Comissão Europeia espera “retoma significativa” do turismo no verão. Setor mostra-se cauteloso
A economia portuguesa vai crescer 4,1% este ano, segundo as novas previsões da Comissão Europeia, com a ajuda de uma forte retoma do turismo. O setor confia numa recuperação, mas é cauteloso.
A Comissão Europeia atualizou a sua previsão para a economia portuguesa para um crescimento de 4,1% em 2021, contando com uma “retoma significativa” nos meses de verão. Os peritos estão a contar com a recuperação do turismo nacional, principalmente nas viagens dentro da União Europeia (UE), apesar de avisarem que, otimismo à parte, a atividade do setor continuará abaixo do nível pré-crise, pelo menos até ao final de 2022. Ao ECO, os players do setor dizem confiar num impulso no verão, melhor do que o de 2020, mas são cautelosos a avaliar a intensidade e avisam que poderá só acontecer já na reta final.
Nas previsões de inverno divulgadas esta quinta-feira, a Comissão Europeia dedica parte da sua atenção ao turismo, o qual diz ser muito importante para vários Estados-membros, nomeadamente para Portugal, e um dos setores mais afetados pela pandemia. E assim vai continuar: “A pandemia vai continuar a moldar as perspetivas do setor este ano, tanto diretamente, pelas restrições estatais relativas às viagens não essenciais, como indiretamente, na medida em que os potenciais turistas querem limitar os riscos de saúde até que a imunidade de grupo seja atingida”, diz.
Os players do setor do turismo em Portugal concordam que a incerteza da pandemia continuará a pesar: “Neste momento, ainda é muito difícil estar a prever [a retoma]”, admite José Theotónio, CEO do Grupo Pestana, corroborado por Elmar Derkitsch, diretor-geral do Lisbon Marriott Hotel, que diz que se vê “uma pequena luz ao fundo do túnel, [mas] não sabemos se será a 100%”. No geral, o turismo ainda enfrenta uma “grande dificuldade”, assinala Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP).
Os peritos de Bruxelas não avançam com números concretos para a evolução do turismo em 2021, mas admitem que as viagens de negócios e o turismo urbano continuarão a ser “fortemente afetados”. Para os países mais dependentes do transporte aéreo, como é o caso de Portugal que está numa ponta da Europa, a “incerteza do planeamento” ainda terá um “grande impacto” este ano. No geral, esse fator fará com que as viagens para fora da UE demorem mais tempo a recuperar. Como consequência, dado que os turistas de fora da UE passam, em média, mais dias em viagem, o impacto nas receitas é maior, alerta a Comissão Europeia.
Mas nem tudo é mau. Pela positiva, há a esperança de que a poupança forçada acumulada durante os meses de maior restrição se transforme num “consumo de vingança” (“revenge consumption”), “levando a um verão mais forte do que a época de 2020”. As condicionantes da pandemia poderão conduzir a mais “viagens espontâneas” dentro de portas (isto é, do mesmo país) ou destinos que sejam alcançáveis de carro. Este fator irá beneficiar mais o turismo rural e o das costas (praia).
“É verdade que as pessoas vão procurar mais o interior, mas o ‘sol e praia’ vai ser o produto mais procurado, não tenho dúvidas nenhumas”, antecipa José Theotónio, admitindo que possa haver algumas “operações internacionais” consoante a fase do processo de vacinação. Elmar Derkitsch revela que o Algarve será o melhor exemplo da recuperação no verão, assim como o alojamento local e os hotéis no campo. Quanto à parte empresarial, já não há “muitas esperanças”, dado que as empresas “têm sempre mais receio”, admite o responsável do Marriott, atirando para 2022 uma recuperação dos congressos.
Para o CEO do Grupo Pestana, a “melhoria vai ser gradual e será melhor do que em 2020, mas ainda longe de 2019”. José Theotónio acrescenta que “um verão totalmente perdido não irá ser, mas não vai ser verão normal. Vai ter algumas dificuldades”. A expectativa da cadeia hoteleira é que no segundo trimestre abra “alguma coisa” — o que contrasta com a expectativa anterior do setor de que a Páscoa deste ano fosse um motor da retoma turística, o que já caiu por terra — e o segundo semestre já seja de “maior atividade, ainda com muitos mercados de proximidade”.
Porém, o cumprimento das entregas das vacinas por parte das farmacêuticas será crucial, uma vez que só a vacinação dos grupos prioritários baixará a pressão nos hospitais e, assim, permitirá reduzir o nível de restrições, dando fôlego ao turismo. “Só quando houver imunidade de grupo é que vai haver uma confiança maior de viagens”, antevê o presidente da ALEP. Esse objetivo só deverá ser alcançado já no final do verão — segundo o objetivo do Governo português e da Comissão Europeia –, e se não houver percalços pelo caminho: Daí que os agentes do setor falem numa recuperação mais forte na parte final do verão, já em setembro e outubro.
Mas há um fator desfavorável a Portugal e que não afeta a maior parte dos outros destinos europeus. Com o país nas bocas do mundo no início de 2021 por causa dos níveis máximos de infetados e óbitos, os empresários temem o risco reputacional: “Essa imagem pode, a médio prazo, vir a prejudicar os destinos portugueses perante a concorrência, como os destinos de verão espanhóis, italianos e gregos”, diz José Theotónio, referindo a reação do Reino Unido quando fechou fronteiras a Portugal. Elmar Derkitsch corrobora que “ter dos números mais altos [de infeção] da Europa não ajuda”.
O que aconteceu em 2020? Números mostram queda mais intensa nas grandes cidades
Não há dúvidas de que o segundo trimestre de 2020 foi muito penalizador para o setor do turismo na Europa. Os dados compilados pelo Eurostat e pelo Airbnb (agora utilizados nas estatísticas europeias) mostram isso mesmo, segundo a análise da Comissão Europeia. Porém, “durante a época do verão, o turismo recuperou algum terreno a caminho dos níveis pré-pandemia, mas depois sofreu outro contratempo”, descreve, referindo-se à segunda vaga da pandemia.
Durante este período, houve um padrão que se verificou em toda a UE: as viagens além-fronteiras foram muito mais afetadas do que as deslocações no território nacional. Isso também é visível nos dados do turismo português com os turistas nacionais quase ao mesmo nível de 2019 em alguns meses do verão de 2021. Os números agregados comprovam-no: a queda do turismo doméstico foi quase de 30% enquanto a queda do turismo não residente foi de cerca de 70%.
Como relatado em cima, o turismo urbano — que corresponde a cerca de 60% do total — foi “muito mais afetado” pela crise pandémica, dando o maior contributo para a redução da atividade turística na UE em 2020. “Além de uma possível mudança nas preferências [dos turistas], as cidades foram mais afetadas do que outras regiões devido à sua dependência do turismo de primavera e outono, de viagens de negócios, de viagens curtas e de visitantes de fora da UE”, explicam os peritos da Comissão Europeia.
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