Salário mínimo: o que dizem os senadores da concertação?
Os parceiros sociais voltam à mesa das negociações com o salário mínimo na agenda. Será que ainda vão a tempo de chegarem a um compromisso?
Os parceiros sociais voltam a reunir-se hoje para discutir o aumento do salário mínimo. O final do ano aproxima-se e o Governo já prometeu uma subida para janeiro. Há tempo, e condições, para isso? O que têm os antigos elementos da concertação a dizer?
Presidente do Conselho Económico e Social (CES) entre 2009 e 2015, Silva Peneda conhece a dinâmica das negociações entre confederações patronais e sindicais. E avisa: “a minha experiência mostra que os acordos de Segurança Social dependem muito da agenda; quanto mais se afunila a agenda, menos probabilidades há de acordo“. Isto porque a agenda “tem de ser atrativa para todos” e, quando é limitada, há menos hipóteses de os parceiros “se reverem”.
“Sou favorável a uma agenda mais vasta”, diz, por isso, Silva Peneda, mas acrescenta: “o tempo é inimigo e tudo tem o seu timing“. É esse o caso agora. Ainda que o final do ano esteja próximo, o ministro do Trabalho garante que haverá um novo salário mínimo no dia 1 de janeiro “com toda a certeza”.
Já o atual presidente do CES espera que o “processo avance alguns passos”. Se for possível chegar ao acordo, “muito melhor”, mas se isso não acontecer hoje ainda, “não haverá drama de maior”, frisa Correia de Campos. E partilha a opinião de Silva Peneda: os “bons acordos” têm de ser abrangentes.
Esta ideia é, aliás, generalizada. Em entrevista à TSF, o Presidente da República defendeu recentemente que um acordo centrado no salário mínimo é “pobre”. E também o ministro Vieira da Silva já tinha defendido um acordo de médio prazo que envolvesse várias matérias, embora na última reunião de concertação social tenha afirmado que, a haver um compromisso, este deverá ser “principalmente em torno das questões do salário mínimo”.
João Proença, antigo líder da UGT quando foi assinado o acordo de 2006 para o aumento do salário mínimo, também salienta que o prazo é apertado. “Como é que num timing muito apertado se faz um acordo sério de concertação? Ou é um acordo muito ligeiro ou não há acordo nenhum“, afirma.
"Se toda a gente está numa corrida, pode haver um acordo mas será com certeza muito fraquinho.”
E há ainda uma questão adicional. O Governo foi para a concertação social com um valor pré-definido com o Bloco de Esquerda: 557 euros. “Não se está a discutir o valor do salário mínimo, está a dizer-se aos parceiros sociais que assinem por baixo o valor previamente acordado entre PS e Bloco de Esquerda e isso é difícil”, salienta Proença.
Esta atitude desvalorizou o papel dos parceiros sociais e “até se podia dizer que violou a lei“, com o Governo a “acordar o salário mínimo sem previamente ouvir os parceiros sociais”, afirma ainda.
Neste cenário, “é muito secundário haver acordo ou não”, frisa. “O importante é que o salário mínimo não envenene as questões na concertação social, não provoque ruturas”, acrescenta o antigo líder da UGT. Não é isso que está a acontecer mas esse seria um perigo se o Governo dissesse “que vai repor a legislação laboral de 2009 ou de 2003”.
540, 557, 565 ou 600 euros?
O programa do Governo aponta para um aumento do salário mínimo dos atuais 530 para 557 euros em 2017. Os patrões não querem ir tão longe e apontavam para 540 euros durante as negociações, admitindo inclusivamente definir uma proposta comum a apresentar ao Governo. A UGT já reivindicou um aumento para 565 euros em janeiro mas também admitiu aceitar um valor abaixo de 557 euros se o Governo aceitar algumas moedas de troca. Já a CGTP defende 600 euros.
