Como as fotos de Macron se transformaram num “meme”
Fotos do Presidente francês, numa altura em que joga a sua reeleição e que decorre uma guerra na Europa, dão que falar nas redes sociais.
Calças de ganga e camisola de capuz, barba de dias, olheiras, numa colagem à imagem do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. Expressões de desilusão e cansaço alegadamente após um telefonema em que, do outro lado da linha, estaria Vladimir Putin. As fotos de Emmanuel Macron tornaram-se virais nas redes sociais a um mês da corrida ao Palácio do Eliseu. A estratégia de comunicação do Presidente francês, em que joga a reeleição, teve uma falsa partida?
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“Quando ela te deixa pendurado”, lê-se numa publicação do Twitter; “Eu quando exagero para ficar triste à frente dos meus pais após maus resultados”, escreveu outra publicação. Outros ainda veem neste primeiro conjunto de fotos uma “performance” do Presidente francês, como se dissesse: “Tira uma deste ângulo. Tira uma sem o relógio também”.
Estas fotografias aparentam ter começado a circular no dia 8 de março. Na publicação acima, lê-se: “O Palácio do Eliseu divulgou imagens do Presidente francês Macron após o seu telefonema de hoje com Putin, a respeito da invasão da Ucrânia”. Porém, um fact-checking da Reuters conclui que nenhuma das fotos mostra o chefe de Estado francês após ter falado com o seu homólogo da Rússia, nem foram tiradas no mesmo dia.
Ao ECO, Luís Paixão Martins sublinha que o atual contexto é “importante” para Macron na corrida ao Eliseu. “Com a dramática incerteza que aporta uma guerra na Europa, os eleitores [franceses] sentir-se-ão mais seguros com o valor que conhecem e menos disponíveis para votar no incerto“, disse o consultor de comunicação, que ajudou o PS a chegar à maioria absoluta nas legislativas de 30 de janeiro.
Na verdade, as imagens foram capturadas e publicadas pela fotógrafa oficial da Presidência da República francesa, Soazig de la Moissonnière, na sua conta no Instagram. Aliás, De la Moissonnière tem publicado fotos do Presidente francês quase diariamente. Uma pesquisa pela página da fotógrafa permite rastrear cada retrato de Macron até diferentes datas, antes e depois da invasão russa da Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro.
Por exemplo, a fotografia em que Macron surge de cabeça baixa atrás de uma cadeira foi tirada a 9 de fevereiro e publicada no dia seguinte, retratando-o, segundo a descrição, após o “fim de [uma] reunião e quase [ao] fim do dia”. A 18 de fevereiro, De la Moissonnière capturou Macron sentado e com uma mão na testa durante uma chamada internacional, tal como aconteceu na terceira foto, tirada a 4 de março e publicada um dia depois.
Ou seja, as descrições que acompanhavam estas fotos nas redes sociais eram inexatas. Segundo a agência noticiosa estatal russa Tass, Macron e Putin estabeleceram contacto por 14 vezes desde dezembro, tendo realizado chamadas telefónicas, pelo menos, nos dias 12, 20 e 24 de fevereiro, data do início da invasão russa da Ucrânia, e depois a 3 e 6 de março.
Rita Figueiras, professora de comunicação política na Universidade Católica Portuguesa (UCP), ressalva que as fotografias, os “memes” ou as publicações agora publicados “são interpretados dentro do contexto mais amplo de perceção que os franceses têm de Macron”. Isto é, estes elementos fazem parte de uma “narrativa maior”, pelo que “não devem ser perspetivados isoladamente”, explica a investigadora.
Macron está a tentar vestir-se como Volodymyr Zelensky?
Normalmente, o chefe de Estado francês veste-se de fato e gravata, algo comum à maioria das figuras políticas no ativo. Porém, no passado fim-de-semana, Emmanuel Macron foi fotografado a usar calças de ganga e uma camisola de capuz. Este look tem sido visto como um “truque publicitário” e comparado ao Presidente ucraniano, que desde o início da guerra na Ucrânia trocou o fato por roupa de estilo militar.
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Na passada segunda-feira, dia 14 de março, a fotógrafa oficial de Macron publicou mais uma série de fotografias na sua conta do Instagram, que mostram o Presidente francês a trabalhar no dia anterior (domingo) a partir do seu gabinete no Palácio do Eliseu, em Paris. Nos retratos, Macron está a usar calças de ganga e uma camisola preta de capuz com o logótipo da “CPA 10”, uma unidade das forças especiais da Força Aérea Francesa, enquanto participa noutra ronda de diplomacia internacional com líderes de outros países para encontrar uma solução para a crise da Ucrânia.
Segundo Rita Figueiras, a publicação destas fotos revela “uma liderança em linha” com o que se vê nas contas de (ou com) muitos outros políticos, porque combina eventos institucionais, com trabalho de gabinete e momentos mais descontraídos e pessoais. “Uma espécie de bastidores e como se quem vê tivesse acesso a uma perspetiva de quem está presencialmente em cada uma daquelas circunstâncias”, descreve a professora da UCP.
Ainda que fosse um domingo, trata-se de um conjunto de roupa pouco típico de Macron, que nos seus quase cinco anos como Presidente raramente foi visto em público a usar outra coisa que não fosse camisa branca, fato e uma gravata (normalmente de tons azuis). Nas redes sociais, muitos acusaram o líder francês de tentar copiar o aspeto de guerra do Presidente ucraniano, que desde a invasão russa no mês passado tem aparecido aos meios de comunicação social vestido com casacos, camisolas de capuz e t-shirts de estilo militar, além de uma ligeira barba. “Já não é o diplomata de salão, o engravatado Macron da campanha anterior, mas o diplomata do espaço bélico“, caracteriza Luís Paixão Martins.
A investigadora de comunicação política aponta que a criação de “memes” e de “processos de intenção e oportunismo”, como esta “imitação” de Zelensky, são “comuns” em momentos regulares, mas intensificam-se em período de campanha, tratando-se de conteúdos que se adequam “bem à lógica das redes sociais” e que “captam, igualmente, a atenção dos media“.
Luís Paixão Martins também reconhece aqui “um sentido de oportunidade e de circunstância” de Macron, recordando ainda que este é simultaneamente Presidente por seis meses do Conselho da União Europeia. Surge como um “combatente da retaguarda”, afirma o consultor de comunicação.
O gabinete do Presidente Macron tinha-se recusado a comentar, mas acabou por dizer que “não é algo de novo que esteja a usar roupa casual ao fim de semana“. “Toda a equipa estava também a usar roupas casuais. Não é ‘uma decisão’ nem uma ‘novidade'”, sublinhou o gabinete, citado pelo The Wall Street Journal.
Além disso, embora o fato seja a marca registada de Macron, as pessoas mais próximas dele dizem que sempre se vestiu de forma casual e cómoda quando não estava de serviço e há muito que tem um gosto para camisolas de capuz, aponta o The Local fr.
Certo é que, a menos de um mês da primeira volta das presidenciais francesas, marcadas para 10 e 24 de abril, Macron está a subir nas sondagens e todos os cenários apontam para a sua reeleição, evidenciando um benefício da atual situação de crise.
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