Inditex desinvestiu em Portugal mas têxtil português compensou diversificando
A Inditex não irá abandonar nunca Portugal, porque vai necessitar da produção de proximidade, diz a ATP, mas alerta para a necessidade de as empresas diversificarem clientes.
A espanhola Inditex tem feito um “desinvestimento grande” em Portugal, reduzindo as encomendas ao têxtil português “por questões de preço”, mas as empresas nacionais têm compensado esta quebra diversificando clientes e mercados, defende a associação setorial.
“Não é pelos preços que iremos encontrar a nossa competitividade e o que está a acontecer com a Inditex poderá ser pedagógico para muitas empresas, que se acomodaram, e um sinal importante para a nossa indústria de que o preço não é a resposta”, afirmou o diretor-geral da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP) em declarações à agência Lusa.
Não é pelos preços que iremos encontrar a nossa competitividade e o que está a acontecer com a Inditex poderá ser pedagógico para muitas empresas, que se acomodaram, e um sinal importante para a nossa indústria de que o preço não é a resposta.
Na véspera de o grupo Inditex – dono de marcas como a Zara e a Maximo Dutti e líder mundial da venda de roupa a retalho – divulgar os resultados de 2018, Paulo Vaz destacou que, apesar da quebra de 4% em 2018 e de 2% em 2017 das exportações do têxtil e vestuário português para Espanha, este “há de ser sempre um mercado fundamental para Portugal e para a indústria têxtil portuguesa”.
“A Inditex não irá abandonar nunca Portugal, porque vai necessitar da produção de proximidade e do conjunto de competências que lhe trazemos, nomeadamente no ‘design’, no desenvolvimento de materiais e na rapidez de resposta. Mas aquela dimensão e intensidade que tinha no passado vai restringir-se por questões de preço”, antecipou.
Segundo a ATP, as exportações do setor têxtil e vestuário português para Espanha terminaram 2017 com uma quebra de 3,9% (ou 68 milhões de euros), para perto de 1.700 milhões de euros, mas aquele país continua a liderar o ‘ranking’ dos principais destinos, com uma quota de 31,9% (em 2016 este peso chegou aos 34%).
De acordo com Paulo Vaz, as exportações do setor para a região espanhola da Galiza – onde está sedeada a Inditex – rondarão os 850 milhões de euros, dos quais “55% a 60%” resultarão de encomendas feitas por aquele grupo em Portugal.
“A nossa conclusão – que é empírica, de feeling quase, mas que não deve estar muito longe da realidade – é que a quota de Espanha [nas exportações têxteis portuguesas] vem caindo essencialmente por causa de um cliente que tem um peso particularmente grande, que é a Inditex, e que mudou a sua política de compras por razões que têm a ver com as mudanças que está a tentar imprimir ao seu modelo de negócio”, explicou.
Segundo o dirigente associativo, “a Inditex está claramente à procura de margem”, optando por “quem lhe produza mais barato”, o que a tem levado a transferir encomendas de Portugal para outros mercados também de proximidade, como Marrocos ou a Turquia.
“Agora o que normalmente acontece é que quando se procura preço desce-se na qualidade”, avisou, notando que “a Inditex está a começar a ter algumas dificuldades nas vendas nos mercados mais clássicos e tradicionais, que são essencialmente os mercados dos países desenvolvidos, nomeadamente da Europa”.
“As informações que tenho é que se calhar as vendas não estão a correr tão bem como no passado e que o crescimento é feito com a abertura de novas lojas noutras geografias. A verdade é que as vendas e as margens que [a Inditex] tinha há alguns anos já não são as mesmas e eles andam atrás disso mesmo”, sustenta.
Se calhar as vendas não estão a correr tão bem como no passado e que o crescimento é feito com a abertura de novas lojas noutras geografias.
Na sua opinião, esta situação resulta de “mudanças estruturais no ato de comprar” que têm levado a uma contração do consumo de moda: “As novas gerações querem mais a experiência do que o património, gastam mais dinheiro em viagens, espetáculos, bem-estar e cultura e menos em roupa ou automóveis”, explicou.
Convicto que “de hoje para amanhã a moda vai ter que ser repensada”, Paulo Vaz admite que “isto poderá não estar ainda a ser bem compreendido pela maioria das marcas, que estão à procura de uma reorientação”.
No caso da Inditex, a este cenário acresce o facto de, ao estar atualmente cotado em bolsa, o grupo ter “que satisfazer já não apenas o acionista família Ortega [fundadora da empresa], mas um conjunto de acionistas que querem dividendos das suas ações”: “Isto implica uma grande pressão que tem de ser respondida de uma outra maneira, diferente da de há cinco ou dez anos”, sustentou.
Para o diretor geral da ATP, a evolução do setor poderá levar a que, no horizonte de uma década, a quota de Espanha nas exportações do têxtil e vestuário português recue para os 25% ou 26%, embora “mantendo os mesmos valores absolutos”, crescendo as vendas da fileira para mercados que têm evoluído muito positivamente, como a Itália, Holanda, China ou os EUA.
“A grande questão é que as empresas aprendam de vez a lição de nunca ficarem com excesso de dependência relativamente a um cliente ou a um mercado em particular. Mais uma vez, a história repetiu-se com algumas delas, sobretudo as mais pequenas, que tiveram de encerrar, mas a minha convicção é que não é isso que vai afetar de uma forma violenta, ou pelo menos dramática, um setor que hoje em dia tem outros argumentos, alternativas e mercados e outra forma de reagir na procura de outros clientes”, considera.
A grande questão é que as empresas aprendam de vez a lição de nunca ficarem com excesso de dependência relativamente a um cliente ou a um mercado em particular. Mais uma vez, a história repetiu-se com algumas delas.
Quanto às exportações para Espanha, Paulo Vaz acredita que “têm ainda potencial para crescer”, até porque este mercado “está a ser berço de um conjunto de novas marcas muito orientadas para a sustentabilidade”, em oposição ao “excesso de homogeneização que se encontrou em modelos de ‘fast fashion’ como a Inditex”.
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