Investidores compram herdade no Alentejo para os vinhos Terra d’Alter
A Herdade das Antas passa para as mãos de quatro dos acionistas da Ímpar, que negociaram com o Novobanco o património da empresa de vinhos criada por José Roquette, António Borges e Peter Bright.
Um grupo de acionistas da Ímpar Wines – Pedro Paixão, Michael Ullmann, Gareth Pearce e Helga Kronheim – acaba de comprar a Sociedade Agrícola da Herdade das Antas, uma propriedade com 159 hectares (42 são vinha) no concelho de Fronteira, que pertencia ao médico José Roquette, atual presidente do conselho clínico superior da Luz Saúde, e que estava a ser alvo de um processo executivo por dívidas à banca.
Pedro Paixão, CEO da empresa que em março de 2021 ficou com a adega, as marcas e o stock de vinhos da Terra D’Alter – criada em 2004 pelo cirurgião cardiotorácico, pelo falecido economista António Borges (ex-Goldman Sachs) e pelo enólogo australiano Peter Bright –, conta ao ECO que a escritura foi realizada a 11 de janeiro e que a aquisição da herdade no distrito de Portalegre, que já fornecia as uvas para a produção deste vinho alentejano, rondou os 2,3 milhões de euros.
“Foi uma compra oportunística [sic]. Na prática, soubemos que a empresa estava num processo complicado. Fomos à banca, parámos o processo executivo, pagámos aos bancos e ficámos com a propriedade. Sempre com o envolvimento do anterior proprietário, o Prof. José Roquette. Não foi um takeover hostil”, relata o gestor, que cinco investidores britânicos e israelitas foram recrutar à administração da Ségur Estates (dona da Encostas de Estremoz e da antiga Roquevale) para concretizar a compra da Terra d’Alter.
Este bloco de acionistas – Michael Ullmann, Gareth Pearce, Torquil McAlpine, Andy Phillipps e Helga Kronheim – detêm 82% da Ímpar – Vinhas & Vinhos, a sociedade que há cerca de um ano ficou com o património da Terras de Alter, Companhia de Vinhos Lda., comprando ao Novobanco um crédito à volta de quatro milhões por 1,263 milhões de euros. Os restantes 18% estão divididos entre o CEO Pedro Paixão, o enólogo Peter Bright e a viúva (Isabel) e os dois filhos (Gonçalo e Sofia) de António Borges. Que no INSEAD tinha sido colega de Michael Ullmann, que tem uma casa de férias no Algarve e decidiu investir na empresa de vinhos após saber da situação difícil em que se encontrava.
Nesta que é a primeira incursão no mundo dos vinhos – têm outros projetos juntos, desde padarias até ao turismo de luxo na área da caça –, os novos acionistas ficaram com a adega instalada na Zona Industrial de Fronteira, construída em 2008 e onde sempre foram feitos os vinhos Terra d’Alter. E assinaram contratos de offtake válidos por dez anos com duas sociedades agrícolas, obrigando-as a vender a totalidade das uvas: a Herdade do Monte Barrão (Alter do Chão) que se mantém na família de António Borges; e esta Herdade das Antas, que dista quatro quilómetros da adega.
“Comprámos, essencialmente, para garantir que continuávamos a ter acesso à uva. Porque no âmbito do processo executivo, quem ficasse com a propriedade ficava desobrigado de nos vender. Tínhamos de fazer alguma coisa. Além disso precisávamos de um front office porque a adega é topo de gama sob o ponto de vista tecnológico, mas não deixa de ser um pavilhão industrial. Neste negócio do vinho – ainda mais no segmento em que estamos – é preciso uma montra para receber os clientes. É muito emocional. A pessoa quer ver uma casa, tocar nas uvas, dormir no meio da vinha”, justifica Pedro Paixão.
