Bruxelas diz que mudança nos escalões de IRS vai agravar desigualdade em Portugal
As mudanças implementadas pelo Governo no IRS em 2018 vão ter um efeito negativo na desigualdade em Portugal. A conclusão é dos técnicos da Comissão Europeia que alertam que medida vai custar mais.
A desigualdade em Portugal vai aumentar com o impacto das mudanças que o Governo decidiu fazer no IRS aprovadas no Orçamento do Estado para 2018 (OE2018), segundo as contas da Comissão Europeia. Bruxelas estima que essa reforma vá aumentar o coeficiente de Gini — a medida internacional de desigualdade numa economia –, o que implica uma maior redistribuição desigual do rendimento. Além disso, os técnicos alertam que a perda de receita será maior do que o previsto por Mário Centeno.
No relatório Country By Country do Pacote de Inverno do Semestre Europeu, a Comissão Europeia dedica toda uma página à reformulação fiscal em Portugal aplicada em 2018 com as mudanças nos escalões de IRS, o aumento do mínimo de existência e o desaparecimento da sobretaxa. Os técnicos aplicaram um modelo à situação portuguesa através do qual simulam dois cenários: o cenário base onde tudo fica igual a 2017 e o cenário de 2018 com a reforma do IRS implementada.
Com essa ferramenta, a Direção-Geral dos Assuntos Económicos e Financeiros (ECFIN) estimou a perda de receita e os efeitos redistributivos das medidas. E as conclusões são claras: a reforma fiscal do IRS vai custar mais 85 milhões de euros face ao previsto e os efeitos na desigualdade do país serão negativos. “Estima-se que a reforma do IRS não tenha um impacto de redução da desigualdade no rendimento, uma vez que a maior parte dos benefícios serão concentrados” nos contribuintes com mais rendimentos, assinala a Comissão Europeia.
Tanto o fim total da sobretaxa de IRS para os escalões mais altos como a mudança na estrutura dos escalões levam a aumentar do coeficiente de Gini, o que implica uma redistribuição do rendimento mais desigual.
“Em relação à redistribuição [do rendimento], tanto o fim total da sobretaxa de IRS para os escalões mais altos como a mudança na estrutura dos escalões levam a aumentar do coeficiente de Gini, o que implica uma redistribuição do rendimento mais desigual”, lê-se no documento divulgado esta quarta-feira. Este efeito é “marginalmente compensado” pela diminuição do coeficiente de Gini induzido pelo aumento do mínimo de existência.
Para Bruxelas a abolição da sobretaxa em 2018 vai beneficiar em grande parte apenas o último decil de rendimentos, ou seja, os mais ricos dos mais ricos. E as mudanças nos escalões? “Como os cinco decis mais baixos [de rendimento] já estão isentos de IRS ou a pagar a taxa mais baixa, a mudança na estrutura dos escalões intermédios beneficia principalmente os cinco decis mais altos“, explicam os técnicos. Além disso, nas contas da Comissão, “o aumento do mínimo de existência beneficia principalmente a média do rendimento disponível para o quinto decil”.
No OE2018, o Governo decidiu desdobrar o segundo e o terceiro escalões, reduzindo as taxas marginais aplicadas. Passaram assim a existir sete escalões de IRS em 2018.
Estado vai perder mais 85 milhões de euros do que prevê o Governo
Os técnicos estimam que o fim da sobretaxa vá significar uma perda de receita de 140 milhões de euros em 2018. Já a mudança nos escalões deverá representar uma perda de receita de 440 milhões de euros — o Governo estima uma perda de 230 milhões — e o aumento do mínimo de existência menos 30 milhões de euros.
Considerando apenas as últimas duas medidas — para que comparar com os números do Governo –, a perda de receita atinge os 470 milhões de euros, sendo que o Ministério das Finanças, em outubro de 2017, estimava uma perda de receita de 385 milhões de euros na proposta do OE2018. Há uma diferença de 85 milhões.
Contudo, os técnicos admitem que o efeito não se reflita totalmente em 2018. Porquê? Como a tabela de retenção não traduz totalmente o desagravamento fiscal introduzido nos escalões do IRS, o efeito só se vai materializar quando forem entregues em 2019 as declarações de IRS relativas a 2018 e os respetivos reembolsos.
Ao todo as três medidas representam, nos cálculos do ECFIN, 610 milhões de euros, o que representa cerca de 5% da receita de IRS que o Estado deveria angariar no cenário base.
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