Empresários arrasam apoio à retoma progressiva: “É um presente envenenado”
Associações empresariais de vários setores criticam o apoio à retoma progressiva e reclamam o retorno e prolongamento do lay-off simplificado.
O apoio à retoma progressiva é uma medida que não agrada à grande maioria das associações empresariais: “É um presente envenenado”; “o Estado tirou-nos o tapete”; “ainda não há retoma”. Desde o têxtil ao mobiliário, o descontentamento faz-se notar em relação a este mecanismo que veio substituir o lay-off simplificado.
O ECO questionou a Associação Empresarial de Portugal (AEP), a Associação dos Industriais Metalúrgicos (AIMMAP), a Associação Nacional das Indústrias de Vestuário (ANIVEC), a Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP) e a Associação Portuguesa de Calçado Componentes Artigos Pele Sucedâneos (APICCAPS). Todas dão nota negativa a este regime.
O presidente da AEP, Luís Miguel Ribeiro reclama mesmo o retorno e prolongamento do regime de lay-off simplificado “enquanto os efeitos da pandemia se mantiverem” para acautelar a manutenção do emprego. “Ainda não há retoma. Foi um erro acabar com o lay-off simplificado”, diz o responsável. “Este plano de apoio à retoma não foi feliz, não foi bem desenhado e não foi aplicado na altura certa”, destaca o mesmo.
A registar perdas pelo sexto mês consecutivo, o setor do vestuário está preocupado com a sobrevivência do tecido industrial e também está contra o sucedâneo do lay-off simplificado. O presidente da ANIVEC, César Araújo, frisa: “O Estado tirou-nos o tapete. O vestuário é um setor de grande importância para o país e o Estado abandonou-o e desvinculou-se da sua obrigação e desresponsabilizou-se enquanto organismo regulador. O Governo não assumiu a sua função”.
À semelhança do presidente da AEP e da ANIVEC, o presidente da ATP, Mário Jorge Machado, dá nota negativa ao apoio à retoma. “Foi um erro o Governo ter terminado com o lay-off simplificado e não ter ajustado esta medida para a nova realidade do setor industrial“, afirma.
Do outro lado do espetro e apesar do cenário pandémico, nem todos os setores estão a ser afetados da mesma forma e exemplo disso é a metalurgia que já está a dar sinais de recuperação, tendo apenas 2,6% das empresas aderido ao apoio à retoma progressiva.
O vice-presidente da AIMMAP, Rafael Campos Pereira, explica ao ECO que as empresas do setor não têm necessidade de recorrer a este mecanismo: “Nesta fase, a situação atual é um bocadinho melhor e a necessidade de recorrer a esta medida é menor. No nosso caso, existe retoma e como tal não precisamos do plano extraordinário”.
Mas, afinal, o que distingue o apoio à retoma progressiva do lay-off simplificado? O novo regime permite a redução dos horários de trabalho, mas impede a suspensão dos contratos de trabalho, o que era possibilitado no mecanismo anterior. Além disso, o sucedâneo implica maiores custos para os empregadores, não só porque aumenta a fatia do salário que tem de ser garantida aos trabalhadores mas também porque desaparece (total ou parcialmente) a dispensa das contribuições sociais.
Os empresários têm notado que esta nova medida não está adaptada ao momento atual uma vez que obriga ao regresso ao ativo de todos os trabalhadores — ainda que a retoma económica esteja a ser lenta, dizem — ao mesmo tempo que diminui o apoio prestado pelo Estado para a manutenção dos postos de trabalho.
Associações criticam travão aos despedimentos
A adesão ao apoio à retoma progressiva está consideravelmente mais baixa do que tinha sido registado no primeiro mês da versão simplificada do lay-off. Para as associações empresariais, o travão à suspensão dos contratos de trabalho é um dos fatores que explica esse cenário.
“Esta medida do apoio à retoma progressiva é um presente envenenado. Se as empresas não tiverem trabalho, não há mecanismo legal nenhum que permita às empresas reduzir ou suspender o horário de trabalho. O que vai acontecer é que as empresas ao não terem um mecanismo legal vão acabar por ser obrigadas a entrar em insolvência. O Estado aqui desvinculou-se na sua obrigação, não teve a capacidade de sentir o pulsar da sua economia”, adianta o presidente da ANIVEC.
O presidente da ATP acrescenta: “A fraca adesão a este plano de retoma mostra que este sistema foi desenhado ouvindo os partidos políticos e não as associações empresariais. Corremos o risco de perder milhares de postos de trabalho. Isto tudo podia ser minorado”.
Por sua vez, o diretor executivo da APIMA, Gualter Morgado defende que devia existir uma maior flexibilidade por parte do Governo. Caso contrário, “vão morrer empresas por não terem flexibilidade de ajustar os recursos ao trabalho que têm no momento. Os países que têm essa flexibilidade têm melhores empresas e melhores remunerações, refere o responsável.
De notar que, além de ser proibido suspender os contratos de trabalho, também os despedimentos coletivos, por extinção do posto de trabalho ou por inadaptação não são permitidos no âmbito do apoio à retoma progressiva.
O presidente da AEP explica, nesse sentido, ao ECO que devido ao cenário de instabilidade “as empresas não querem aumentar os compromissos como a obrigatoriedade de manter postos de trabalho”. “Quem recorrer a este mecanismo fica comprometido com a manutenção dos postos de trabalho e as empresas não sabem como é que vai ser o dia de amanhã. Estamos numa fase em que o planeamento é uma tarefa quase impossível”, refere o responsável.
A associação do calçado confirma e destaca que a proibição de despedimentos ao aderir ao apoio à retoma progressiva é um entrave. “É um condicionamento forte, mas o que nós sentimos é que, independente dos apoios que possam existir, se o mercado não regressar à normalidade e as empresas não tiverem encomendas, não faz sentido manter os postos de trabalho. Isso será sempre um campo que será sempre afetado”, remata o diretor de comunicação da Apiccaps.
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