Vendas suspeitas de herdades em Sesimbra na origem das buscas da PJ ao Novobanco

Em causa estão vários negócios de propriedades na mata de Sesimbra, pertencentes ao Novobanco e cujos processos foram conduzidos por Volkert Reig Schmidt, gestor afastado há cerca de um mês.

As buscas levadas esta quarta-feira a cabo pela Polícia Judiciária à sede do Novobanco e ao escritório da consultora KPMG estão relacionadas com alegadas irregularidades na venda de ativos da instituição, situados na zona de Sesimbra. Segundo o que o ECO apurou, o universo de análise será a sociedade Greenwoods, com ativos totalizando cerca de 750 hectares, repartidos por cinco propriedades (herdades do Cabeço da Pedra, do Calhariz e da Ferraria, e quintas do Vale Bom e da Mó), na chamada mata de Sesimbra.

Este é um processo com mais de cinco anos, e foi conduzido por Volkert Reig Schmidt, homem vindo da Lone Star e que liderou até há bem pouco tempo o GNB GA, sociedade de gestão de ativos que tinha como missão vender património associado a projetos de crédito que deixaram um buraco nas contas do banco.

No âmbito do universo Greenwoods, o ECO noticiou um caso específico em abril deste ano, relatando que um dos ativos vendidos pelo Novobanco – uma herdade em Sesimbra – acabou por ir parar às mãos da esposa do responsável pelas vendas da instituição, apesar do aparente conflito de interesses.

Os factos remontam a maio de 2022, quando o GNB GA, a sociedade de gestão de ativos do Novobanco, então liderada por Volkert Reig Schmidt, decidiu vender a Herdade da Ferraria, localizada em Sesimbra, a um grupo de três investidores — Vasco Pereira Coutinho (Lince Capital), Álvaro Fernández (diretor-geral da Michael Page Portugal) e Alexandre Tilmant — por 1,5 milhões de euros, um milhão de euros abaixo das avaliações do banco.

Desde o início estava previsto a entrada de um quarto investidor, o que veio a acontecer dois anos mais tarde – logo em 2022, foi pedido à KPMG para estruturar a operação do ponto de vista financeiro e apenas o nome do quarto investidor não estava identificado do documento com o nome ‘Meco Project’. Isto indica que, logo à partida, estava prevista a entrada de um quarto investidor, e que a identidade desse investidor foi omitida nessa altura.

Em junho de 2024, a esposa de Volkert Reig Schmidt, Ana Flor Argos, adquiriu uma quota de 25% na sociedade que detém o terreno localizado na mata de Sesimbra, por 400 mil euros, tornando-se sócia dos três investidores (e amigos) que compraram a herdade ao banco.

Foi nessa altura que o presidente do GNB GA comunicou internamente o negócio realizado pela sua mulher, ao abrigo das regras do banco que obrigam ao reporte de detenção de participações societárias por membros dos órgãos sociais e respetivas partes relacionadas.

De imediato, o Novobanco desencadeou uma investigação ao processo de venda da Herdade da Ferraria. Em abril, a instituição assegurava ao ECO que “até à data, nada foi identificado que ponha em causa a integridade do processo de venda deste imóvel”.

Entre os pontos polémicos estão não apenas o eventual conflito de interesses – com um ativo a ir parar às mãos de um familiar do responsável – mas também o eventual afastamento de outras propostas mais vantajosas para o banco e para o Fundo de Resolução.

O ECO tentou confirmar as buscas, e os processos que as motivaram, junto do banco, mas não obteve resposta até ao momento.

Greenwoods debaixo de olho

Mas este não será o único ponto da investigação em curso, nomeadamente dentro da própria Greenwoods. Segundo noticiou o jornal Público em abril deste ano, chegou mesmo ao tribunal de Setúbal um pedido de ação declarativa civil visando “a nulidade de negócio simulado” de 8,7 milhões de euros, assim como o “exercício de preferência” de duas quintas desse mesmo grupo de propriedades, as quintas do Vale Bom e da Mó. O autor da queixa foi João Espírito Santo Brito e Cunha, membro da família Espírito Santo, que alega ter um direito de preferência na aquisição dessas propriedades – que confinam com a sua – e que nunca lhe foi permitido exercer, violando a lei.

Segundo o mesmo jornal, a queixa prende-se com o próprio processo de venda, com Brito e Cunha a alegar que houve uma simulação: os valores foram artificialmente repartidos pelas diferentes herdades que compunham a sociedade Greenwoods para impedir o exercício do direito de preferência sobre os terrenos adjacentes à Herdade da Jardia, que pertence ao queixoso. As quintas em causa acabaram por ser vendidas a investidores liderados pelo Grupo Arié.

Em comunicado desta manhã, a PJ confirma as buscas nesta operação que apelidam de “Haircut” e avança que “em cima da mesa” estão os crimes de corrupção passiva e ativa no setor privado, burla qualificada e branqueamento de capitais, no contexto da venda de ativos do Novo Banco, desde o ano de 2018.

“Em causa estão suspeitas de terem sido praticadas diversas ilegalidades na venda de ativos imobiliários detidos por uma instituição bancária apoiada financeiramente pelo Estado português, através do Fundo de Resolução, resultando dessas operações avultados prejuízos para o Banco em questão e para os interesses do Estado”, lê-se no comunicado da PJ.

O Ministério Público confirmou ainda que as buscas decorrem em domicílios, instalações bancárias, escritório de advogados, sociedade de revisores oficiais de contas e nas sedes de 16 sociedades comerciais.

A operação policial, através da Unidade Nacional de Combate à Corrupção, visa a execução de dezenas de mandados de busca e apreensão e de pesquisa informática. Participaram na operação mais de 100 elementos da PJ, 14 procuradores do Ministério Público, três juízes de Instrução Criminal e um elemento da Autoridade Tributária.

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