Draghi fechou a torneira à Grécia. Lagarde admite reabri-la
Parlamento Europeu recomenda ao BCE que analise possível entrada da dívida grega no programa de compra de ativos. Presidente diz que poderá vir a acontecer se condições no país continuarem a melhorar.
O Banco Central Europeu (BCE) foi a rede de segurança dos países da Zona Euro durante a crise económica e financeira. Como grande comprador de dívida, permitiu aos países da moeda financiarem-se a custos limitados. A todos, menos um. A Grécia ficou de fora do programa de compra de ativos e assim se mantém, mas já se poderá ver o fim dessa exclusão.
O Parlamento Europeu “lamenta que o BCE ainda não tenha incluído as obrigações gregas no programa de compra de dívida pública (PSPP), apesar das melhorias da Grécia em termos de sustentabilidade da dívida e recuperação do acesso ao mercado de capitais”, aponta o relatório do órgão europeu sobre a atuação do BCE, que foi debatido esta terça-feira em Estrasburgo.
A braços com uma crise da dívida soberana, que afetava especialmente Portugal, Irlanda e Grécia, o então presidente do BCE, Mario Draghi, prometeu fazer tudo o que fosse preciso para salvar o euro. A promessa concretizou-se num mega programa de compra de ativos (ou quantitative easing), que começou em 2014 com obrigações hipotecárias, tendo sido alargado a dívida pública em 2015 e dívida privada no ano seguinte.
Se os restantes países pareciam começar a recuperar, a Grécia mantinha-se como foco de risco devido à profunda crise política e revolta social. O italiano reagiu ao agravamento do risco de uma cisão na união monetária com uma injeção de capital maior — 80 mil milhões por mês a partir de abril de 2016 –, mas com uma novidade: a Grécia ficava de fora por não ter rating de qualidade por nenhuma das agências de notação consideradas pelo BCE (nem mesmo a canadiana DBRS que manteve Portugal à tona).
Desde então, muito mudou. A Grécia é um dos países da Zona Euro com maiores cicatrizes da crise e as principais agências de rating continuam a avaliar a dívida grega como “lixo”. Mas o país já regressou ao mercado primário para emitir dívida e, em secundário, os juros das obrigações a dez anos negociaram, esta quarta-feira pela primeira vez, abaixo de 1%.
"Os vários programas de compras públicas do BCE estão sujeitos a critérios de elegibilidade e servem para benefício do Eurossistema todo e todas as pessoas da Zona Euro. Portanto, penso que assim que a Grécia alcançar esses critérios de elegibilidade, tornar-se-á instantaneamente elegível para os programas.”
Neste cenário, o que o Parlamento Europeu quer é que “o BCE justifique porque é que a análise de sustentabilidade das obrigações gregas — um pré-requisito para as obrigações serem incluídas no quantitative easing — ainda não foi conduzida pelo BCE”.
Christine Lagarde admitiu que “se a situação continuar a melhorar”, a dívida grega “poderá vir a ser elegível” também, mas não explicou se a análise em questão já está a ser realizada.
Na primeira reunião de política monetária liderada pela francesa, a 12 de dezembro, o tema já tinha sido abordado. Na altura, Lagarde tinha igualmente elogiado os progressos do país, mas lembrou que há regras a cumprir.
“Os vários programas de compras públicas do BCE estão sujeitos a critérios de elegibilidade e servem para benefício do Eurossistema todo e todas as pessoas da Zona Euro. Portanto, penso que assim que a Grécia alcançar esses critérios de elegibilidade, tornar-se-á instantaneamente elegível para os programas. Até lá, temos de respeitar os critérios e cumprir as regras”, dizia no final do ano passado.
Se uma das decisões pelas quais Draghi é lembrado foi o corte à Grécia, Lagarde poderá assim ser responsável por reabrir a torneira da liquidez.
O início do mandato Lagarde ficou marcado pelo facto de Draghi ter delineado, antes de abandonar o cargo, a estratégia a implementar pela sucessora, cortando a taxa de juros de depósitos e relançando as compras líquidas de dívida numa das últimas reuniões que liderou. Assim, este poderá ser um tema de distinção entre os dois.
O mesmo acontece com a revisão estratégica, que foi lançada em janeiro. É a primeira vez desde 2003 que o banco central faz este exercício, que justifica com alterações estruturais profundas na economia do euro e do mundo como a diminuição do crescimento e da produtividade, o envelhecimento da população, bem como para o legado da crise financeira que levou à adoção de instrumentos de política monetária nunca antes usados.
“O Parlamento Europeu concorda com a presidente do BCE Christine Lagarde que a revisão do enquadramento de política monetária é oportuno e justificado para assegurar que o BCE tem as ferramentas certas para melhorar apoiar as políticas gerais na UE sem prejudicar o objetivo primário de manter a estabilidade de preços”, avaliou Estrasburgo. O organismo europeu aconselhou ainda o BCE a realizar uma consulta pública para envolver mais stakeholders no processo.
(A jornalista viajou a Estrasburgo a convite do Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal)
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