Como é que os indicadores da Covid-19 se aplicam aos pequenos concelhos?
Autarcas de concelhos mais pequenos têm criticado critério de risco da Covid-19 aplicado. Métrica calcula casos por 100 mil habitantes.
O país já se tinha habituado a ter restrições por concelhos, consoante a incidência da Covid-19. Mas, em janeiro, o Governo acabou por decidir decretar um confinamento nacional, ao que se seguiu um plano de desconfinamento também a essa escala. O levantamento de medidas pode, ainda assim, parar nos concelhos mais afetados pela pandemia, sendo que os critérios escolhidos têm sido criticados pelos autarcas dos concelhos mais pequenos. Afinal, como se averigua o risco de transmissão nas regiões de Portugal?
Quando se começou a discutir o plano de desconfinamento, tudo apontava para que as medidas fossem aplicadas regionalmente, tendo sido sinalizado pelos partidos e também por parte das propostas dos especialistas nas reuniões do Infarmed. No entanto, o Governo acabou por apresentar um plano a nível nacional, admitindo apenas que poderia numa segunda fase avançar por regiões.
Foi desenhada uma “bússola” para seguir a evolução da pandemia, que conjugava a incidência e o risco de transmissão do coronavírus, e determinar se seria possível avançar com o levantamento das restrições. Antes da Páscoa, quando o primeiro-ministro confirmou que se poderia avançar para a segunda fase do desconfinamento, foi revelado que existiam 19 concelhos em risco de puxar o travão no plano.
“Como anunciámos há 15 dias, esta situação deve ter em conta a situação diferenciada no conjunto do país. Devemos ter em conta que se em duas avaliações sucessivas os mesmos concelhos estiverem acima do limiar de risco, não devem avançar as medidas de desconfinamento”, explicou António Costa, na altura. O limiar é uma incidência de 120 casos por 100 mil habitantes.
Mas este limite não é consensual. Os autarcas de alguns destes concelhos insurgem-se contra os critérios definidos, por prejudicarem as regiões mais pequenas. É o caso do presidente da Câmara Municipal de Barrancos, que defende que a fórmula que tem de existir para avaliar a situação da pandemia “deverá ser analisada profundamente quando se trata de concelhos com esta demografia”, em declarações à TSF.
Já o presidente da Câmara Municipal do Alandroal aponta que “alguns concelhos correm o risco de ficar para trás neste processo”, à TVI24. “Se calhar valia a pena refletirmos se é preciso conjugar algum outro critério, por exemplo a densidade populacional”, sugeriu João Grilo. Os números atuais da região devem-se a um surto localizado, sendo que “bastam 12 ou 14 casos para que o concelho se mantenha num nível de risco que impede a próxima fase do desconfinamento”, lamentou o autarca.
Como é que isto é possível? Ora, na nota metodológica do boletim da DGS, é definido que “a Incidência Cumulativa a 14 dias de infeção por SARS-CoV-2/Covid-19 corresponde ao quociente entre o número de novos casos confirmados nos 14 dias anteriores ao momento de análise e a população residente estimada, por concelho, a 31 de dezembro de 2019, pelo Instituto Nacional de Estatística”.
Este indicador é expresso em número de casos por 100 mil habitantes. A DGS dá o exemplo: se “nos 14 dias anteriores ao dia de análise, 50 casos de infeção por SARS-CoV-2/Covid-19 foram atribuídos a um determinado concelho, com uma população residente de 150 mil habitantes”, a incidência cumulativa a 14 dias será de 33,3 casos por 100 mil habitantes.
Desta forma, basta existirem quatro casos num concelho com três mil habitantes ou sete casos num concelho com cinco mil habitantes para se ultrapassar uma incidência de 120 casos por 100 mil habitantes. Em Barrancos, por exemplo, dois casos fazem o concelho que tem cerca de 1.630 residentes superar o limiar. Para além disso, surtos localizados nos municípios são suficientes para fazer disparar a incidência e colocar o concelho no limite de risco.
Segundo os dados do INE referentes a 2018, existem 14 concelhos em Portugal com menos de 3.000 habitantes (o mais pequeno é mesmo o Corvo, onde residem cerca de 465 pessoas). Há 14 concelhos cuja população residente se situa entre os 3.000 e os 4.000, e 15 entre os 4.000 e os 5.000 habitantes.
De recordar que quando se colocavam restrições por concelhos, antes deste confinamento, iniciado em meados de janeiro, aquelas mais restritas (como a proibição de circular entre concelhos e o recolher às 13h ao fim de semana) eram aplicadas nos concelhos com mais de 240 casos por 100 mil habitantes.
Governo avança com “testagem massiva”
As avaliações do Governo para as medidas ocorrem de 15 em 15 dias. Já os dados da Direção Geral de Saúde sobre os concelhos são divulgados à segunda-feira. Esta semana, o boletim revelou que há 26 concelhos com incidências da Covid-19 superiores a 120 casos (número que inclui os municípios das regiões autónomas), com os 19 concelhos mencionados por Costa ainda na lista.
O primeiro-ministro reuniu-se com autarcas dos concelhos do continente com uma maior incidência: Alandroal, Carregal do Sal, Moura, Odemira, Portimão, Ribeira de Pena e Rio Maior, que contam com mais de 240 casos por 100 mil habitantes. Depois do encontro, Costa anunciou que vai avançar a “testagem massiva” nas localidades onde a incidência é maior, de forma a identificar casos de infeção, sobretudo de pessoas que estejam assintomáticas.
O primeiro-ministro explicou também que as regiões onde a incidência da doença continua elevada têm “um padrão comum”: “Na generalidade dos casos, trata-se de surtos com origem em situações em que há concentração de pessoas em habitação precária, temporária, associada a obras públicas, ou a colheitas, ou a unidades industriais que recorrem também à habitação local.” Será por isso também reforçada a fiscalização do trabalho.
Para os concelhos não é considerado o índice de transmissibilidade do vírus (quantas pessoas um infetado contagia), que está contemplado nos critérios nacionais. Atualmente, o Rt é de 0,98 a nível nacional e é de 1 no continente.
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