Governo diz que suspensão de diploma de terras sem dono pela AR inviabiliza reforma florestal
O executivo de António Costa diz que a suspensão por dez anos do decreto de lei das terras sem dono põe em causa a reforma da floresta e apelou, em particular ao PSD, que reconsidere votação.
O Governo defendeu esta terça-feira que a suspensão por dez anos do decreto de lei das terras sem dono põe em causa a reforma da floresta e apelou, em particular ao PSD, que reconsidere a votação indiciária de sexta-feira.
Em causa está a aprovação pela Assembleia da República de uma proposta do PCP, apoiada pelo PSD e pelo BE, no âmbito do grupo de trabalho do cadastro simplificado, que suspende, por dez anos, o decreto de lei do Governo que estabelece que as terras sem dono conhecido possam, ao fim de 15 anos, reverter para o Estado.
“Em nome do interesse nacional, e uma vez que a votação final ainda não ocorreu, o Governo gostaria de publicamente manifestar, e temo-lo feito já por outras vias institucionais, que estamos disponíveis para prestar todos os esclarecimentos e encetar todo o diálogo com os partidos da oposição, e com o PSD, em particular, por forma a que a decisão final possa ser uma decisão que viabilize esta proposta”, apelou o ministro da Agricultura.
Capoulas Santos falava numa conferência de imprensa na presidência do Conselho de Ministros, ao lado do ministro Adjunto e da Economia, Pedro Siza Vieira, convocada devido à aprovação de uma moratória de dez anos ao decreto de lei das terras sem dono conhecido, em votações indiciárias realizadas no grupo de trabalho do cadastro simplificado.
As votações ainda terão de ir à comissão parlamentar respetiva para ratificação e, depois disso, decorre a votação final global pelo plenário do parlamento.
“Aquilo que nos deixou surpreendidos foi a criação de uma maioria parlamentar que se prepara para inviabilizar este diploma, que, naturalmente, causará sérios problemas, uma vez que se for aprovado tal como consta da proposta, durante 10 anos este diploma ficará sem efeito”, sustentou Capoulas Santos.
O ministro Adjunto e da Economia, Pedro Siza Vieira, salientou por seu lado que o Governo está disponível para reunir e prestar todos os esclarecimentos aos partidos que aprovaram aquela suspensão, sublinhando que “não há plano B” para resolver o problema criado com aquela medida.
O ministro da Agricultura frisou que, na prática, a aprovação daquela suspensão “quer dizer que, durante dez anos, ficarão ao abandono um número indeterminado de propriedades, que se admite que sejam umas dezenas ou até centenas de milhar de hectares”.
“Continuarão ao abandono, como têm estado, sem nenhum tipo de exploração, acumulando combustível e constituindo um fator adicional de risco para os incêndios e sem que produzam qualquer riqueza ou serviço ambiental”, declarou Capoulas Santos.
Os deputados aprovaram na sexta-feira, em grupo de trabalho, o alargamento a todo o país do projeto-piloto do sistema de informação cadastral simplificada, que foi criado em novembro 2017 e, ao longo de 12 meses, permitiu georreferenciar 51,3% da área total dos 10 municípios envolvidos.
Além da aprovação genérica da proposta de lei do Governo, foram aprovadas propostas de alteração dos partidos, entre as quais, uma proposta do PCP para a suspensão do decreto 15/2019, que estabelece o “registo provisório de aquisição a favor do Estado” de terrenos que receberam a designação de “sem dono conhecido”, a sua atribuição da gestão à Empresa de Gestão e Desenvolvimento Florestal, S. A., Florestgal, e a “possibilidade de registo de aquisição definitivo a favor do Estado e integração no património privado do Estado, após o período de 15 anos”.
De acordo com o ministro Adjunto e da Economia, “todo o objetivo da reforma florestal que o Governo tem levado a cabo é assegurar, por um lado, a melhor gestão da floresta, que é uma fonte de riqueza, mas também tornar a floresta mais resistente ao risco de incêndio”.
