Empresas da bolsa podem perder 1,4 mil milhões com o Covid-19
Primeiros efeitos do Covid-19 nos resultados das cotadas da bolsa de Lisboa já se fazem sentir, mas serão muito maiores. Apenas duas empresas deverão ter capacidade para crescer em 2020.
Além dos problemas de saúde pública, o coronavírus prepara-se para causar a pior recessão de que há memória. Com as empresas paralisadas, é inevitável que os negócios sejam afetados. O impacto inicial para as cotadas do PSI-20 será visto já na época de resultados do primeiro trimestre, que já arrancou, mas o buraco no acumulado do ano será muito maior. E pode mesmo ultrapassar os mil milhões de euros.
O cenário menos negativo é que o EBITDA (lucros antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) caia 3,36%, segundo as estimativas do Caixa Banco de Investimento (BI) a que o ECO teve acesso. O banco calculou o impacto em 15 das 18 empresas do PSI-20 (excluindo BCP, Pharol e Novabase).
Com base nestas estimativas, a redução poderá ser de, pelo menos, 417,13 milhões de euros em 2020, face ao total de 12.429,80 milhões de euros arrecadados pelas empresas em análise em 2019. Já o cenário mais pessimista chega a uma quebra de 8,47% no EBITDA, o equivalente a 1.434,67 milhões de euros.
Das empresas analisadas, apenas duas conseguem ficar à tona com uma variação anual de 0% ou até um aumento de 10%. Por outro lado, há sete empresas em que o Caixa BI considera que o impacto do Covid-19 será “significativo”.
Apenas três cotadas deverão sofrer impacto limitado
Preços do petróleo e do papel aumentam risco
A Galp é uma das oito empresas em que o impacto da Covid-19 será significativo. O Caixa BI aponta a elevada dependência dos preços do petróleo, que estão a ser fortemente penalizados, bem como pelas restrições nos transportes. “O impacto nas margens de refinação tende a ser negativo”, dizem os analistas.
A petrolífera liderada por Carlos Gomes da Silva foi a primeira cotada do PSI-20 a apresentar resultados do período entre janeiro e março e esse efeito já é visível. O lucro afundou 72% face ao período homólogo e margem de refinação diminuiu para 1,9 dólares por barril (contra 2,3 no primeiro trimestre de 2019). As refinarias de Matosinhos e de Sines foram paradas.
"Dependente dos preços do petróleo, [a Galp] deverá sofrer com a revisão em baixa da procura. As restrições nos transportes podem afetar os preços. O impacto nas margens de refinação tende a ser negativo.”
O CEO anunciou esperar que o Covid-19 tenha um impacto negativo de mil milhões de euros em CAPEX e OPEX. Além destes, a estimativa do Caixa BI é que o EBITDA da Galp caia entre 10% (menos 238,10 milhões de euros) e 20% (menos 476,20 milhões de euros) face aos 2.381 milhões registado em 2019.
A Galp não é, no entanto, a única cotada exposta à variação dos preços das matérias-primas. Também a Altri e a Navigator estão entre as empresas mais em risco, devido à elevada dependência do desempenho dos preços da pasta de papel, que é, por sua vez, influenciada pelo consumo na China.
"A Sonae fica habitualmente sob holofotes quando diz respeito a uma desaceleração no PIB, sendo que a acumulação de riscos macroeconómicos a nível internacional tendem a ter um impacto severo em economias mais frágeis como Portugal.”
O consumo é outro fator chave para avaliar o impacto da Covid-19 nas cotadas do PSI-20. A atividade Ibersol — responsável por restaurantes de fast food — é “muito influenciada” pelo estado de emergência. As características das retalhistas do índice deixam a Sonae — empresa com maior exposição ao retalho não alimentar e centros comerciais — em maior risco do que a Jerónimo Martins, que tem maior foco no retalho alimentar e maior diversificação geográfica do negócio.
“A Sonae fica habitualmente sob holofotes quando diz respeito a uma desaceleração no PIB, sendo que a acumulação de riscos macroeconómicos a nível internacional tendem a ter um impacto severo em economias mais frágeis como Portugal. A Sonae está muito exposta às dinâmicas de consumo em Portugal e parte do seus ativos têm exposição a consumo discricionário”, alerta o CaixaBank numa outra nota de research.
Os cálculos do Caixa BI apontam uma perda entre 10% (menos 69,5 milhões) e 20% (menos 139 milhões) no EBITDA da dona do Continente, face aos 695 registados em 2019. Já em relação à dona do Pingo Doce, a variação esperada situa-se entre 0% e -10% (104,5 milhões) em relação aos resultados de 1.045 milhões de euros de 2019.
REN e Nos poderão aumentar resultados
A Jerónimo Martins é, assim, uma das três cotadas do PSI-20 em que o impacto deverá ser apenas moderado. Além destas, há ainda outras cinco em que o efeito será limitado, com as utilities a destacarem-se. É o caso da EDP e da EDP Renováveis (cujos resultados deverão cair, no pior cenário, até 10%), mas é a REN a preferida dos analistas.
O Caixa BI estima que o EBITDA se mantenha inalterado em 486,2 milhões de euros ou até cresça 10% até 534,82 milhões. Da mesma forma, o CaixaBank também recomenda a compra de ações das utilities ibéricas, incluindo a portuguesa REN, apontando para fatores como “estabilidade regulatória com crescimento limitado, sólida geração de cash flow e elevados e sustentados dividendos”. Acrescenta que os próximos três a quatro anos serão “um período incomum de elevadas receitas nas redes”.
A elétrica liderada por Rodrigo Costa é, assim, uma das únicas cotadas do PSI-20 que poderão aumentar os resultados. O mesmo acontece com a Nos. O “limitado impacto no negócio de telecom dado que o consumo não deverá sofrer alterações” e “em casos extremos, poderá até espoletar consumo adicional” leva o Caixa BI a estimar que o EBITDA da empresa continue próximos dos 641 milhões de 2019 ou até suba 10% para 705,1 milhões.
"O nosso cenário mais otimista, que é o cenário base, é que a Nos mantenha a estabilidade e consiga atingir um crescimento do EBITDA na ordem de um só dígito. Mas o segmento de audiovisual e cinema é muito cíclico.”
Apesar de concordar no otimismo sobre as telecomunicações, o Credit Suisse é mais conservador, tendo mesmo revisto em baixa a avaliação que faz da Nos. “O nosso cenário mais otimista, que é o cenário base, é que a Nos mantenha a estabilidade e consiga atingir um crescimento do EBITDA na ordem de um só dígito”, diz.
Mas alerta que “o segmento de audiovisual e cinema é muito cíclico — cerca de metade das receitas da Nos vêm de operar a maior cadeia de cinemas em Portugal — e durante o confinamento, todos os cinemas estão fechados. Mesmo depois do fim do confinamento, antecipamos que os clientes deverão demorar a regressar aos cinemas”.
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