Que valor pode suportar a economia? “É muito difícil dizer e, mais do que isso, é injusto”, diz Francisco van Zeller, antigo presidente da CIP (Confederação da Indústria Portuguesa na altura e hoje Confederação Empresarial de Portugal). Apontando para a diferença entre setores e regiões, van Zeller fala numa “armadilha”. E recorda ainda que o salário mínimo comporta um efeito de arrastamento nas remunerações imediatamente a seguir, que também precisa de ser tido em conta pelas empresas.
Mesmo os 540 euros defendidos pelos patrões “é muito, porque a economia não se desenvolveu muito”. “Seria um passo razoável”, admite no entanto. Mas “ir para os 557 é um salto no escuro” e prometer 600 euros no fim da legislatura “é uma loucura sem saber quais são as condições”, frisa. Para van Zeller, o salário mínimo deve ser uma “rede de segurança” e os contratos coletivos de trabalho é que devem fixar subidas.
José Carlos Pinto Coelho — outro antigo líder de uma confederação patronal, neste caso a do Turismo — diz que “é evidente que o salário mínimo é baixo e deve estar ligado a outros fatores”. E acrescenta: “sendo baixo o crescimento económico, a conclusão é um pequeno ajustamento“.
Numa perspetiva diferente, Carvalho da Silva, defende que o aumento do salário mínimo — nomeadamente para os 557 euros — “é mais do que justo e necessário”. E a economia tem condições para isso, refere.
Quando o acordo de 2006 foi celebrado, Carvalho da Silva era líder da CGTP. Aquele compromisso teve “um dos efeitos mais significativos da vida da concertação social”, que se estendem até hoje, diz. “Não houve até agora nenhum debate tão profundo sobre as implicações na economia e a relação entre economia e social como esse”, diz.
"É propício utilizar o salário mínimo para campos de pedinchice.”
Mais: houve uma atenção “clara e consciente dos setores empresariais”, que deram “sinais como nunca em qualquer outro período” relativamente à importância de valorizar os salários. Mas agora, nota-se um “percurso”, acentuado pelo último Governo, de, em nome da crise, “haver uma prática de contrapartidas sucessivas aos setores patronais que não se justificam“, afirma Carvalho da Silva. “É propício utilizar o salário mínimo para campos de pedinchice que não se adequam com uma abordagem” económica e social “séria”.
Os patrões já falaram em contrapartidas mas ainda não concretizaram quais. E também van Zeller diz que para poder absorver as subidas do salário mínimo são necessárias “outras condições”.
Concertação social: antes e depois
Van Zeller acredita que a concertação social mudou muito desde os tempos em que liderava a CIP. “Há muita política metida… sempre houve, mas agora há muito mais”, afirma, apontando o dedo ao atual líder da CGTP. “Naquele tempo, conseguíamos negociar embora houvesse diferenças políticas, conversávamos e era possível”, acrescenta.
O antigo presidente da CIP deixa ainda um elogio a um dos líderes que se sentava do outro lado da mesa: João Proença, então secretário-geral da UGT. Foi ele “o pivô do último acordo” de médio prazo em torno do salário mínimo, diz. “Ele puxava para o seu lado de modo a que todos ganhassem; sem ser à custa do outro perder”, afirma. Hoje, esse papel da UGT “também se perdeu um bocadinho”.
Já João Proença entende que a central “tem tentado abrir espaço” à negociação, o que, afirma, não é fácil.
Há 10 anos, como hoje, Vieira da Silva era ministro do Trabalho e procurava um consenso em torno do salário mínimo. Van Zeller elogia o seu papel: “é o melhor que se podia ter neste instante, não acredito que em Portugal houvesse melhor”. Proença também valoriza a experiência de Vieira da Silva no cargo.
Já o atual presidente da CIP, António Saraiva, lida agora com mais dificuldades, diz Van Zeller. As outras confederações patronais “subiram muito a sua importância” e por isso Saraiva “neste instante está um pouco diluído” entre os restantes parceiros, afirma o antigo presidente.
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