Comprámos para garantir que continuávamos a ter acesso à uva. Além disso, precisávamos de um front office porque a adega é topo de gama sob o ponto de vista tecnológico, mas não deixa de ser um pavilhão industrial.
Ora, além de “potenciar a produção das vinhas, pela qualidade e pela quantidade”, a Ímpar Wines vai criar um projeto de enoturismo neste monte alentejano, a avançar ainda este ano e com data de conclusão prevista para o último trimestre de 2023, transformando o espaço ocupado pela casa, que soma perto de 350 metros quadrados, numa unidade com oito suítes, espaço para provas e salas de estar e de jantar. E aproveitando a particularidade de esta propriedade ser “muito rica em termos arqueológicos”, está a trabalhar com a Universidade de Évora no desenvolvimento de um “roteiro enoarqueológico”, baseado na Herdade das Antas.
Do abandono das promoções à entrada asiática
Quando Pedro Paixão voltou à Terra d’Alter na primavera de 2021, depois de ter sido diretor comercial da anterior proprietária entre 2014 e 2017, além do problema do peso da dívida financeira, identificou uma “ausência de capacidade comercial”. A marca perdera a característica exportadora evidenciada desde o início do projeto e começara a “trabalhar nas promoções dos hipermercados nacionais porque era preciso fazer tesouraria”. Daí que a primeira decisão tenha sido acabar com os três vinhos de entrada de gama – branco, tinto e rosé – que estavam nas prateleiras do Pingo Doce e do Continente a 3,99 euros, e “passar a vender só do patamar médio para cima”.
Da reformulação do portefólio resultaram novas gamas: Expressão (vinhos de lote) com um preço de venda ao público (PVP) de 6,5 euros; Origens (monovarietais) com PVP entre 9 e 10 euros; Tradição (reservas) a 14 euros por garrafa; e uma categoria de vinhos premium, com um preço superior, que conta já com quatro “projetos especiais”. O ano de 2021 fechou com uma faturação de 1,5 milhões de euros e um preço médio à saída da adega a bater os 3,90 euros por garrafa, que compara com os 2,22 euros que registava neste indicador no ano anterior.
Embora se tenha criado o mito que os restaurantes não gostam de vender marcas que estão nos supermercados e vice-versa. Ando nisto há tempo suficiente para saber que não é exatamente assim. Dá é mais trabalho.
“Estamos no canal Horeca – nos restaurantes e nas garrafeiras – e também no offtrade: na Jerónimo Martins, na Sonae e vamos entrar no Lidl no final de fevereiro. Não temos medo. Achamos que as marcas se constroem nos dois sítios, muito embora se tenha criado o mito que os restaurantes não gostam de vender marcas que estão nos supermercados e vice-versa. Ando nisto há tempo suficiente para saber que não é exatamente assim. Dá é mais trabalho”, sustenta o CEO.
No ano passado, mais de 80% das vendas foram feitas nos mercados internacionais. Suíça, Noruega e Países Baixos são as três geografias que ocupam o pódio, valendo quase seis em cada dez euros faturados no exterior. O plano desenhado pela administração prevê o crescimento nos EUA e no Brasil, e, assim que as regras das quarentenas obrigatórias forem flexibilizadas, a entrada em vários países asiáticos, como a Coreia do Sul, Japão, Tailândia e Vietname.
Nas metas a atingir até 2026, a Ímpar Wines, que emprega atualmente 16 pessoas, inscreveu um volume de negócios entre 4,5 e 5 milhões de euros, com um EBITDA de 30% e vendas anuais de 800 mil garrafas de vinho Terra d’Alter, com um preço médio à saída da adega a rondar os 4,5 euros. Sobre a hipótese de entrar noutras regiões portuguesas, Pedro Paixão garantiu ao ECO que pretendem “continuar a ser uma empresa de vinhos do Alentejo, não obstante não [fecharem] a porta a olhar para outras regiões, desde que [consigam] controlar a vitivinicultura”.
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