Das farmacêuticas à banca, até ao streaming. Quem ganha e perde com a vacina da Covid-19?
Investidores confiam que será possível, a médio prazo, controlar a pandemia, fazendo regressar a vida normal de famílias e empresas. Em bolsa, as reações (positivas e negativas) já se fazem sentir.
Desde o início da pandemia que as bolsas têm negociado ao sabor dos desenvolvimentos do combate ao vírus: caem quando as restrições ameaçam a economia e sobem quando se vislumbram melhorias. Com o consórcio da Pfizer e BioNTech a anunciar que a vacina experimental contra a Covid-19 tem mais de 90% de eficácia, superando largamente as expectativas de muitos especialistas, veio a euforia.
O resultado preliminar dos testes ao fármaco gerou confiança entre os investidores de que a disseminação generalizada da vacina poderá, a médio prazo, fazer regressar a vida normal e, consequentemente, a atividade das empresas. As bolsas europeias viveram o melhor dia desde março, enquanto Wall Street fixou novos máximos. As celebrações continuam, mas nem todas as ações reagem da mesma forma.
Há alguns setores a serem especialmente beneficiados, com o principal a ser especialmente óbvio: as farmacêuticas estão a valorizar, com a Pfizer a ganhar 8% após o anúncio e a contagiar outras empresas a trabalhar em vacinas, como a AstraZeneca, a Moderna ou a Johnson & Johnson. Em simultâneo, setores mais penalizados pela pandemia (cuja atividade poderá começar a recuperar) também seguem em alta. No entanto, há também perdedores, em especial entre os ligados à tecnologia.
Quem ganha com a vacina?
- Turismo e lazer
“Em contraciclo com o que aconteceu em março, a potencial vacina poderia permitir um regresso ao “antigo normal” a médio prazo, o que iria beneficiar as empresas do setor do turismo, como a aviação, os cruzeiros e hotelaria, na medida em que iria haver menores restrições para viajar e voltaria a haver maior fluxo para os diversos destinos turísticos (e não só). Vimos diversas empresas do setor a valorizarem mais de 20%, como foi o caso de duas das maiores empresas de cruzeiros: Carnival Corp e a Royal Caribbean Cruises Ltd”, explica David Silva, analista da corretora Infinox.
- Comércio a retalho
O retalho (excluindo o alimentar) foi também um dos setores penalizado pela pandemia. Apesar de as compras online terem ganho relevância em detrimento da lojas físicas de rua e dos centros comerciais, o consumo afundou. Além das empresas do setor retalhista, também empresas e fundos que detêm centros comerciais e escritórios estiveram em destaque na última e poderão beneficiar do avanço da vacina. Na bolsa de Lisboa, não há representantes diretos de nenhum destes dois setores.
- Petrolíferas
Henrique Tomé, analista da XTB, aponta os fortes ganhos generalizados em termos geográficos devido ao efeito positivo da notícia. Em Portugal, “o PSI-20 acabou por seguir a tendência geral e registou valorizações e com especial atenção para as ações da Galp Energia, que acabou por registar uma performance superior ao índice”, diz, lembrando a valorização de 19% de ontem, que se lembrou na sessão de hoje. “O petróleo beneficia devido às esperanças de, num futuro próximo, os níveis da procurar por esta matéria-prima possam retomar aos níveis pré-pandemia“, explica.
- Banca
Além da petrolífera, também o único representante da banca tem estado em foco no PSI-20. O BCP ganhou 16% na primeira sessão da semana, prosseguindo a tendência desde então, a acompanhar os ganhos da banca europeia. Porquê? “A vacina iria permitir a recuperação de diversos setores da economia, o que consequentemente iria permitir uma recuperação no número de desempregados e que iria levar uma menor pressão sobre o setor financeiro, reduzindo a possibilidade de incumprimento de diversas empresas e famílias (o que neste momento ainda é uma preocupação dos bancos no final do período das moratórias)”, afirma Silva.
Desde agosto que o BCP não valia tanto
E quem poderá perder?
- Plataformas de streaming, vídeo e gaming
Em contraciclo com o que acontece desde março, o setor mais penalizado com o avanço da vacina é o tecnológico. “Não havendo uma necessidade de trabalhar a partir de casa e de novos confinamentos, as famílias e as empresas vão recorrer a menor ritmo a plataformas de conferências online (como a Zoom) e a plataformas de streaming (como a Netflix)“, diz o analista da Infinox, apontando ainda para a área de informática e gaming. “No entanto, acredito que este impacto no setor tecnológico seria algo de curto prazo, pois todos estes setores no meu ponto de vista continuam a ser investimentos de futuro”, sublinha. A Zoom valoriza 470% desde o início do ano, mas perde quase 25% esta semana.
- Big tech
Apesar de o foco estar em cotadas como o Zoom — que toda a gente passou a conhecer durante a pandemia –, também as gigantes tecnológicas estão do lado dos perdedores. Não por deixarem de fazer parte das vidas das pessoas, mas sim por uma questão técnica: foram das mais beneficiadas desde o início da pandemia. “Os principais setores e empresas que se têm distinguido por serem os responsáveis em manter o mercado altista em ambiente de pandemia, acabaram por ser os principais prejudicados”, refere o analista da XTB, apontando para Facebook, Amazon e Tesla (as três acumulam perdas entre 5% e 8% desde o anúncio).
- Ativos-refúgio
Fora das ações, mas em resultado dos movimentos nas bolsas, há ainda a destacar os ativos-refúgio, que — em reação à maior confiança no fim da crise — perdem interesse para os investidores, que ganham maior apetite pelo risco. “Assistimos a uma forte desvalorização dos ativos de refúgio como o ouro e iene japonês, uma vez que as perspetivas para o futuro acabam por se tornar mais animadoras e otimistas para os investidores”, acrescenta Tomé.
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