Do IRS às medidas para as empresas, o que já se sabe do Orçamento que é apresentado hoje pelo Governo
Atualização de escalões de IRS em 5,1%, aumento de pensões até 4,43% e corte de impostos às empresas que aumentam salários são algumas das medidas já conhecidas. Governo entrega proposta às 13h.
O Orçamento do Estado para 2023 é entregue esta segunda-feira e muitas das medidas do documento já são conhecidas, à boleia do Acordo de Médio Prazo de Melhoria dos Rendimentos, Salários e Competitividade assinado pelo Governo com os parceiros sociais, à exceção da CGTP.
Desenhado sob o signo da incerteza provocada pela guerra na Ucrânia, inflação elevada e um novo ciclo de taxas de juro, o documento traz uma atualização significativa dos escalões de IRS e outras novidades para as famílias. São também conhecidas a atualização das pensões e a dimensão esperada para o aumento dos funcionários públicos.
Para as empresas, vem aí uma redução do IRC para quem suba salários, reforce a capitalização ou aposte na investigação e desenvolvimento, embora falte ainda o detalhe das medidas. Haverá também taxas reduzidas para mais PME.
Atualização das pensões
O aumento que será aplicado a partir do próximo ano é conhecido desde que o primeiro-ministro apresentou no início de setembro o pacote de apoios às famílias para enfrentar a inflação. A divulgação motivou, aliás, muita polémica, por não ser respeitada a fórmula legal para a atualização das pensões.
O incremento será de 4,43% para quem recebe pensões até 886 euros, de 4,07% para as pensões entre 866 e 2.659 euros e de 3,53% para as restantes pensões sujeitas a atualizações. A título de exemplo, numa reforma de 600 euros o pensionista receberá mais 26,58 euros por mês. Caso fosse aplicada a fórmula legal, os aumentos oscilariam entre os 7% e 8%. O Governo justificou a diferença com a necessidade de preservar a sustentabilidade da Segurança Social.
Aumentos da Função Pública
Na reunião que teve com os sindicatos na semana passada, a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, propôs uma subida global média de 5,1% dos rendimentos dos trabalhadores da Função Pública, incluindo aumentos salariais e progressão nas carreiras.
O salário mínimo na Função Pública tem o aumento mais expressivo no próximo ano, crescendo 8% para os 761,58 euros. Os vencimentos brutos até 2.600 euros mensais têm um aumento de 52,11 euros. Quem aufira 1.000 euros, por exemplo, terá uma atualização de 5,2%. Já se o salário for de 1.500 euros, o aumento é de 3,5%. Acima da fasquia dos 2.600 euros será atribuída uma atualização mínima de 2%. Tudo isto terá um custo de 738 milhões no Orçamento do Estado.
Segundo os cálculos apresentados pelo Governo, esta estrutura de aumentos, que será replicada também nos anos seguintes, resulta numa subida média de 3,6% no salário dos funcionários no próximo ano. Acrescentando a aumento do subsídio de alimentação, que passa de 4,77 euros para 5,20 euros, o aumento salarial passa para 3,9%.
O Governo vai também rever a Tabela Remuneratória Única, de forma a distinguir as diferentes carreiras, nalguns casos já em 2023. É o caso dos assistentes técnicos, que receberão um adicional de 52,11 euros (104,22 euros no total) a partir de janeiro. Os técnicos superiores vão também receber mais 52 euros. A progressão será também mais rápida (três níveis) para quem tem mais de 30 anos de serviço e para os assistentes operacionais com mais de 15 anos (dois níveis).
O pacote total tinha um custo inicial de 1.200 milhões de euros no próximo ano. O aumento do subsídio de alimentação, acordado na sexta-feira, tem um impacto orçamental de 77 milhões.
Escalões de IRS atualizados
Os escalões que definem o imposto a entregar pelas famílias às finanças serão atualizados em 5,1%, como prevê o acordo de rendimentos que o Governo aprovou no domingo com os parceiros sociais, à exceção da CGTP. O objetivo de assegurar a neutralidade fiscal das atualizações remuneratórias. O que significa que tem tiver aumentos de vencimento daquela ordem não será penalizado no IRS. O princípio será mantido nos anos seguintes.
