António Costa Silva, o senhor PRR, é o novo ministro da Economia
No passado já teceu duras críticas a Governos de Costa. Agora fará parte do terceiro Executivo socialista, desta vez com uma maioria absoluta. Terá a tarefa de executar a visão estratégica que fixou.
Aos 70 anos, o ex-gestor da Partex, António Costa e Silva, chega a ministro da Economia, substituindo Pedro Siza Vieira, e conquista a pasta do Mar para este ministério. Conhecido por ser o senhor PRR (Plano de Recuperação e Resiliência, dado que definiu a visão estratégica deste documento, Costa e Silva ganhou protagonismo no início da pandemia pela mão do atual primeiro-ministro, o qual viria a nomeá-lo presidente da comissão de acompanhamento do PRR. Agora será a partir de dentro do Governo que poderá ajudar a executar o PRR e muitas outras políticas que defendeu na praça pública ao longo dos últimos anos.
É o independente que António Costa chamou para salvar a economia que agora sobe efetivamente à pasta em que poderá executar os fundos europeus, em vez de apenas vigiar o PRR como presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento (CNA). Em julho de 2021, António Costa e Silva publicou o livro “Portugal e o Mundo numa Encruzilhada – Para onde vamos no século XXI?” no qual faz um diagnóstico sobre o estado da economia portuguesa e procura soluções para os principais desafios, o que deverá nortear a ação do agora ministro, respaldada por uma maioria absoluta do PS.
Foi uma entrevista televisiva de Costa e Silva e os seus artigos de opinião no início da pandemia que chamaram a atenção a António Costa: convidou-o para um almoço e depois para escrever a visão estratégica do PRR. O ex-gestor da petrolífera Partex, a qual foi dissolvida, e docente do Instituto Superior Técnico tem um vasto conhecimento sobre o setor energético, mas não conseguiu tirar a pasta da Energia ao Ministério do Ambiente, agora liderado por Duarte Cordeiro, para o Ministério da Economia. Recentemente, o próprio foi crítico da opção da União Europeia de desinvestir do gás natural, argumentando que a estratégia deveria ter sido de reforçar a sua produção como fonte de energia de transição.
Mas conseguiu a pasta do Mar, uma área em que também tem bastante conhecimento, tendo defendido a exploração dos recursos marítimos que o país tem. “O mar é um dos grandes ativos e dos grandes recursos que o país tem“, disse, referindo que na versão inicial do PRR não havia dinheiro para o mar, o que viria a mudar. Em fevereiro de 2019, no Público, escreveu um artigo de opinião que “é muito importante que Portugal, onde o mar já representa 3% do PIB, tenha um plano integrador e mobilizador para o futuro capaz de maximizar todo o potencial que existe na sua Zona Económica Exclusiva“.
Apesar da aproximação a Costa, o ex-gestor não tem poupado nas críticas e na pressão ao Governo, nomeadamente relativamente ao desenho final do PRR não ter dado tanta atenção às empresas. Contudo, se até agora podia distanciar-se do desenho final do plano que foi negociado entre o Governo e a Comissão Europeia, agora como ministro da Economia terá de o defender e será “julgado” pelos seus resultados e eventuais atrasos que possam surgir por causa do aumento dos preços, entre outras dificuldades já apontadas atualmente. Dinheiro europeu, entre o PRR, o Portugal 2020 e o Portugal 2030, não faltará.
Licenciado em Engenharia de Minas no Instituto Superior Técnico e mestre em Engenharia de Petróleos no Imperial College of London, António Costa e Silva nasceu a 23 de novembro de 1952 em Angola, na antiga Nova Sintra (atual Catabola), província do Bié. Já trabalhou na Sonangol, na multinacional francesa CGG e no Instituto Francês do Petróleo, mas não se lhe conhece alguma experiência governativa. Ainda há duas semanas, quando questionado na RTP3 sobre se seria ministro, não se comprometeu: “Isso é pura especulação. Só há uma pessoa no país que sabe isso e é o primeiro-ministro. Têm de perguntar a ele. Ganhou claramente as eleições com uma maioria absoluta”, disse.
