Nós e Macron
Macron não confunde as consequências de uma globalização, que precisa de regulação, com voltar para trás, como fazem Le Pen e Mélenchon.
Há leituras dos resultados das eleições presidenciais francesas para todos os gostos. Macron emerge como vencedor, e todos querem ficar com o seu ‘quinhão’. Ficar com uma parte da vitória. E, em bom rigor, esse é o grande mérito de Macron: ao centro, de que todos pareciam fugir, está a larga maioria do eleitorado francês. Macron afirma-se pela positiva, como um defensor das liberdades fundamentais do projeto europeu e um reformador da União Económica e Monetária.
O candidato centrista afirma o reforço da via europeia como a solução, não desiste da Europa como espaço comum e não incorpora o discurso dos radicais. Macron perante o medo não ofereceu ‘fechamento’, prometeu mais abertura. Não regressou à confrontação social ‘novecentista’, fez um discurso de esperança voltado para o século XXI. Macron não confunde as consequências de uma globalização, que precisa de regulação, com voltar para trás, como fazem Le Pen e Mélenchon, alimentando o pior que há em cada um de nós, em cada ser humano, a aversão ao exterior, numa culpabilização tão fácil quanto errada. É certo que com perspetivas diferentes: mas no essencial o mesmo. O ataque ao liberalismo económico e social e à economia social de mercado.
Também é um discurso populista? Provavelmente sim. Ilude dificuldades de implementação? É bem verdade. Mas isso não lhe retira o mérito de não se refugiar nos simplismos confrontacionais que Le Pen e Mélenchon incorporam nos seus discursos, e que para mal dos nossos pecados Hammon tentou mimetizar. Hammon fez aquilo que há de pior: tentou fazer do PSF uma caricatura de si mesmo. Teve o resultado esperado. Uma derrota humilhante.
Esta discussão é interessante: porque ao contrário do que dizem alguns dos meus camaradas de partido, o PSF não ‘pasokizou’. O PSF foi vítima do populismo mais infantil, ao querer refugiar-se num discurso que não é nem nunca foi o seu. Ao contrário de Mitterrand, de Jospin, de Delors, entre outros, Hammon construiu um discurso de ‘regeneração’ que alimentou Mélenchon, e deixou Macron como o verdadeiro herdeiro do PSF. Entregou-se às ‘franjas’, credibilizou a extrema-esquerda, e esvaiu-se. Não contou para nada. Teve 1/3 dos votos de Mélenchon. Quase 1/4 dos votos de Macron. Espero que este resultado sirva para que o PSF perceba: o programa da extrema-esquerda francesa é tão perigoso para os socialistas como o discurso neoliberal e conservador da direita. A identidade não se forja de um dia para o outro.
Por isso, querer confundir os (muito) bons resultados do Governo PS com qualquer solução política a partir de extrema-esquerda, como por exemplo procurou o próprio Hammon, é um erro; os bons resultados, que são possíveis com o apoio e contributo de todos os partidos da maioria parlamentar, partem no essencial do programa do PS. Um programa moderado, moderno, social-democrata e europeísta – mas não acriticamente europeísta – que olha para o futuro. Se a convergência tática num momento particularmente importante foi fundamental para viabilizar o XXI Governo Constitucional, os portugueses sabem bem que o PS é um partido radicalmente democrata e europeísta. Esta marca identitária está presente todos os dias na governação do país. Como aliás bem o sublinham Catarina Martins e Jerónimo de Sousa.
É por isso – julgo eu – que os resultados das sondagens são o que são: o PS solidamente a conquistar eleitorado ao centro, mostrando que é possível a via europeia, com uma política diferente, como bem fica patente no Programa de Estabilidade (2017-2021) e no Programa Nacional de Reformas. Não mimetizamos no discurso o BE e o PCP. É o PS de sempre. Sendo mais uma vez a verdadeira balança da democracia portuguesa. É assim desde 1974.
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