Artigo 13: “Fim da Internet” VS “Fim do Faroeste digital”
Wuant chamou a atenção para mudanças drásticas na Internet com a entrada em vigor do artigo 13. Mas afinal o que está em cima da mesa?
A reforma dos direitos de autor na União Europeia voltou ao centro da polémica, depois desta semana o popular youtuber português Wuant ter produzido um vídeo a contestar a proposta.
Durante 11 minutos, o jovem de 23 anos alertou os seguidores para a possibilidade da sua conta ser apagada e para o “fim da Internet”. Defendeu ainda que a medida surge para favorecer os órgãos de comunicação social e editoras de música europeias. Os alertas lançados por Wuant, partiram de um mail enviado pelo próprio Youtube a avisar os youtubers para as possíveis consequências da proposta do Parlamento Europeu. A plataforma digital alertou que os seus vídeos podiam deixar de ser vistos, e os utilizadores podiam vir a perder o acesso aos “criadores favoritos”, a “novos artistas” e “a milhares de milhões de vídeos de todo o mundo”.
O que é o Artigo 13?
A proposta foi aprovada, em setembro, pelos eurodeputados para que se seguisse um período de negociações – que ainda decorre – entre a Comissão Europeia, o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu. E, logo na altura, a polémica estalou. 438 eurodeputados votaram a favor, 226 contra e 39 abstiveram-se. O presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, disse que proposta ia pôr fim ao “faroeste digital” e que constituía uma “vitória para todos os cidadãos”, mas nem todos viram a proposta com bons olhos. É o exemplo da eurodeputada do Bloco de Esquerda, Marisa Matias, que acusou a proposta de abrir “caminho à censura prévia”.
Também fora do panorama política a diretiva tem gerado controvérsia. Entre criadores, artistas e editores tem colhido forte apoio. Em Portugal, é o caso de Carlos do Carmo, Pedro Abrunhosa ou Rui Veloso que falam em maior compensação pelo trabalho. Mas por parte das plataformas digitais, como a Wikipedia ou a Google, o texto tem enfrentado forte oposição, ao alegarem que poderá abrir a porta ao fim da Internet como existiu até agora. Personalidades conhecidas como o criador da Worl Wide Web, Tim Berners-Lee, e o co-fundador da Wikipedia, Jimmy Wales têm-se mostrado contra.
Para se ter noção da controvérsia vale a pena focar dois dos artigos mais polémicos.
- O 13º artigo, chamado pelos opositores de “máquina da censura”, poderá obrigar as plataformas digitais e agregadores de conteúdos a utilizar um sistema de filtragem de ‘upload’. Uma forma de identificar conteúdos protegidos por direitos de autor colocados online sem autorização e garantir que partes das receitas gerados são partilhadas com os titulares de direitos.
- Já o artigo 11º, chamado de “taxa do link”, diz respeito aos conteúdos noticiosos e direitos de editores que são veiculados por plataformas que agregam notícias, como o Google News. O artigo propõe que o conteúdo jornalístico divulgado por tais plataformas passe a ser taxado. Uma forma de remunerar os direitos de autor a partir das receitas publicitárias geradas pelas redes sociais e agregadores de notícias. Este artigo prevê ainda que os ‘links’ de artigos jornalísticos que sejam acompanhados de descrição tenham licença para que sejam publicados.
O ECO foi tentar esclarecer com os advogados Margarida Cruz Pereira, da JPAB Propriedade Intelectual e Filipe Mayer , sócio do departamento de TMT&PI da CCA Ontier que impactos reais e que diferenças podemos vir a sentir na utilização das plataformas digitais com a eventual entrada em vigor da proposta.
Atualmente as plataformas digitais já têm software que limita a utilização de material protegido por direitos de autor, como músicas ou vídeos. O que diferencia a nova diretiva?
A advogada Margarida Cruz Pereira reconhece a existência de programas que detetam “a utilização de músicas ou imagens protegidas por direitos de autor”. No entanto, lembra que os softwares “não se mostram suficientes para distinguir se esse uso é, ou não, indevido”. Com a entrada da nova diretiva, explica a advogada, as plataformas digitais, como o Youtube, “vão ser obrigadas a adotar novas medidas, desenvolver novas ferramentas capazes de filtrar todos os conteúdos descarregados por forma a evitar que conteúdo ilegal seja distribuído”.
Já Filipe Mayer lembra que a atual legislação “isenta plataformas como o Facebook e o Youtube de responsabilidade pelos conteúdos disponibilizados pelos seus utilizadores”. Mas não só. “O Youtube não pode ser obrigado a monitorizar proativamente todos os vídeos disponibilizados pelos seus utilizadores em busca de conteúdos ilícitos”.
Um youtuber ou utilizador de redes sociais terão algum tipo de problema em publicar fotografias onde aparecem marcas (de roupa, carros, cartazes de música…)?
Para o advogado Filipe Mayer, a questão não se coloca: “a diretiva não se refere ao direito de marca, mas aos direitos de autor”. Recorda ainda que “há exceções previstas na lei que protegem os utilizadores nos casos de inclusão episódica de obras ou outro material protegido noutras obras”.
Músicos que façam covers de músicas conhecidas não vão poder publicar os vídeos no Youtube?
Depende. “Se a cover não for licenciada, os músicos poderão estar a violar os direitos dos autores das músicas originais”, diz Filipe Mayer, lembrando que tal já é assim atualmente.
O Google vai ter que pagar os direitos de autor de todas as imagens que contenha no motor de busca?
Sim, garante Margarida Cruz Pereira. Com a aprovação do artigo 13º, “a Google terá de celebrar acordos de licenciamento com os autores e pagar os respetivos direitos autorais”.
Vamos ser proibidos de partilhar links de notícias nas redes sociais?
Não necessariamente. Filipe Mayer explica que, caso “as plataformas não adquiram previamente licenças para esses conteúdos, os links podem vir a ser mostrados de forma diferente (sem o título ou sem excertos a acompanhar a hiperligação, por exemplo). O objetivo é que “se o criador de determinado conteúdo partilhar links de outros criadores e, em resultado dessa partilha, obtém um ganho económico, terá necessariamente de dividir esse benefício económico com os criadores do conteúdo”, explica Margarida Cruz Pereira. Os advogados lembram ainda que a partilha de links poderá continuar livremente, no entanto não é de descartar a possibilidade de agregadores de notícias como Google News decidirem abandonar o mercado europeu.
Controvérsia à parte, convém relembrar que o novo pacote legislativo dos direitos de autor na União Europeia pode vir ainda a sofrer alterações e a votação final vai decorrer em janeiro. Se for aprovada poderá ainda sofrer variações nos diferentes 28 Estados-membros da União Europeia.
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