Reunião com motoristas para debater serviços mínimos demorou sete horas. Porquê? Ensaiou-se uma mediação
Reunião entre Antram e SNMMP para definir serviços mínimos demorou sete horas. As partes estavam em desacordo, é certo, mas demora não surgiu só dos mínimos, antes de uma espécie de ensaio à mediação.
Seja pela quantidade de representantes externos às entidades privadas em conflito, seja pelos debates laterais, interrupções para conversas um-a-um, ou por simples intervalos, uma reunião que se previa mais célere que as que têm marcado a novela dos motoristas acabou por não fugir à regra, prolongando-se por longas horas. Mas houve um ponto “fora da agenda” que também ajudou ao “atraso”: a primeira parte da reunião serviu para ensaiar uma espécie de mediação que, mesmo não tendo resultado em acordo, a julgar pelas trocas de elogios finais pode ter sido mais um passo no longo caminho para levar a discussão entre Antram e sindicato para a via negocial.
A greve convocada pelo Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) para decorrer entre 7 e 22 de setembro levou esta segunda-feira ao Ministério do Trabalho representantes da Antram e do sindicato para debater e apresentar as diferentes visões sobre os serviços mínimos a decretar durante a paralisação — que será em moldes bastante distintos das anteriores, já que visa apenas o trabalho acima das 8 horas em dias úteis e a todo o trabalho aos fins de semana.
Talvez por o sindicato ter optado por reduzir o tom de agressividade da greve face às de abril e início de agosto, talvez pela abertura constantemente veiculada pela Antram nas últimas semanas e pela perceção da real dimensão das propostas que já se encontram nas mãos de outros sindicatos, a reunião também terá servido para aproximar um pouco mais patrões e trabalhadores. Ideia que se retira não só pela texto final da ata desta reunião, a que o ECO teve acesso, mas também pelas declarações públicas de sindicato e Antram no final da mesma. O caminho até à mediação estará gradualmente a ser percorrido.
Foi quase por aqui que arrancou o encontro de segunda-feira. Contando com “vários representantes na qualidade de observadores” dos ministérios das Infraestruturas, Ambiente, Mar e Saúde, além dos nomeados pela Associação Nacional de Revendedores de Combustíveis (Anarec) e pela Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas (Apetro), a quem o aviso prévio da greve também foi dirigido, a reunião começou pelo esclarecimento do âmbito temporal da greve, com o sindicato a confirmar que a greve é “a todo o trabalho aos sábados, domingos e feriados, e ainda àquele que excede as oito horas de trabalho nos dias úteis, não se incluindo aqui os intervalos para refeição”.
Aproveitando este esclarecimento, a Antram saudou a entrevista recente de Francisco São Bento, presidente do SNMMP, onde deu a entender alguma abertura para a via negocial ser finalmente prosseguida. E estendeu novamente o convite “para juntarem-se numa mesa negocial”.
Aproximação e uma amostra de mediação
Com a ideia da mediação colocada de novo em cima da mesa pela Antram logo na fase inicial da reunião dos serviços mínimos, as partes conseguiram aproveitar o encontro patrocinado pelo Ministério do Trabalho para recuperar a discussão — inconclusiva — tida no Ministério das Infraestruturas, há pouco mais de uma semana — que resultou num insucesso depois de o sindicato ter tentado impor parte dos resultados finais da mediação como condição para aceitar a mesma.
Em resposta ao convite da Antram, o sindicato salientou “que as partes estão a avançar“, deixando votos “que seja dada primazia ao diálogo de forma a evitar a crispação a que se assistiu no passado”. Mas fechando o passado e olhando para o futuro, o SNMMP esclareceu os presentes que agora “pretende que seja feita uma análise das questões que afastaram as partes, das questões que as poderão aproximar, bem como uma análise do alcance jurídico de algumas questões”, segundo relata a ata.
Desta forma, o que parecia insanável à saída da reunião no MIH, estará agora dependente de análises em maior detalhe de algumas “questões”, até porque a abertura da Antram mantém-se e foi repetidamente veiculada ao longo da reunião de segunda-feira: “Não obstante o que possa separar as partes”, a associação convidou “o sindicato a seguir para a mediação de forma a discutirem o que o sindicato entender por pertinente”.
A conciliadora do Ministério do Trabalho aproveitou então para questionar o sindicato sobre quais os pontos em que têm dúvidas. O SNMMP deu um único exemplo — o que está a ser discutido relativamente ao período temporal que permite calcular a média de 48 horas semanais que podem ser exigidos aos motoristas –, com a Antram a responder que “os aludidos trabalhos de negociação” com outras estruturas sindicais “ainda estão a decorrer pelo que essa temática ainda está a ser trabalhada”.
Apesar de não se terem registado avanços práticos, a questão levantada pelo SNMMP e suscitada pela conciliadora do MTSSS, pode ser vista como o sindicato a focar-se em questões mais concretas e que ainda estão em curso para a revisão do contrato coletivo, e também como uma amostra daquilo que o SNMMP tem a ganhar se regressar à negociação, deixando cair a greve: se a preocupação do sindicato se prende com o desenho final de uma cláusula (ou mais) ainda em discussão, a única forma de fazer propostas sobre as mesmas passa pela negociação oficial. É de notar também que de acordo com a ata oficial da reunião, as duas exigências apresentadas pelo SNMMP no MIH não foram diretamente abordadas.
Apesar de nenhum dos lados ter insistido em demasia no tema, o que fica claro da ata da reunião de segunda-feira é que se experimentou o caminho de um entendimento que levasse à desconvocação da greve, ainda que sem “atritos” nem insistências em demasia. Houve uma aproximação, houve uma amostra do que seria negociado em caso de mediação, mas “não sendo possível chegar a um entendimento que pudesse levar à retirada do aviso prévio de greve”, as partes decidiram então discutir o que as tinha ali levado: os serviços mínimos.
Viajemos agora até ao fim da reunião. Mesmo ao cabo de várias horas reunidos, o tom conciliador foi dominante nas intervenções públicas do presidente do SNMMP e da Antram. Francisco São Bento enalteceu o “reatar de relações entre as partes”, sublinhando que “passo a passo, tudo é possível”, tanto que “futuramente prevemos que dará bons frutos”, arriscou mesmo. Já André Matias de Almeida, representante da Antram, sublinhou que patrões e motoristas “caminham no sentido de um entendimento”, ainda que lembrando que a Antram só negoceia sem greves no horizonte.
Lentamente, sindicato e associação têm-se aproximado de umas tréguas que abram espaço à negociação, restando agora saber se estas chegarão a tempo de evitar a greve de 7 a 22 de setembro — que se inicia num sábado, ou seja, dia de greve a 100% — ou a tempo do sindicato ainda poder ter uma palavra a dizer nos vários pontos ainda em discussão entre Antram, Fectrans e SIMM.
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