qual deixou “críticas à cúpula do todo o sistema de atribuição de fundos europeus em Portugal – sob tutela do Ministério da Coesão Territorial (liderado então pelo Ministro Castro Almeida)”. O ministro que acabou por o afastar de funções por considerar que não tinha o perfil adequado para o cargo.
Nas respostas por escrito que enviou aos deputados, Ricardo Arroja sublinhou que, até abril, o montante total de investimento contratualizado pela AICEP ascendia a 300 milhões de euros, sendo que o objetivo delineado pelo conselho de administração da agência para o total deste ano é 3,7 mil milhões de euros, após os 420 milhões de 2024.
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