Draghi quer banca a emprestar a custo zero. Porque é que em Portugal se vai cobrar 3%?

Ex-presidente do BCE pede aos bancos para emprestarem dinheiro a custo zero às empresas. Em Portugal, vão ser cobradas taxas de 3% nas linhas de crédito anunciadas pelo Governo. Porquê?

Mario Draghi, antigo presidente do Banco Central Europeu (BCE), deixou esta quinta-feira um apelo aos bancos: “Emprestem dinheiro a custo zero a empresas preparadas para salvar empregos”.

É um pedido de quem liderou o supervisor da banca europeia nos últimos anos e de quem sabe melhor do que ninguém a crise que a Europa se prepara para enfrentar por causa da pandemia do coronavírus. “O custo das garantias não deve ter por base o risco de crédito da empresa, mas deve ser zero, independentemente do custo de financiamento do Governo que as emite”, reforçou o italiano num artigo de opinião publicado no Financial Times.

Apesar do tom sério de Draghi, este é um cenário praticamente impossível em Portugal. Se os empresários quiserem aceder às novas linhas de crédito de três mil milhões de euros que o Governo anunciou há uma semana vão ter de suportar encargos na ordem dos 3% quando forem aos bancos, de acordo com as condições protocoladas.

Em causa estão vários custos que as empresas portuguesas terão necessariamente de assumir: taxas de spread (a margem comercial dos bancos) entre 1% a 1,5%, acrescidas de uma comissão de gestão do processo de crédito de 0,5% e de uma taxa de 1% para a sociedade de garantia mútua.

“3% no momento em que estamos a viver é muito”, admitiu Miguel Maya, presidente do BCP, que fez questão de frisar que o banco cobrará apenas entre 1% e 1,5% aos seus clientes, enquanto 1% diz respeito à garantia.

Em declarações no programa “Negócios da Semana”, da SIC Notícias, adiantou que o BCP “vai fazer uma gestão equilibrada do preço”, tendo em conta “a complexidade do processo e o risco dos clientes”. Mas mais não pode fazer porque o banco também tem de suportar custos, como encargos regulatórios. “Quem é que paga os 47 milhões que o BCP paga ao fundo de resolução?”, lembrou Maya.

Além do risco do cliente, da dimensão do empréstimo e das garantias envolvidas, também custo de funding do banco entra nesta equação. O custo do funding corresponde ao valor que banco paga para se financiar no mercado com o dinheiro que vai depois emprestar aos clientes.

No caso do BCP, esse custo situou-se nos 0,26% em 2019. Ou seja, na prática, se o BCP cobrasse 0% pelos empréstimos como pede Draghi, o banco estaria já a perder dinheiro uma vez que o mercado lhe cobra 0,26%.

No Novo Banco, o custo de funding é mais elevado, na ordem dos 0,43%. “É a partir deste valor que se teria de colocar os 1,2% de custo operativo, o que já dá um custo superior a 1,5%, que é o que está em cima da mesa”, adiantou António Ramalho no mesmo programa.

O presidente do Novo Banco sublinhou que a exigência das autoridades europeias relativamente ao custo da garantia eleva bastante a taxa final. Ainda assim, garante que há agora “um conforto diferente face a 2011”, altura da crise financeira, em que os bancos financiaram as empresas a 8% e 9%, por não haver liquidez disponível no mercado.

Nesse sentido, o presidente do Novo Banco também não acredita que seja o fator preço a dissuadir os empresários de acederem às linhas de crédito, conseguindo assim manter as empresas abertas e protegendo os postos de trabalho.

“Não vão fechar as empresas, pelo contrário. Aquilo que vimos todos os dias nos empresários é uma vontade significativa de colaborarem. Também eles estão muito preocupados nestes tempos em que o volume de receitas desce de uma forma abissal”, disse.

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