Como avaliam os empresários o patinho feio do Governo?
O PIB está a crescer ao maior ritmo do século. Mas o ministro da Economia é o menos popular. O ECO falou com empresários: dizem que Caldeira Cabral é competente, mas ainda lhe falta peso político.
Desde que iniciou funções até ao momento, Manuel Caldeira Cabral é visto como o ‘patinho feio’ do grupo. O PIB teve a maior subida dos últimos 17 anos, mas a popularidade do ministro da Economia é a pior entre os membros do Executivo. Ao ECO, os empresários contactados elogiam o desempenho, mas admitem dificuldades na comunicação. Caldeira Cabral é visto como o “menos político” do Governo, “fora dos holofotes” e, principalmente, apagado por Mário Centeno e João Vasconcelos.
“O atual ministro nasceu assim“, confessa o presidente da Frulact, João Miranda. O próprio primeiro-ministro apelidou-o de “tímido e talvez discreto de mais” no Congresso do PS. Um dos comentadores mais influentes do país, Marques Mendes, sentenciou o destino de Caldeira Cabral: “O atual ministro da Economia não vai durar muito tempo”. Ainda esta quarta-feira o Jornal de Negócios noticiava uma “remodelação em marcha lenta”, onde se inclui a saída do suspeito do costume.
Um dos pontos fracos é o seu perfil académico uma vez que António Costa quererá alguém mais próximo dos empresários. Manuel Caldeira Cabral era professor na Universidade do Minho, ainda que, no passado, já tivesse sido assessor económico em governos socialistas. O que dizem os empresários? Elogiam o desempenho do ministro e da economia portuguesa, apontando a falta de carisma como um ponto fraco.
Não gere bem a sua capacidade de comunicação e a perceção que existe sobre a sua obra.
“A fraca popularidade do ministro da Economia é uma questão de psicologia social”, atira o presidente do grupo DST, José Teixeira, ao ECO, assinalando a “natureza” de Manuel Caldeira Cabral e a sua “coreografia”. “Há alguns que têm jeito para a teatralização“, diz, mas o economista do Norte não é um deles. A mesma hipótese é lançada pelo presidente da Hovione, Peter Villax: “Não gere bem a sua capacidade de comunicação e a perceção que existe sobre a sua obra”.
Para Villax a baixa popularidade é, em última análise, “um mistério”. “Caldeira Cabral é muito simpático, é uma pessoa encantadora, mas não se tem afirmado”, confessa. Uma tese confirmada pelo presidente da Frulact, João Miranda, que admite que “a única coisa que se pode apontar é a falta de carisma, de conseguir mover com o discurso, com um murro na mesa”.
Os estudos de opinião têm dado Manuel Caldeira Cabral como um dos ministros mais impopulares. Contudo, essa classificação ganhou outra leitura quando, no mês passado, o ministro da Economia continuou a ser o pior no estudo de opinião revelado pelo Expresso, mesmo depois da tragédia de Pedrógão Grande ter afetado Constança Urbano de Sousa, ministra da Administração Interna, e o caso de Tancos ter abalado Azeredo Lopes, ministro da Defesa.
A única coisa que se pode apontar é a falta de carisma, de conseguir mover com o discurso, com um murro na mesa.
Tal popularidade contrasta com os números do crescimento económico que superaram as expectativas dos socialistas: a surpresa com os 2% no quarto trimestre de 2016, o crescimento de 2,8% no primeiro trimestre de 2017 e a manutenção do ritmo de subida do PIB nos 2,9% no segundo trimestre. Este último número, por exemplo, é o maior crescimento económico em 17 anos. E, ainda que beneficie de uma base baixa de comparação em 2016, é das melhores notícias que um ministro da Economia teve na mão para dar aos portugueses nos últimos anos.
Centeno e João Vasconcelos ofuscam Caldeira Cabral
Os próprios empresários contactados pelo ECO dão o mérito a Caldeira Cabral. Mas João Miranda reconhece que Portugal teve, “no passado, ministros da Economia muito populares”, o que já não tem acontecido ultimamente. Na última década, em parte por causa do programa de ajustamento, a importância do ministro da Economia foi passando para o ministro das Finanças: a atenção passou a estar no défice e na dívida pública. Foi o caso de Vítor Gaspar e de Maria Luís Albuquerque em relação a Álvaro Santos Pereira e a António Pires de Lima, respetivamente, o que também se verifica com Mário Centeno — o ministro das Finanças que contrasta por ser o membro do Governo mais popular.
À semelhança dos seus antecessores, também Caldeira Cabral não escapou a esse efeito e… às gaffes. Poucos meses após ter iniciado funções, quando aplicou o agravamento fiscal aos combustíveis previsto no OE2016, Caldeira Cabral apelou aos portugueses para não abastecerem em Espanha: “Temos de olhar com preocupação porque corresponde também a impostos que deixam de ser pagos em Portugal”, disse em março de 2016. As críticas não tardaram a chegar. Meses depois, no âmbito do OE2017, admitiu que “a progressividade [do IRS] poderá afetar as classes mais altas marginalmente”. Os estragos de Caldeira Cabral foram depois amparados por Centeno: “Em termos de IRS, as taxas não serão alteradas”, garantiu o ministro das Finanças.