Está ainda prevista uma “aproximação e, sempre que possível, eliminação da diferença entre a retenção na fonte de IRS e o imposto devido, evoluindo para um sistema de retenção na fonte que assegure que as valorizações salariais se traduzem em ganhos líquidos mensais para os trabalhadores”.
Também no chamado mínimo de existência, o valor até ao qual não há lugar ao pagamento de imposto, haverá mexidas. No acordo de rendimentos o Executivo propõe uma reformulação das regras de funcionamento do mínimo de existência para conferir maior progressividade ao IRS, “passando de uma lógica de liquidação final para uma lógica de abatimento a montante, beneficiando os rendimentos até 1.000 euros por mês e eliminando a distorção atual de tributação a 100% dos rendimentos imediatamente acima do salário mínimo”.
Há também novidades no IRS Jovem, com o aumento do benefício. A isenção do imposto passa a aplicar-se a 50% do rendimento no primeiro ano, 40% no segundo ano, 30% nos terceiro e quarto anos e 20% no quinto ano. São também aumentados os limites máximos do benefício em cada ano.
O Orçamento do Estado vai também incluir a extensão extraordinária do Programa Regressar, que em vez de terminar em 2023 vai manter-se durante a vigência do acordo de rendimentos, adaptando as regras de acesso ao Programa, com o objetivo de assegurar que o mesmo se destina ao incentivo ao regresso de quadros qualificados e, em particular, de atração de jovens;
Há também novidades no subsídio de alimentação, que passa a ficar isento de imposto até aos 5,20 euros por dia.
Para os jovens será ainda criado o programa anual de apoio à contratação sem termo de jovens qualificados com salários iguais ou superiores a 1.320 euros, o nível remuneratório de entrada de um licenciado na carreira geral de técnico superior.
Crédito à habitação
O Orçamento do Estado vai trazer alguns medidas para ajudar as famílias a lidarem com o aumento das taxas de juro do crédito. O secretário de Estado do Tesouro, João Nuno Mendes, apresentou, a semana passada, duas medidas no Parlamento. Uma delas prevê a eliminação temporária da comissão de amortização antecipada do crédito à habitação.
O Governo pretende também criar um mecanismo que promova o dever dos bancos a tomarem a iniciativa de apresentarem uma solução alternativa às famílias quando estas se encontrem numa situação financeira de limite que as coloque próximo de entrarem em incumprimento. Na prática, promover a renegociação dos contratos de crédito à habitação de famílias com maiores dificuldades financeiras.
Redução seletiva do IRC
O aumento transversal do IRC, como defendeu o ministro da Economia, está posto de parte. Em vez disso, o próximo Orçamento do Estado deverá trazer uma nova redução seletiva. O caminho vem, mais uma vez, traçado no Acordo de Médio Prazo de Melhoria dos Rendimentos, Salários e Competitividade.
A redução do imposto irá abranger empresas com contratação coletiva dinâmica, valorização de salários e diminuição da disparidade salarial. O Governo propôs uma “majoração em 50% dos custos com a valorização salarial (remunerações e contribuições sociais), em sede de IRC”.
Para a diminuição do leque salarial considera-se “o rácio entre a parcela da remuneração base dos 10% de trabalhadores mais bem remunerados em relação ao total e a parcela de remuneração base dos 10% de trabalhadores menos bem remunerados em relação ao total”.
A diminuição seletiva do IRC deverá abranger também as empresas que invistam em Investigação e Desenvolvimento, reforçando as condições do Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE II) na componente do investimento direto. Será ainda premiado o reinvestimento de lucros retidos, com a criação do Regime Fiscal de Incentivo à Capitalização de Empresas (ICE).
As PME com lucro tributável até 50 mil euros passam a ter acesso à taxa reduzida de IRC de 17%. Até aqui o limite era de 25 mil euros. Aplica-se também a empresas em atividade nos territórios do Interior e small & midcaps. Durante a vigência do acordo, a taxa reduzida aplica-se ainda, por dois anos, a empresas que resultam de fusão de PME.
Avança também outra medida que era há muito desejada pelos patrões: a reformulação do sistema de reporte e dedução dos prejuízos fiscais gerados em exercícios financeiros anteriores, que na prática deixam de ter um limite de anos para serem usados. É também prorrogada a 2022 e 2023 a regra que prevê o não agravamento de 10 pontos percentuais das tributações autónomas para as empresas com prejuízos fiscais.
