O empréstimo deveria ter sido mais elevado e levou-se demasiado tempo a reconhecer que os bancos tinham um problema. Lições da era troika, segundo Blanchard.
Revisitamos a era da troika. Para Olivier Blanchard é claro que se o empréstimo da troika tivesse sido mais elevado o programa de ajustamento teria sido melhor sucedido e menos doloroso para os portugueses. Porque não foi maior? Não sabe. Uns dizem que foi o Governo da altura, outros dizem que foi a própria troika.
Também na banca identifica erros. Considera que se demorou tempo demais a verificar que o sistema bancário português tinha um problema e mesmo depois de se concluir isso demorou-se demasiado tempo a atuar. Eis as sintéticas lições que se podem tirar do programa de ajustamento segundo Olivier Blanchard, numa entrevista dada ao ECO que durou pouco mais de meia hora.
Que lições podem ser tiradas do programa da troika em Portugal?
A consolidação orçamental foi demasiado forte. Mas temos que ter em conta que tinham perdido acesso ao mercado, o dinheiro era limitado e tinham que reduzir o défice. A questão é se o programa foi suficientemente generoso, ou se [o empréstimo da troika] devia ter sido mais generoso para permitir uma redução mais lenta do défice público. E acho que sim, que o empréstimo deveria ter sido mais elevado.
Não sei se foi a troika ou o Governo da altura que não quis [mais dinheiro]. Está nos segredos dos deuses. Mas o programa de ajustamento teria sido mais bem sucedido e menos doloroso se o empréstimo da troika tivesse sido mais elevado. Como não foi, a consolidação orçamental que se teve de fazer foi muito dolorosa.
Quanto às reformas estruturais, não olharam exatamente para a lista da troika. Acho que algumas reformas estruturais deviam ter sido parte do programa.
Continuam a ser necessárias?
Sim, continuam. Portugal tem uma produtividade que é impressionantemente baixa.
No sistema financeiro, considera que a troika não quis ver o que se passava ou não viu? Em 2014 vimos um banco, o BES, colapsar.
Levou-se muito tempo a reconhecer que havia um problema nos bancos. Não sei se foi a troika ou o Banco de Portugal. Mas passou demasiado tempo até se aperceberem do estado dos bancos. E tudo devia ter sido feito de forma mais rápida.
Está a dizer que eles não viram o problema?
Viram os problemas nos bancos tarde de mais. Ou talvez os tenham visto, mas não fizeram o que era necessário. Mas o que havia a fazer está basicamente feito. Alguns bancos foram resolvidos, limpos, capitalizados. Acho que estão numa posição muito melhor agora. Demorou foi muito tempo. Mas não sei de quem foi a culpa.
Mas concorda com o diagnóstico de Nicolas Véron?
Li o seu relatório, li a carta do governador. Não sei o suficiente para ter a certeza. Mas acho que ele tem razão. Mas é história, porque muitos progressos foram entretanto feitos.
[Nicolas Véron foi o autor da avaliação externa à atuação do FMI na crise do euro mas apenas nos seus aspetos financeiros. Véron identifica problemas no diagnóstico dando indiretamente a entender que o Banco de Portugal ou foi cúmplice dos bancos ou não foi capaz de perceber o que se passava. E acusa os participantes no programa de preconceitos ideológicos, nomeadamente por colocarem de parte soluções como a nacionalização. O governador do Banco de Portugal Carlos Costa escreveu uma carta a criticar essas conclusões. O documento completo pode ser visto aqui].
Na sua perspetiva, as regras do euro, o Pacto de Estabilidade e as regras da concorrência, foram um problema para desenhar as melhores políticas para lidar com a crise portuguesa?
Todos concordam que não são as melhores regras, não só para Portugal, mas para os países do euro e da União Europeia em geral. Com Macron posicionado como defensor do projeto europeu e quando os alemães estiverem disponíveis para conversar, devem fazê-lo e sentar-se para pensar nas regras orçamentais que queremos ter. Mudando essas regras mas sem nos livrarmos delas. Tornando-as mais flexíveis.
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Blanchard. “Levou-se muito tempo a reconhecer que havia um problema nos bancos”
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