Siza Vieira considera que o decreto-lei 15/2019 é uma peça “essencial” deste objetivo: “Não podemos encorajar proprietários a investir na floresta se, ao lado, há terrenos que não são tratados, não são bem geridos, e, portanto, estamos convencidos que este é um decreto-lei e um regime que interessa a todo o país e que não deve ser encarado como uma questão meramente de luta político-partidária”.
“Por isso, fazemos este apelo aos diversos partidos: estamos pessoalmente disponíveis para discutir aquilo que é o alcance do decreto-lei do Governo, estamos disponíveis para reunir, prestar esclarecimentos e, até, eventualmente, dissipar dúvidas e acautelar por todas as formas as preocupações que os partidos possam ter, mas não devemos adiar por mais 10 anos a reforma da floresta”, apelou.
Questionado pelos jornalistas, coube ao ministro da Agricultura rebater a argumentação dos partidos, designadamente da deputada do PSD Emília Cerqueira, que disse à Lusa na sexta-feira existirem “uma série de instrumentos para se fazer a gestão de terrenos sem dono”, sendo que “já tinha sido aliás prevista a bolsa de terras no governo anterior”.
Capoulas Santos argumentou que o banco de terras aprovado no Governo anterior foi revogado e, “enquanto existiu, não identificou um único prédio rústico”, revelando-se “totalmente ineficaz”.
Quanto aos receios de PCP e BE, o ministro da Agricultura disse que “não é crível” que o decreto-lei do Governo resulte nas preocupações daqueles partidos, que, acrescentou, “vão no sentido de que sejam esbulhados de património os pequenos produtores”.
Capoulas Santos sublinhou que o Estado assume a gestão das terras, sem prejuízo de o legítimo proprietário ser identificado durante um período de 15 anos e ser-lhe restituído o terreno.
“Sobre a hipotética decisão de, em 15 anos, um Governo decida vender a privados, é especulação”, afirmou, sublinhando que, em Portugal, o Estado é proprietário de apenas 3% da propriedade florestal.
Municípios querem políticas públicas para que terras abandonadas sejam aproveitadas
O presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), Manuel Machado, defendeu esta terça-feora, em Coimbra, a criação de políticas públicas que estimulem a economia no território para que as terras abandonadas possam ser aproveitadas.
“A nosso ver, é necessário criar políticas públicas que induzam a economia no território, de modo a que as terras que são abandonadas possam ser aproveitadas”, afirmou hoje Manuel Machado, que falava aos jornalistas, em Coimbra, depois de ter participado numa reunião do Conselho Diretivo da ANMP.
“Há situações em que os donos [de terras] não sabem que são donos ou não têm condições para tomar conta da gestão das suas propriedades”, sublinhou Manuel Machado, considerando que o projeto de lei que se encontra em debate na Assembleia da República (AR) é um avanço importante”.
O presidente da ANMP apela “a todos os partidos políticos presentes na AR que observem o problema [das terras abandonadas] sob este ponto de vista, que é o de se poder dar, desta forma, um contributo para a segurança e proteção civil das comunidades”.
“As terras são bens importantes, é útil que sejam produtivas e não podem ficar abandonadas”, particularmente em épocas do ano como o início do verão, apesar do “conjunto de dispositivos legais desencadeados” para evitar e combater os fogos florestais, sustentou.
“A tomada de posse pelo Estado das terras abandonadas é, a nosso ver, uma questão muito, muito importante”, insistiu o presidente da ANMP, que também preside à Câmara de Coimbra. “Não estão em causa os baldios”, porque estas terras “têm uma gestão própria, têm uma entidade própria, protegida por lei” e devem continuar “como tem sido até aqui”.
Mas “há outras terras, muitos hectares, milhares e milhares de hectares de terras que estão abandonadas”, por motivos que “são conhecidos” e cuja situação carece de medidas para ser ultrapassada, frisou Manuel Machado.
Durante a sua reunião, a direção da Associação de Municípios também analisou o projeto de decreto-lei para “estabelecer um regime jurídico de produção de água, a partir do tratamento de águas residuais, destinada à reutilização em diversos usos”, como, por exemplo, na rega, designadamente de jardins públicos, ou as limpezas urbanas e industriais.
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