Além de Mário Centeno, o presidente da Hovione, Peter Villax, aponta o nome de João Vasconcelos, ex-secretário de Estado da Indústria, como um dos fatores de retirada de protagonismo a Caldeira Cabral. “O sucesso do João Vasconcelos também é o sucesso do Caldeira Cabral, mas a verdade é que o secretário de Estado acabava por ter mais visibilidade e protagonismo que o ministro“, admite Villax, referindo-se à área das startups que teve o seu ponto alto na realização do Web Summit em novembro de 2016.
Discreto ou ousado? “É o menos político”, apontam empresários
Pouco depois de tomar posse, o próprio Caldeira Cabral admitia ao Público que não se via como um “intervencionista”. A sua prioridade está no contacto direto com os empresários. Em agosto de 2016, Caldeira Cabral confessava ao DN que “o carro do ministério já marca perto de 100 mil quilómetros”. O ministro da Economia tem percorrido Portugal de norte a sul e este é o seu principal argumento contra as críticas de ser um ministro “tímido”. “Acho que ousado e ambicioso não são contraditórios com tímido e discreto”, acrescenta na mesma entrevista. Caldeira Cabral chegou até a dizer que não tinha “uma máquina de propaganda”.
Esta forma de atuar do ministro leva os empresários a concluir que tem um perfil menos político, aponta o diretor-geral da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal. Paulo Vaz compara-o ao ex-ministro da Economia de António Guterres, Daniel Bessa: “Os ministros menos políticos são mais expostos às movimentações políticas e geralmente são mais sacrificados, mas este caso é ainda mais estranho porque a economia está a funcionar, por mérito do Governo e fruto de uma conjuntura internacional positiva“.
Dá prioridade ao trabalho que faz e não tenta apregoá-lo.
Paulo Vaz aconselha Caldeira Cabral a “capitalizar” os indicadores económicos — “o melhor que este Governo tem para apresentar”. “Caldeira Cabral criou um modelo de desenvolvimento económico a que este Governo se agarrou como alternativa à austeridade”, argumenta. Ainda assim, admite que o próprio ministro não esteja interessado num futuro de carreira política.
A mesma tese é apontada pelo presidente da Amorim Turismo, Jorge Armindo: “É o menos político do Governo”, classifica, referindo que a popularidade está ligada às notícias. Jorge Armindo diz que Caldeira Cabral, “apesar de estar a fazer um trabalho correto, não se exibe demasiado”. Ou seja, está “fora dos holofotes”, porque “não tem jeito para isso”. “Dá prioridade ao trabalho que faz e não tenta apregoá-lo”, argumenta, relembrando a velha máxima de que “à mulher de César não basta ser séria, tem de parecer”.
Já José Teixeira, presidente do grupo DST, que diz conhecer Caldeira Cabral, classifica-o como “sério e trabalhador”. “A economia está a funcionar e isso não pode ser dissociado do trabalho do ministro da Economia”, argumenta, referindo que há projetos em que “é preciso saber esperar para colher”. É por isso que José Teixeira é contra a saída do académico do Governo. Também João Miranda, presidente da Frulact, sai em defesa do ministro: “Tecnicamente não há nada a apontar ao ministro Caldeira Cabral, tem alinhado algumas políticas com as necessidades dos empresários, das empresas e da economia”, argumenta.
A economia está a funcionar e isso não pode ser dissociado do trabalho do ministro da Economia.
E o que já fez Caldeia Cabral? Em quase dois anos já lhe passaram pelas mãos vários dossiers. Por exemplo, os fundos comunitários para as empresas. A meta logo no arranque da legislatura era fazer chegar cem milhões de euros às empresas nos primeiros cem dias de Governo. Caldeira Cabral foi conseguindo cumprir todas as metas sucessivas fixadas neste capítulo, mas os louros parecem recair no ministro do Planeamento, Pedro Marques, que tutela a maior parte dos fundos. Outro marco foi a conclusão do Programa Capitalizar que passou pela revisão do Processo Especial de Revitalização — um trabalho feito em parceria com a ministra da Justiça, Francisca Van Dunen — mas também a definição de apoios para ajudar as empresas a resolver um dos principais problemas que levou muitas a fechar portas.
Os números recordes das receitas do Turismo, a descida do IVA na restauração, a realização do Web Summit e a garantia de que o evento volta a Lisboa este ano parecem não ser suficientes para dar popularidade ao ministro.
Numa tentativa de ter mais exposição, Manuel Caldeira Cabral tem apostado na mensagem que passa para o exterior. A entrevista mais recente foi ao El País, mas já passou por diversas vezes na Bloomberg, foi entrevistado pelo jornal alemão Handelsblatt, esteve presente em Davos e em outros encontros internacionais.
Em Portugal, a olhar para os estudos de opinião, a mensagem não tem chegado aos portugueses. Falta saber se o ‘patinho feito’ se transforma em ‘cisne’, evitando a saída do Executivo antes das eleições legislativas de 2019.
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