Bancos têm 28 mil milhões parados que não estão a ser usados para dar crédito
Bancos tinham no final de junho cerca de 28 mil milhões de euros em depósitos que não estavam a ser canalizados para empréstimos, dinheiro parado que penaliza a rentabilidade das instituições.
Entre os alertas de excesso no crédito às famílias e as críticas relativas ao medo que têm em emprestar dinheiro às empresas, os bancos vivem hoje em dia uma situação excecional no que toca às disponibilidades para conceder crédito à economia. Segundo os dados mais recentes do Banco de Portugal, o sistema financeiro nacional tinha no final de junho cerca de 28 mil milhões de euros parados e que podiam ser canalizados para a economia.
Os bancos têm como função principal emprestar às famílias e empresas o dinheiro que recebem dos depósitos, fazendo negócio com a diferença dos juros recebidos pelos empréstimos e os juros pagos nos depósitos (margem financeira). Porém, entre empréstimos concedidos e depósitos dos clientes, tinham no seu balanço aproximadamente 28 mil milhões de euros que foram depositados e não estão a ser usados para crédito, penalizando a sua rentabilidade — isto para que o total do crédito fosse igual aos depósitos (100%), sendo que o Banco de Portugal assume o rácio de 120% como um nível recomendável (a CGD, por causa da ajuda estatal, não pode passar de 100%).
A diferença entre crédito e depósitos agravou-se em cerca de nove mil milhões de euros só no último trimestre, terminado em junho, de acordo com os dados do Sistema Bancário Português. Este cenário que contrasta com aquilo que era a prática dos bancos antes da crise, quando tinham mais dinheiro emprestado à economia do que aquele que estava depositado nos seus cofres — em dezembro de 2013, o gap comercial era positivo em 30 mil milhões de euros. Ou seja, tinham concedidos mais 30 mil milhões do que o valor em depósitos. Em 2007, o rácio de transformação chegava a 160%.
Fonte: Banco de Portugal
Esta evolução resulta sobretudo do facto de os depósitos de clientes terem aumentado “significativamente no segundo trimestre de 2018, em particular no segmento das sociedades não financeiras [as empresas]”, diz o Banco de Portugal. Isto apesar do ambiente de juros baixos promovido pelas políticas do Banco Central Europeu. O “ativo total [ou seja, os créditos] do sistema bancário aumentou no segundo trimestre de 2018, invertendo a tendência de queda verificada nos últimos anos”, mas muito menos que as aplicações nos bancos.
A concessão de crédito ganhou visibilidade este ano, com os sucessivos alertas do Banco de Portugal e, ultimamente, do Governo, em relação a eventuais excessos que os bancos devem evitar para não repetirem erros do passado e que representam ainda um fardo para as instituições financeiras. Estes alertas prendem-se essencialmente com os novos montantes concedidos para a compra de habitação, mas também para o consumo por parte das famílias.
António Costa, esta semana, menorizou os avisos que têm sido feitos tanto cá dentro como lá fora — até porque o stock de crédito às famílias continua estável. Mas não deixou de criticar a postura dos bancos em relação às suas políticas de concessão de crédito mais “comodistas”, olhando para as empresas. “Os bancos têm de ganhar uma cultura de maior risco como é o crédito empresarial e não podem acomodar-se exclusivamente no crédito ao consumo das famílias ou no crédito de compra de habitação”.
Em resposta, Faria de Oliveira rejeitou as críticas do chefe do Governo, recusando qualquer discriminação dos bancos. “Tem havido um maior aumento do volume de crédito ao consumo e à habitação em função exatamente da situação do mercado e não por haver uma discriminação em relação ao segmento de concessão de crédito por parte do setor bancário”, disse. “Tomara que o sistema bancário possa conceder muito mais crédito às empresas”, sublinhou ainda, notando que os bancos não devem facilitar na avaliação do risco sob pena de comprometerem a sua solidez.
Malparado pesa, mas rendibilidade aumenta
Estes 28 mil milhões que os bancos têm em excesso são euros que não só não estão a render juros — como é intenção dos bancos quando os concedem em novos financiamentos –, como custam milhões aos bancos. Tendo em conta que o BCE mantém a taxa de juro de depósitos negativa, em -0,4%, ter estes milhares de milhões nos “cofres” obriga os bancos a pagarem para que o valor seja guardado — podem conceder empréstimos no mercado interbancário, mas mesmo esse continua com taxas abaixo de zero.
O gap comercial junta-se a outro travão aos lucros dos bancos: o malparado. Só no primeiro semestre do ano, foram vendidos mais de 4,5 mil milhões de euros em malparado, obrigando as instituições financeiras a reconhecerem perdas nas suas contas. E o esforço para limpar o balanço destes ativos tóxicos vai continuar nos próximos anos.
A Caixa Geral de Depósitos está a fechar a venda de uma carteira de 850 milhões de euros de malparado do segmento das empresas. E o Novo Banco tem um projeto chamado Operação Nata e que passa pela venda de um portefólio de crédito em incumprimento no valor de 1,75 mil milhões de euros, o maior de sempre em comercialização em Portugal até à data.
Apesar do impacto negativo que libertar estes ativos tem nos resultados do sistema, os bancos conseguiram, em termos globais, registar uma melhoria. A rendibilidade do sistema “aumentou de forma significativa no primeiro semestre de 2018, em termos homólogos, traduzindo uma redução do fluxo de imparidades e provisões, em especial para crédito, bem como a redução dos custos com pessoal”, diz o Banco de Portugal.
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