Outra boa notícia para as empresas com frota automóvel é a redução em 2,5 pontos percentuais das taxas de tributação autónoma aplicáveis aos veículos híbridos plug-in. Há também uma diminuição das taxas para veículos ligeiros movidos a Gás Natural Veicular (GNV).
Avança também um novo plano de abate de automóveis ligeiros de passageiros em fim de vida.
Apoios ao consumo de energia e agricultura
O Orçamento do Estado para 2023 vai contar com 3.000 milhões de euros para novas medidas no quadro da mitigação do aumento dos custos de energia para as famílias e para as empresas.
A Confederação dos Agricultores Portugueses é um dos subscritores do acordo e o Orçamento também tem medidas para ajudar o setor a enfrentar a situação atual.
Este ano e no próximo haverá um reforço de 20% para 40% da majoração, em sede de IRS e IRC, dos gastos com rações para animais, fertilizantes e adubos, corretivos orgânicos e minerais e extensão para a água para rega.
Será ainda criado um apoio extraordinário imediato aos agricultores para mitigar o aumento do preço dos combustíveis, equivalente à taxa de carbono, à redução da taxa unitária do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) do gasóleo agrícola para o mínimo legal e a uma compensação pelo IVA, no total de 10 cêntimos por litro tendo em consideração os consumos de gasóleo agrícola reportados ao último ano completo.
Simplificação administrativa
O acordo de rendimentos inclui ainda várias medidas de simplificação administrativa que poderão constar ou não do articulado do Orçamento do Estado para 2023. São exemplos a criação do regime geral de taxas ou a eliminação e simplificação de processos burocráticos no âmbito da Reforma dos Licenciamentos.
Na Segurança Social, destaque para a eliminação da obrigação de comunicação mensal das declarações retributivas por parte das entidades empregadoras, passando a existir o princípio de necessidade de comunicação somente em caso de alterações. O mesmo acontece em relação às comunicações trimestrais dos trabalhadores independentes.
Terminam as contribuições das empresas para o Fundo de Compensação do Trabalho (FCT) e são suspensas, até final de 2026, as contribuições mensais para o Fundo de Garantia de Compensação do Trabalho. O FCT será reconvertido para permitir às empresas que para ele tenham contribuído, nomeadamente financiar a qualificação e a formação certificada dos trabalhadores; apoiar a autonomização dos jovens trabalhadores, suportando uma parte dos encargos com habitação.
Será também efetivado o mecanismo de restituição do IVA suportado e não dedutível com as despesas relativas à organização de congressos, feiras, exposições, seminários, conferências e similares.
Menos crescimento, mas sem recessão
O cenário macroeconómico que serve de base ao Orçamento do Estado de 2023 prevê uma travagem do crescimento de 6,5% este ano para 1,3% no próximo. Já a inflação será de 7,4% no final deste ano, tal como o ministro das Finanças já tinha anunciado, desacelerando para 4% em 2023.
A consolidação orçamental é para prosseguir. O Executivo aponta para uma redução da dívida pública de 115% este ano e para 110,8% no próximo, o que significa regressar a valores anteriores à troika. Quanto ao défice, este deverá ser de 1,9% em 2022, caindo para 0,9% no próximo ano.
O Conselho de Finanças Públicas (CFP) atualizou há duas semanas a sua projeção, antecipando uma forte travagem da economia de 6,7% este ano para 1,2% no próximo. A taxa de inflação média deverá situar-se nos 7,7% este ano e em 5,1% em 2023. Um valor acima, por exemplo, do previsto para o aumento das pensões mas idêntico à atualização dos escalões de IRS.
Na conferência de imprensa de apresentação do relatório, a presidente do CFP não afastou o cenário de uma recessão. “Não é de excluir uma recessão. O cenário que temos é um cenário prudente face à informação que dispomos”, disse Nazaré da Costa Cabral.
O Banco de Portugal divulgou, na quinta-feira, o Boletim Económico de outono. O relatório não traz previsões para 2023, mas a entidade liderada por Mário Centeno sublinha que os efeitos negativos da agressão militar russa na Ucrânia “serão mais notórios em 2023, antecipando-se uma desaceleração significativa face a 2022″.
(Artigo publicado originalmente a 7 de outubro de 2022, às 6h49, e atualizado a 10 de outubro, às 10h15, com mais informação.)
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