“Desculpas de mau pagador”. Aumentos na Função Pública de 2% são “inaceitáveis”, dizem sindicatos

Costa diz que referência para aumentos na Função Pública é de 2%. Sindicatos criticam posição e avisam que se propostas não melhorarem podem levar contestação para as ruas.

Depois de um ano com uma inflação galopante, em que os funcionários públicos tiveram um aumento de 0,9%, o primeiro-ministro afasta a possibilidade de fazer a atualização salarial destes trabalhadores em linha com a inflação esperada (7,4%), apontando ao invés para um referencial de 2%. Para os sindicatos que representam a Função Pública, esta proposta é “inaceitável”, representando um “empobrecimento dos trabalhadores”. Sebastião Santana, coordenador da Frente Comum, chega mesmo a acusar o Governo de usar “desculpas de mau pagador”. Já a presidente do STE vê valor como ponto de partida para a negociação, mas admite que é um “referencial baixo”.

“Quando a inflação era zero não se podia aumentar salários, e quando agora se cifra em 7,4%, não se pode aumentar porque vai contribuir para aumento da inflação”, justifica o sindicalista, em declarações ao ECO.

O primeiro-ministro afirmou, em entrevista ao Jornal das 8, na TVI, que os funcionários públicos “não vão com certeza ser aumentados em 7,4%”, sinalizando, no entanto, que os aumentos estão sujeitos à negociação coletiva. António Costa referiu que o Governo está a trabalhar para que a inflação em Portugal “chegue o mais rapidamente possível” a 2% e admitiu que essa “é uma referência, mas não obviamente o único dado a ter em conta” para os aumentos dos funcionários públicos.

Perante estas declarações, José Abraão, secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública, diz ao ECO que a reação só pode ser uma: “É completamente inaceitável que se passe por cima de uma desvalorização dos salários de 7,4% e se avance com um número eventual de uma inflação futura, quando até há pouco tempo, o Governo para nos impor um aumento de 0,9%, descontou 0,1% da deflação de 2020″.

O dirigente sindical aponta que esta atitude “é completamente ridícula” e acaba por “resultar numa autoridade sem sentido”. José Abraão aponta ainda as diferenças nas decisões já que por exemplo nas pensões se vai aumentar em 4%, e até isso representa uma perda (já que parte do valor que seria o aumento em 2023 foi antecipado para agora, sendo pago em outubro).

Por outro lado, a presidente do Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE) diz acreditar que o valor referido pelo primeiro-ministro é apenas “o ponto a partir do qual se vai iniciar a negociação coletiva”. “É referencial baixo, mas o caminho faz-se caminhando e é a partir daqui que se faz processo”, explica, ao ECO. Maria Helena Rodrigues aponta que o primeiro-ministro deve ter em conta que a perda dos funcionários públicos “já toca e ronda os 16%”, pelo que “é necessário fazer atualização que vá ao encontro do que pede aos serviços públicos”.

Isto não é negociar, é partir para negociação completamente cheia de atilhos e sem vontade de o fazer.

Sebastião Santana

Frente Comum

Já Sebastião Santana critica também o facto de o Governo estar novamente a começar processos negociais pela comunicação social, salientando ainda que o primeiro-ministro diz estar aberto para negociação, mas depois frisa que jamais chegarão ao valor da inflação. “Isto não é negociar, é partir para negociação completamente cheia de atilhos e sem vontade de o fazer“, critica, ressalvando ainda assim que a Frente Comum não abdica da negociação e vai sentar-se à mesa, levando uma proposta que será aprovada a 29 de setembro, sendo nesse dia entregue à ministra da Presidência.

O STE também “está a concluir a proposta para levar às negociações, que não tem em conta só este ano, tem em conta processo e o que aconteceu até aqui”. “Se o valor apresentado pelo governo for anormalmente baixo, não estamos a ter uma atualização“, constata Maria Helena Rodrigues, mas sim uma desvalorização.

A Frente Comum espera que o Governo se sente à mesa também com disponibilidade para negociar, mas se tal não acontecer “vamos ter trabalhadores a lutar pelos interesses”, alerta o dirigente. Aviso foi feito também pelo secretário-geral da Fesap, que diz acreditar que o Governo quer negociar com sindicatos, mas sinaliza que há “expectativa que as propostas sejam credíveis, negociáveis e não empurrem [os trabalhadores] para a rua nesta lógica de empobrecimento lento e com austeridade que não faz sentido”.

[Proposta] está a contribuir para o inverso daquilo que está no programa do Governo e o que está prometido, de aumento dos salários ao longo da legislatura.

José Abraão

Fesap

Os dirigentes lembram ainda que o Governo tinha a meta de aumentar os salários em 20% na legislatura, mas com estas afirmações “está a dar pontapé de saída muito mau”, aponta Sebastião Santana. Com esta proposta, está a “contribuir para o inverso daquilo que está no programa do Governo e o que está prometido, de aumento dos salários ao longo de legislatura”, concorda José Abraão, recordando ainda que os valores impostos para a Função Pública acabam por também afetar outras negociações e trabalhadores.

Costa disse que é necessário “ter em conta a produtividade”, bem como o objetivo de atingir até ao final da legislatura que “o peso dos salários no PIB” seja “correspondente à média da UE”. Sobre a questão da produtividade, o coordenador da Frente Comum salienta que esta “resulta das condições dadas para trabalhar e a forma como se mede pode ser muito criativa”. “O Governo não pode responsabilizar trabalhadores da Administração Pública quando temos exigido mais e melhores condições de trabalho para prestar melhores serviços”, acrescenta o dirigente sindical.

Maria Helena Rodrigues salienta que os serviços da Administração Pública “têm a possibilidade de medir produtividade, que é diferente da produtividade da economia: as funções do Estado podem ser observadas mas a avaliação faz-se no serviço ao cidadão”, defende. A dirigente sindical aponta ainda que a prestação de serviços mais eficaz deve estar em cima da mesa “mas não pode ser determinante no que é a atualização salarial dos serviços públicos”.

(Notícia atualizada às 13h15 com declarações da presidente do STE)

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