Já em maio de 2020, quando foi nomeado por Costa para definir a visão estratégica do PRR, tinha afastado esta hipótese: “O meu trabalho é de mero cidadão. É apenas uma tarefa cívica que estou a desempenhar pro bono. Continuo na minha empresa e o resto são especulações sem fundamento”, disse ao ECO, referindo-se à hipótese de suceder a Pedro Siza Vieira.
Defensor de uma combinação virtuosa entre o Estado e as empresas, Costa Silva argumentou diversas vezes como a crise pandémica mostrou a importância da ação do setor público. Mais recentemente, questionado sobre o impacto da guerra, o ex-gestor admitiu a possibilidade de haver uma “fragmentação da economia mundial” e argumentou que não se pode chegar a uma situação em que a Rússia fica um “país pária” por causa do perigo da ameaça nuclear. “Estamos à beira do abismo se algum dia as armas nucleares forem usadas“, disse.
Por outro lado, curiosamente, defende que a energia nuclear “tem sempre que ser considerada” dentro da União Europeia, principalmente as novas gerações de energia nuclear. Na campanha eleitoral destas eleições, António Costa usou este tema para atacar o Livre de Rui Tavares, garantindo que com o PS “a energia nuclear nunca estará na mesa”.
Costa Silva tem feito marcação cerrada a Costa
Partilham o nome, mas não todas as ideias. Apesar da boa relação entre os dois, o independente não se tem inibido de criticar o Governo socialista. Antes de ser convidado por António Costa para coordenar a elaboração do plano de retoma, Costa Silva criticou várias vezes o Governo que depois aconselhou. Da exploração de petróleo no Algarve à falta de estratégia para o país, foram diversas as questões apontadas ao Executivo que agora vai integrar, ainda que tenha elogiado a inteligência política do primeiro-ministro.
Em 2016, pouco depois de Costa conseguir formar Governo, o então gestor da Partex acusava o Executivo de não olhar para uma questão que considerava ser “crucial”: a economia. Em 2016, em entrevista ao ECO, já dizia que as empresas “não são suficientemente acarinhadas, não se cria condições para o investimento”, o que “é uma das bases do atraso do país”. Mais tarde, acusou o Governo de ser hostil às empresas e ao investimento privado. É de notar que o Governo decidiu cancelar os contratos de prospeção e exploração de gás do consórcio Partex/Repsol, tendo Costa Silva desabafado que “não vale a pena” investir em Portugal.
Em 2018, voltou a tecer críticas e elogiou Álvaro Santos Pereira, ex-ministro da Economia do PSD/CDS: “Há uma espécie de clima de hostilidade em relação às companhias, mas quem cria riqueza são as empresas. Uma política que hostiliza as empresas e o lucro não cria condições amigas do investimento e do desenvolvimento do país”, disse em declarações ao Público, tendo acrescentado que “quando mudou o Governo, passámos para o ciclo oposto, que é governar em função do que dizem os autarcas e a opinião pública“.
Mas nem só de críticas se fez o discurso do agora ministro da Economia aos Governos anteriores: “Este Governo tem feito coisas positivas na redução do défice, do controlo das finanças públicas e da diminuição do desemprego, mas precisamos de muito mais“, admitiu, classificando Costa de um “político excelente” que conseguiu alcançar a paz social num período de grande instabilidade. Porém, na criação de riqueza volta a apontar o dedo, apelidando o crescimento de “anémico” e dizendo em 2017 que é uma “vergonha nacional” que o país tenha crescido apenas 0,05% entre 2001 e 2015.
A maior agressividade nas palavras de Costa Silva foi quando falou dos temas que lhe são caros, como é o caso dos recursos naturais: “Portugal não tem um problema de escassez de recursos. Temos um problema de escassez de inteligência nas políticas públicas, que muitas vezes minam à cabeça a utilização desses recursos”. “O país é um iceberg no meio do oceano”, que “como não tem estratégia ninguém sabe para onde ele vai”, chegou a dizer. Agora terá a oportunidade de, pelo menos, influenciar o trajeto desse iceberg.
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